REVISTA TRIPLOV
nova Série . número 66 . agosto-setembro . 2017 . ÍNDICE

SUSANA BRAVO

A escrita poética como “intenção

antropológica” em  Equador

de Henri Michaux

Susana Maria Pereira  Roque Bravo, Lisboa. Frequentou o curso de Psicologia em 2004 na Universidade de Paris Sorbonne, depois de concluir em 2007 voltou para Portugal, Lisboa e ingressou na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa no curso de Línguas, Literaturas e Culturas em Estudos Portugueses e Românicos, posteriormente fez o mestrado do mesmo curso pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa em Línguas, Literaturas e Culturas em estudos Franceses e Portugueses sobre a orientação do professor doutor Nuno Júdice na dissertação A Fala do Corpo em Luiza Neto Jorge e Luís Miguel Nava. Atualmente está a fazer o doutoramento na mesma faculdade em Literatura Comparada. Escreve trimestralmente para a revista Nova Águia, sob a coordenação do prof. doutor Renato Epifânio.  

“Les poètes voyagent, mais l’aventure du voyage ne les possède pas.”

Henri Michaux, Préface à « Les poètes voyagent » 

A relação de Michaux com o mar e o relato da sua viagem
a bordo de
Boskoop, até Quito

Primeira relação do “eu-tu” 

O seguinte ensaio propõe analisar a escrita poética de Henri Michaux em relação a uma possível “intenção antropológica” moderna. Não há grande interesse num estudo biográfico ou psicanalítico da obra do autor sugerido. Não obstante, a exemplificação de algumas referências poderá ser mencionada, caso necessário. Interessa acima de tudo compreender a realidade pessoal de Michaux e o que ele nos revela pelo universo da sua escrita na literatura de viagens já no século XX.

Equador foi por excelência o romance que mais destacou Henri Michaux enquanto poeta e escritor de um “diário” de expedição de dois anos pelo Equador,  estabelecendo assim a inovação numa considerada “literatura de viagens”, que publica em 1929 a partir de toda a viagem realizada desde o Oceano Atlântico, passando pelos Andes, Quito, as montanhas do Equador, e as florestas tropicais brasileiras, até ao desembarque, um ano mais tarde, na foz do Amazonas.

Na sequência da escrita poética de Henri Michaux, pretende-se retratar de certo modo a utilidade antropológica “inovadora”, levada a cabo numa tentativa de tomada de conhecimentos e testemunhos reais alucinantes, que o próprio Michaux relata em detalhe no seu modo de ser poeta e escritor, mas também ao mesmo tempo observador crítico do quotidiano de uma nova civilização, povo, região e climas da América do Sul, território que conhece, fazendo-nos chegar, por meio da literatura de viagens, esse conhecimento e envolvimento peculiares que estão presentes no referido Equador .

Espera-se neste livro singular encontrar alguns traços iconoclastas de uma viagem anti-epopeia. Como se apercebe desde logo, o narrador tem uma visão muito diferente daquela que se espera do antropólogo especializado, isto é, aquele indivíduo preocupado e focado na observação, no estudo de casos, o rigor científico e o relato das experiências na interação com povos e culturas diferentes – a ciência da antropologia, nessa época ainda numa primeira fase de evolução. Como ele afirma, logo ao início do romance, na partida que o leva na sua viagem: “Esta viagem começou já lá vão dois anos (…) Dois anos uma espécie de prisão de ventre (…)[1]”.

Michaux afigura-se ao longo do livro numa espécie de peregrino, “soldado desconhecido” papel incorporado quase sempre pelos literatos viajantes impregnado de uma grande espiritualidade, que porém está desfasado do tempo real em que se encontra: “Vejamos, trinta ou trinta e um dias em Dezembro? (…) No anti-calendário do mar? Pobre diário![2]

 A expressão “anti-calendário” anuncia bem o seu modo de defesa face ao “tempo calendário”, que deixa de parte ao longo de toda a viagem, dando a sensação não só de um tempo fluido e indeterminado, bem como de uma viagem incerta, sem rumo e sem espaço e tempo definidos, onde o narrador se possa encontrar a si próprio pela “viagem” ao seu interior, diga-se um aspeto com características muito românticas, pondo em evidência a subjetividade do próprio autor.

Esta vontade de circunscrever o tempo e o espaço, alienados do real, começa no vasto Oceano Atlântico, onde se inicia a vigem, avultando no autor um sentimento de exasperação pelo imenso mar, juntamente com o excesso de monotonia que este apresenta, evocando-o pela sua grandeza e força: “A mim aquilo refez-me completamente. Muito bem, Atlântico, sabes abanar e mostrar-te grandioso.[3]”  De seguida ocorre um desalento que acompanha esse mesmo êxtase contemplativo – aborrecimento, entorpecimento mórbidos que o fazem sentir aversão e desconfortado perante esse universo, onde não acha nenhum encantamento equilibrado, mas sim exaustivo: “Que inércia, o mundo! Lindos, os barcos são lindos, dizem eles. Ah, não!” (…) “ Fora isto, que deserto ofegante!”.    

O discurso fortemente carregado de emoções inconstantes e sentimentos líricos, bem como humoristas, de Michaux, enquanto narrador-protagonista e viajante ao mesmo tempo, relata ao longo da narrativa as experiências que fazem parte do seu imaginário poético e da sua relação inter-pessoal com os lugares insondados, tornando-se, deste modo,  importantes meios de conhecimento pelo testemunho e experiência sensorial e perceptível do autor.

Não obstante o que se refere, há também uma tomada de “consciencialização antropológica” ao longo do livro, que veremos mais adiante no decurso deste ensaio, analisando para já a relação do narrador com o mar. Primeira importante forma de interação do eu com o tu, personificando o mar, pelo carácter enigmático e absurdo que este esconde na travessia a bordo do navio Boskoop, num processo que vai sendo descrito na sequência do culminar da escrita poética de Michaux.     

A relação de Michaux com o mar e o relato da sua viagem a bordo de Boskoop, até Quito

Primeira relação do “eu-tu”

 

“Este Atlântico! A mim, dá-me a sensação de andar por cá há cem anos[4].”

Henri Michaux, Equador 

  Michaux estabelece uma relação com o mar, onde começa a sua viagem até Quito - uma viagem que o leva no impulso de percorrer o imenso Oceano Atlântico. Sente-se, porém, através desta primeira passagem, uma mistura de sentimentos e de perceções na fala do narrador, com experiências que vão sendo relatadas a bordo de Boskoop face à imensidão e força do mar, que ele apelida de Oceano Sólido. Trata-se de uma sensação de enlace e quimera, mas também de solidão, desalento e frustração, que o narrador metaforiza neste Atlântico, rendido ao seu olhar, estabelecendo-se, assim, a primeira interação imaginária “eu-tu”:  “Oceano que belo brinquedo podia-se fazer de ti[5]". É esta interação que o narrador pretende invocar, para com essa relação percorrer todo o seu discurso,  por vezes arrojado e cómico, dirigindo-se ao mar, ganhando este uma dimensão viva e quase humanizada, mas também complexo de superioridade imiscuindo-se pelo lado tenebroso que o mar evoca e contentando-se com esse superdomínio. Estamos, assim perante todo o enlevo que o narrador cria e recria em torno do mar, projetando nele o sentido de descrição, por vezes inanimada, mas na maioria das vezes sempre animada, sobre o invólucro personificado pelo mar e o Boskoop,  num mecanismo que revela as emoções de Michaux durante toda esta travessia desde Paris, com partida a 25 de Dezembro e chegada a Quito a 22 de Janeiro.

 De que modo se poderá analisar na primeira relação estabelecida o eventual excesso de empolgamento de Michaux?

Tal como refere Margarida Vale de Gato, “O sujeito de Michaux é prolixamente desdobrável (…) A relação do eu com o tu é de assassinato.” (“O sujeito insubmisso”[6]). No entanto, na primeira parte de Equador a relação eu-tu não se passa num contexto de submissão, mas digamos de evidência, que contudo é vencida pela impotência do próprio narrador face às próprias forças da natureza das quais ele se sente incapaz de lutar, e ao mesmo tempo misturadas pelo deslumbramento que o narrador tem face à força incontornável do mar, que se transforma num mito antigo para ele: “Coragem não podia faltar a quem se aventurasse sozinho sobre uma vaga do Atlântico, sozinho com uma cabra, ou com o seu burro e um saco de biscoitos de cada lado de albarda, ou em caravana, em numerosa caravana, como nos tempos antigos[7].” Tudo o resto é visto de forma quase desprezível, sobretudo a humanidade, o outro – a tripulação presente a bordo - “Mas estes engenheiros, estes homens de negócios! (…) Lindos, os barcos são lindos, dizem eles. Ah, não! Estúpidos, estúpidos![8]”. Assim, mesmo o interior de Boskoop -  “(…) esta superestrutura de insecto e os intestinos do porão que salganhada sem nome. Que nojo! Gruas vão passando aquela tralha para uns barquitos chatos (…) Mendigos, vadios, nem um mastro têm para trabalhar”, surge visto de forma também enfática e caricata, como, por exemplo, na referência que faz às Ventoinhas, ganhando estas na narrativa um sentido literalmente mortífero, já que o narrador se sente incomodado pelo barulho delas: “Às cabeçadas, vai-me ignorando cada vez mais até me desdenhar completamente. Por fim, esconde-se. (…) ei-la que volta em passinhos de lã, como se eu no fim eu talvez merecesse um exame complementar, e fixa em mim todos os seus olhos[9]”. Fazendo dessas “personagens” imagens nauseantes que lhe criam espécies de alucinações.

 Chegado a Curaçau, primeira escala, antes de Quito, o narrador passa do “eu” a “nós”, dando a sensação de que o sentimento de individualismo, até então presente, se torna mais comunitário -  “ (…) está-se rodeado de todas as coisas, e o nosso olhar não vê nada, e o nosso cérebro não compreende nada”.[10] (…) “Posso dar-vos cem exemplos.”. Estabelece-se também o primeiro contato com os nativos da ilha, os negros, não sob a forma de um contacto directo mas graças à descrição da fisionomia e da proximidade pictórica de Michaux na relação com eles: “A cara do negro tem uma estranha expressão. Como a dos orangotangos, que possuem olhos muito humanos. O negro: uma água na face, é o seu olhar[11]”. Denota-se aqui uma descrição pictórica e a relação de um observador de olhar crítico, subjetivo e atento, jamais naïve ou tentado a deixar-se envolver pelo sublime dos contrastes:  “(…) esses chapéus de feltro dos negros, oleosos e gordurentos como peças de mecânica, que procuram visivelmente perder-se e nunca mais ser encontrados, fazem lembrar Paris, que só começa a abrir-se aos estrangeiros nunca antes do terceiro ou quarto dia.” – trata-se de um sentimento também de estrangeiro face aos  nativos, e uma crítica ao sublime exótico que para ele é estranho, civilizações que não merecem um olhar profundamente intelectual, mas meramente observador da estranheza, da rudez, do atraso e da diferença que são das restantes civilizações ditas ocidentais, modernas e evoluídas.

É igualmente nesta passagem por Curaçau que a escrita do narrador adquire contornos especificamente pictóricos, como uma escrita de imagens que expressa o je-moi, acompanhando toda a narrativa do Equador. Pode-se ver assim, que toda a primeira parte do livro, respeitante à viagem antes do desembarque em Quito, começa pelo vazio – o vazio da ausência que acompanha a vastidão desértica – metáfora do oceano encarado como um deserto: “Fora isto, que deserto, este deserto ofegante[12]” – que deixa como imagem do Oceano Atlântico – o vazio da alma que se confunde também com a ideia de vazio do corpo. O mar corresponde assim ao centro desta primeira parte da narrativa, o espaço-tempo no qual se envolvem o corpo e a alma do narrador, que quase se exorciza psicologicamente pelo oceano cruel e invencível: “As vagas batiam de lado e varriam o convés de borda a borda (…) os oficiais estavam inquietos. A mim aquilo refez-me completamente. Muito bem, Atlântico, sabes abanar e mostrar-te grandioso.”

Todavia, é ao chegar a Quito, no coração ou centro de toda a narrativa, que o narrador do Equador – impelido e exorcizado pela atmosfera e espaço que o envolvem - é conduzido à profundidade da sua poesia, ao imaginário sensorial e percetível de Michaux. É nessa sequência, como mais adiante veremos,  que avulta a importância do discurso como “consciência antropológica”, tendo em conta que por meio da escrita e arte de Michaux se pode depreender o seu desejo de comunicação, mas também a dificuldade na comunicabilidade – problema que se impõe em torno da socialização e do confronto do eu consigo próprio e com o meio envolvente por meio de uma subjetividade não adaptável ao novo contexto e espaço. 

O absoluto do “eu e do mundo”: O sublime da poesia de Michaux no coração do Equador

 É finalmente na cidade de Quito que Michaux revela o absoluto do “eu” face ao mundo novo, selvagem e quase desconhecido – um poeta controverso na imagem de não se sentir como tal, chegando a afirmar “ Je ne me considère pas comme un poète.”[13]. No entanto,  como quase todos os poetas, Michaux embebe pela poesia a sua chegada à terra nova, saudando-a: “Saúdo-te mesmo assim, maldito Equador[14]”. É esta a primeira “fala” do poeta viajante com a terra, não utilizando qualquer termo invocativo ou exclamativo - “saúdo-te (…) maldito” - mas simplesmente aparecendo em seguida a descrição da natureza como árida, negra, imensa e gasta - “Região de Huygra, negra, negra, negra” -  mas mesmo o mistério que se esconde ou podia causar ao narrador algum deslumbramento, através da perceção com o natural ou com o desconhecido - “Por que bates tão forte, coração?” - não o leva a aproximar-se todavia do sublime ou do maravilhoso, mas sim do banal e da monotonia: “Mas haverá o quê atrás da montanha?/ Mas irei ver o quê atrás da montanha?”. Por fim, o narrador declara “até que enfim chegamos”, com uma contínua monotonia que persegue o incontestável parecer de Michaux, descrevendo o que é meramente simples, banal e comum à terra “virgem” ao viajante, pela qual todavia se mostra completamente despegado ou distante do “tu” que é a cidade de Quito, com as suas montanhas ou os indígenas equatorianos, vejamos: “Pesadamente carregados caminham os índios nesta cidade encostada a uma cratera de nuvens (…)/ Esta peregrinação curvada, onde vai?/ Cruza-se, volta a cruzar-se e sobe; nada mais: é a vida quotidiana.[15]”. A relação do narrador com o Equador, ou seja, do eu com o tu, como foi referido no tema anterior, vai sendo apresentada de forma fluida e variável – a escrita da narrativa do próprio Michaux vai variando prolixamente, num monólogo sucessivo do “eu” consigo mesmo.

Mas de que forma estaremos perante um absoluto do “eu e do mundo”? Um eu em fase de recusa de si mesmo e do novo mundo em que desembarcara, o mundo equatorial? Toda a originalidade do narrador encontra-se sem dúvida no fruto que avulta incontestavelmente no eu do poeta, acima de tudo, pela inevitável poesia que (re)cria e volta a criar através do mesmo processo cíclico e permanente de interação do eu com o mundo – Michaux é esse eu avultado sem precedentes, um parecer de reivindicações profundas - “ E tu, é ao grande louco que falas?/É a ele que gritas?[16]” - notando-se a singularidade do poeta indiferenciado e em crise existencial, bem como a expressão de impetuosidade que o narrador exprime diretamente sob a forma indireta das percepções e sensações do eu – na sequência dessa criatividade, no sensu lato de criador, tal como refere Bertelé[17] “ce qui est d’ailleurs singulier, puisqu’ils ne faisaient qu’obéir en somme à leur définition de poète qui veut dire, on le sait aussi, “créateur”. Trata-se da narrativa de uma expressão artística e elementarmente rotineira, integrando-se nesta “literatura de viagens”. E como falar da poesia de Michaux em Equador?

A poesia é a primeira forma incontestavelmente de expressão artística do eu, como atrás já foi referido. É no eu de Michaux que tudo se processa – o estado de vazio é visivelmente percetível e incontornável no centro de todo o Equador. O eu confessa-se num estado quase de perturbação existencial e encontra-se rendido a um pranto acumulado, que não se desvia dele, exaltado e contraditório, onde se misturam e se confundem sentimentos frívolos, tanto em face da vida do narrador como perante a descrição física da terra, que parece envolvida por todos esses sentimentos recordados: « L’Abréviation, la multiplication des sensations, émotions et représentations artistiques à l’époque moderne considérées comme fonction de la plus grande vitesse de déplacement de l’homme au XXe siècle[18] »,vejamos por exemplo, alguns excertos de poemas [La Cordillera de los Andes]: “ A primeira impressão é terrível a roçar o desespero (…)/ Não sejamos tão ansiosos/ sentimos o enjoo da montanha(…)/ Não venha ao Equador (…)/ Dizem que estamos a 3000 metros de altitude (…) /  É perigoso, dizem, para o coração, a respiração, o estômago (…)/ Para tudo o que há no corpo do estrangeiro.” (pp. 33-34).  É incontestável a sensação de desespero, que é irreversível no poeta, como que a alertar o leitor. [O Castelo e o Parque de Pacífico Chiriboga]: “Estive bem, ontem/ Também posso, portanto, sentir-me desafogado e satisfeito (…) /Tão perto da natureza, tudo isto/ Tão perto que seduz até os grous selvagens (…) UM LEITO REAL/Mas acabamos por partir.” (pp. 41 - 42). Verifica-se uma mudança de estado emocional do poeta em que o quadro da natureza acompanha esse delírio e oscilação em Michaux, próximo de um eu poético, como em Fernando Pessoa, aliás ambos contemporâneos um do outro, como nos poemas sugeridos a título de exemplo: [Nasci Esburacado] “Quito, pequena aldeia, não és feita para mim/ Preciso de ódio e de inveja, são a minha saúde/ Um grande consumo de inveja (…) No buraco há ódio (sempre), pavor também e impotência (…) / E não é mais que vento, mais que vazio. / Maldição sobre a terra inteira, sobre toda a civilização, sobre todos os seres à superfície de todos os planetas, por causa deste vazio!” (…) / Ah! Como se está mal na minha pele! (…) /É a minha vida, a minha vida pelo vazio / (…) Se esse vazio desaparecer, procuro-me, desoriento-me e ainda pior (…) / (…) Que teria dito o Cristo se fosse feito desta maneira? (…) / É o avesso do ódio/ E não há remédio. Nenhum remédio.” (pp. 85 - 86). O eu debate-se e encontra-se enclausurado em permanente busca, o que é evidente em quase toda a poesia de Michaux, mostrando por vezes delírio, solidão, vazio e incapacidade do eu lidar consigo próprio – rende-se o coração em luta permanente e numa atmosfera de desassossego: “Rende-te, coração/ Lutámos tempo de mais, (…) Oh! Alma minha (…) / Eu, por mim, não posso mais.” (p. 88). A náusea e a morte acompanham este dilema existencial, próximo de Maurice Blanchot, em L’Instant de ma Mort. Michaux, tal como Blanchot, não deseja morrer, mas apela constantemente à morte, como fim absoluto do eu – o desejo de querer libertar-se de qualquer coisa que o sufoca, sentindo a “alma esburacada”, como se o espaço o limitasse e o envolvesse nessa obscuridade ofegante – morte como um fim causal dos fantasmas que envolvem o drama existencial do poeta, mas em termos próximos do cómico artístico desesperado, como diz Lawrence Durrell “ – une poésie du comique désespéré. Dans un monde peuplé de fantômes, c’était un poète réel[19]”.

Para concluir, a poesia de Michaux tratada no Equador revela-se exasperada, densa e fragmentada no espaço de um eu que se encontra também fragmentado, visto que se debate consigo mesmo, com o desejo de possuir, por um lado, e de rejeitar por outro lado ao mesmo tempo. A alma é ambivalente, o espírito parece transmigrar de um estado de alma a outro de um modo sucessivo e inconstante, transmitindo-nos a sensação, a nós leitores críticos, que em Michaux ocorre uma perturbação de náuseas. O “eu” parece difuso ou alucinado, mas o “eu” está consciente de si nessa permanência estática. Refiro que se trata da procura de encontrar um “eu” artístico e poético[20], talvez influenciado pelas correntes surrealistas dos primeiros decénios do século XX ou mesmo pré-existencialista antes de Sartre.

 Todavia, é também uma poesia representativa da arte, da pintura, das formas e das cores a que o narrador alude como se tratasse de uma tela: “O Equador é atravessado por rios cor de chocolate (…) em cima cacau a ferver.[21]” Este é o modo do poeta brincar com a arte parodicamente considerada por L. Durrell como “(…) sentiment d’exaspération en poésie , on ne peut pas exprimer veut dire; on est forcé d’indiquer le chemin!" e revelar aos leitores da época a forma mais explicita e exemplificada as características que apresenta o novo mundo para os ocidentais como ele, mas que nunca estiveram lá. A forma melhor de aproximar o leitor do seu tempo à realidade física através de outras comparações, que para além disso gerou uma descrição incomensuravelmente artística. 

Porém, na prosa há um efeito paralelo mas paradoxal, mais próximo ao mesmo tempo de um “diário de viagens”, tal como uma constante necessidade no culto do eu do narrador como é tratado na poesia. O “je-moi”é permanentemente referenciado, com a mistura de tempos passado-presente, catalogados como um “desabado do eu”na referência análoga a filósofos clássicos, trazidos à luz pelo poeta ao reflectir consigo mesmo, de modo a pôr em ordem as suas ideias no dia-a-dia registado e apontado detalhadamente - “Esta tarde, às quatro horas, é preciso pagar ao chefe dos carregadores.” / Sexta, 11 horas: Partem ao meio-dia e meia hora. Vão apanhar o comboio de Ambato.[22]” – havendo, contudo uma maior preocupação na descrição da natureza que o envolve, num olhar dir-se-ia de inspiração romântica : “O Equador é um país que mostra terra. Não há outro de que se possa dizer o mesmo (…) A Europa ostenta por toda a parte o pequeno riso de sangue das suas casas de tijolos, dos seus telhados, das suas telhas. (…) A terra do Equador, essa, é castanha ou negra, ou cor de couro. É a cor da paisagem…à qual nada se afasta![23]”. Assim, acaba por se assemelhar também a um “diário de viagens” em que narra aquilo que lhe preenche a alma, o ser. A prosa possibilita uma descrição, em suma, mais concreta, descritiva e menos lírica, isto é, menos artística e mais “guia de viagens”, a necessidade também em revelar uma tomada de consciencialização antropológica, em parte revelada por Michaux como a “intenção antropológica” de uma literatura de viagens, que veremos em seguida.

A importância do discurso de Michaux para uma “consciência antropológica” no seu “diário de viagens”

A “consciência antropológica” é um artefacto, como já foi abordado em aspectos descritivos, relatados e vividos pelo narrador,  sendo interessante verificar uma relação entre literatura e antropologia – mesmo não havendo a priori e a posteriori qualquer tipo da ciência da antropologia em Equador. Se assim podemos considerar,  acaba por surgir na continuidade de uma “literatura de viagens”, que se vê impregnada por um sentido anti-moral, leviano, anti-puritano ou anti-cristo: “No que diz respeito à religião católica, quando a estudei, desconfiava muito dos bispos, cónegos e professores de teologia e filosofia.[24] (…)" Há, na minha natureza, uma forte propensão para a embriaguez. Sou um homem em mane e tudo me serve.[25]

Para falar de “consciência antropológica” em Michaux é necessário, antes de mais, compreender o uso do seu discurso e da sua linguagem. Para que serve esta na interação do “eu” com o mundo? Como resulta?

Em Michaux, o discurso é o maior fator de contacto direto que leva a uma “consciência antropológica”, que porém não se aproxima nem se distancia do outro. Não há a mesma necessidade ontológica como no discurso utópico e moralista nos romances de “literatura de viagens” - como em Suplemento à Viagem de Bougainville” de Diderot  ou em Robinson Crusoe de Daniel Defoe ou no discurso imaginário e contemplativo na Carta de Pêro Vaz de Caminha, de Caminha. Nessa base percetível, a linguagem é uma ferramenta essencial a todo o discurso, quer na oralidade, quer na escrita, que possibilita uma forma de contacto entre o eu e a realidade através da consciência ou das ideias que dão forma ao pensamento e permitem a construção de uma linguagem de polifonia[26] . Começamos assim a entender a importância da linguagem semiótica de Michaux pelo uso do seu discurso ambivalente, alternado e confessional, que estabelece com o leitor e com o exterior por meio do seu “diário de viagens”: “ Conto contigo, leitor, contigo que alguma vez vais me ler, leitora.[27]”.Trata-se de um misto de sombras decadentes e  de efeitos de luminosidade que revelam esperança e uma satisfação exacerbada do narrador – tanto na prosa como na poesia do Equador: “Um espírito de alguma dimensão só pode sentir ódio por uma cidade. Nada é mais desesperante” [28]“Equador, Equador, o mal que pensei de ti.” (...) “Dai-me grandeza/ Dai-me grandeza (…) O desespero é suave[29] / Suave até ao vómito.”. Desta forma podemos comparar esta situação com o estudo do filósofo e linguista russo, Bakhtin, sobre Dostoivéski, tal como, de acordo com a antiga escola linguística de Bakhtin, “o discurso sobre o mundo se funde com o discurso confessional sobre si mesmo[30]”. Michaux revela-nos, assim, uma escrita descontínua, fluida, sem começo, meio e fim. Contudo, não deixa de ser reescrita e detalhada pelas horas e pelos dias – que formam esse “diário de viagens”. Mas perguntaremos então nós, como leitores e agora, em que consiste de facto essa “consciência antropológica”? Qual seria a intenção de Michaux no uso de um “diário de viagens” em Equador?

Em Michaux o “eu” burguês, nascido da modernidade ocidental europeia da primeira metade do século XX, marca as diferenças culturais na dialética com o outro não europeu, começando pelo próprio quotidiano: “O quotidiano faz o burguês e faz os outros. Contudo, o quotidiano de uns pode desorientar até a morte de outro quotidiano, quer dizer, o estrangeiro, por mais banal, cinzento e monótono que esse quotidiano seja para o indígena.[31]” Para melhor compreender, assim, a importância do discurso levado a cabo pela “consciência antropológica”, o narrador estabelece duas relações do eu →← tu, e a do nós →← eles.

No primeiro tempo, a relação do “eu” com o “tu” é assinalada, porém mantendo-se distante, porque o narrador nunca se chega a envolver com o índio diretamente nem se mostra interessado em partilhar a sua divergência cultural. Nota-se a discrepância entre o eu-tu - “Aqui, como nos outros sítios, apesar das danças, da bebedeira, dos tons vivos, da roupa, as fisionomias e os gestos dos índios não manifestam nenhuma alegria[32] ” - e só nos apercebemos dessa complexidade na segunda relação entre o “nós” e o “eles”: “Eu e André somos dois viajantes bem esquisitos, O paludismo…, ora. O que nós queremos é dormir. Os nossos mosquiteiros são pequenos de mais. ”De facto, Michaux alude muitas vezes às dicotomias “antropológicas” entre o europeu e o nativo, colocando-o num universo coletivo e reflexivo desigual em relação ao universo europeu. Vejamos agora o que se passa com o corpo e a fisionomia do indígena: “ Aqui, as índias têm um porte extraordinário de amazonas. A forma dos seus chapéus de feltro sem ornamentos é a causa disso, assim como o ar distante, indiferente, do seu rosto. (…) Outra coisa: até a uma idade avançada, essas índias usam tranças, e como não engordam, faltam à cidade mulheres maduras, matronas, velhinhas. (…) Há com certeza mulheres brancas de aparência idosa; mas mais comedida seria se, para se tornar mulher, a índia tivesse que mudar de raça, e para ser velha índia, voltasse à sua raça de origem.[33]”. Quanto aos hábitos alimentares: “O coração da palmeira mantém-se tento durante seis meses. (…) Mas vêm os índios e lançam-no por terra com um ou dois golpes certeiros, anulando-lhe o projecto (…) Cozem aquilo, comem aquilo: é bom. Aquilo pode-se comer cru.[34]”. Finalmente, destaque ainda para a paisagem geográfica - “ O Equador é uma região particularmente determinada pela altitude, que vai, no centro, de 6200 metros a zero, e pela posição que ocupa no globo, em parte já indicada no seu nome.[35]” – e para o clima: “É difícil determinar o clima do Equador. Nos altos planaltos, as pessoas costumam dizer, e está certo: as quatro estações num dia[36]”.

O narrador pretende desmistificar o conceito clássico de “anti-héros”, como explica Nicolas Goyer[37]:“(…) les traits d’une anti-épopée des plus iconoclastes. Le narrateur, antihéros qui ne rate pas une occasion pour dévoiler ses points faibles, ses lacunes et le défaut de toute chose, adopte dès les premières pages un ton anti-solennel, voire facétieux (…) ”  A arte deliberada da escrita de Michaux é, pois, o reflexo que tenta fazer com ela a sequência de tudo isso. Compreendendo assim a sua dialética e a inter-relação evolutiva de Michaux com o Equador, torna-se fulcral considerar três aspetos cruciais: 1)viagem “anti-épica” – desmistificação do clássico e maravilhoso tradicionais da epopeia[38]; 2)  a ausência de um desejo de contacto direto social e táctil com o diferente – o outro porém lógico, absorvido e sentido;  3)  a “consciência antropológica” como relação de aproximação da literatura com o exterior.

Para concluir este tema, tendo em conta os aspetos já abordados até aqui, surge-nos de algum modo necessário compreender o conceito de exotismo que Michaux inculca na sua narrativa de viagem. Na demanda de como evoluiu esse pendor exótico, será conveniente saber que importância pode o exotismo revelar de forma congruente na formação de uma consciência antropológica.

O exotismo de Michaux em Equador: a fonte colossal de uma nova narrativa de “literatura de viagens” 

“Não já o disse noutro lado. Esta terra levou uma sova de exotismo  (39)
Henri Michaux, Equador

O exotismo [40] ao longo de toda a narrativa, através da prosa e poesia de Michaux, torna-se na fonte primordial em Equador, impregnando assim o conceito de “literatura de viagens” ou, se quisermos, de “diário de viagens” – responsável pela consolidação de uma consciência antropológica que Michaux adquire na sua experiência enquanto viajante. É graças ao exotismo que Michaux intensifica a sua narrativa e faz dela um “diário de viagens” , impregnando-se das divergências e transmitindo-as ao leitor, sem contudo se imiscuir nelas. Michaux exorciza-se no mundo selvagem e estranho do Equador, mas não é essa “estranheza” que vai determinar a inter-relação do autor com o meio, mas sim os aspetos que já foram abordados, a importância da relação entre a arte e a escrita poética de Michaux no que o envolve em seu redor: as paisagens, as diferenças culturais (o quotidiano do indígena e do europeu), que o exotismo alimenta. É na permanência desse estado que o autor se situa – “êxtase”, servindo de estímulo à entrada num mundo ontologicamente criado por ele, revelando assim o Equador, imerso na sua sombra e num lado enigmático que nunca se chega a perceber exatamente o que é, e como se constituí, no fundo. Enlevado pelo exotismo, Michaux leva-nos neste “diário de viagem” rumo à exploração do já explorado anteriormente, tal como afirma: “Se dentro de cem anos não conseguirmos entrar em contacto com outro planeta (…) a humanidade está perdida. (Talvez nos reste o interior da Terra…) Sofremos mortalmente; da dimensão, do futuro da dimensão de que estamos privados, agora que nos cansámos de dar a volta à terra[41]”. A terra está gasta, o homem não se cansou de explorá-la e estabelecer trocas culturais, civilizações a submeterem outras civilizações, desde os grandes expedientes aventureiros do Mediterrâneo na Antiguidade, passando pelos navegadores portugueses e espanhóis, até às expedições ressurgidas após o Renascimento. Michaux desconstrói, ao mesmo tempo, a aventura do desconhecido – a imagem do imaginário exótico “tipificada” até então pelos europeus face ao outro, não sendo mais do que diferente e por "diferente" entendamos divergente. A narrativa, toda ela desconstruída simuladamente, acentua o lado do exotismo que nos apresenta o narrador através da sua espontaneidade expressiva, através de certas emoções frívolas que transfere para a escrita: “Quem não gostar de nuvens,/ Não venha ao Equador./ São cães fiéis da montanha,/ Os grandes cães fiéis[42].”

O exotismo está todo ele patente na descrição personificada do Equador, como um espasmo pela imagem tropical e exótica que alia o mundo físico ao mundo espiritual do autor. O embate do contacto visual padece de uma apreciação um tanto depreciativa, mas todavia subtil, como se Michaux entrasse adentro do Equador como num quadro, neste caso uma tela mental que o autor produz em si mesmo: “Uma terra ou cidade estrangeira é tão notável pelo que lhe falta quanto pelo que possui de especial. Assim como de uma obra-de-arte, dela se pode dizer o mesmo: “ É bonita, mas faltam-lhe não sei que pormenores familiares para ser viva[43]”. É plausível um contrabalançar entre o espírito do autor e a cidade, e destaquemos a impetuosidade de Michaux ao dizer: “Um espírito de alguma dimensão só pode sentir ódio por uma cidade. Nada é mais desesperante. Em primeiro de tudo as paredes, e depois as imagens que oferece: encarniçadas de egoísmo, desconfiança, parvoíce, rigidez. Não é necessário conhecer o código napoleónico: olha-se para a cidade e fica-se informado[44]. (…) Reencontro o meu homem, o homos sapiens, o lobo que acumula riquezas (…) Cidades, arquitecturas, como vos odeio!” Com um salto no espaço e  o confronto com o que é humano, com tudo o que é causticamente símbolo e imagem do homem, o autor renega, foge, recusa a presença humana, que contrasta com o universo surreal. Michaux revela a necessidade de escrever cada instante em que se deixa envolver pelas coisas, assimilando-as ao seu espírito, “desconstruindo-as”, mas essas formas aparecem contudo desfiguradas. Estaremos perante uma escrita desconstrutiva? Que presenças deixa o exotismo na narrativa de diário de viagem?

O exotismo supera o estático do universo de Quito , que não pode mudar senão pela inter-relação do autor, que se deixa observar pelo que vê: “Quantas aves! E com cantos de mim ignorados. Ouvindo-as, parece que estão encantadas de nos ver, lançando-nos pequenos apelos insistentes[45].” Indiferente ao universo que se encontra em torno de si, Michaux é como um “eu” narcísico que perscruta em si a natureza pela sua arte, o lado metafísico deliberado pelo lado anti edipiano: “Escrevo uma carta a meus pais. A necessidade que lhes tenho de me gabar perante eles! É a minha vingança. Tanto vaticinaram o zé-ninguém (…) Mas de facto não lhes escrevo a carta. Nunca lhes escrevo[46].”´É uma escrita voluntária, independente e narcísica: “A noite passada tomei éter. Que projecção! E que grandeza! O éter chega a toda a velocidade. Enquanto se aproximava, dilata desmedidamente o seu nome, o seu homem que sou eu, prolonga-o no espaço, prolonga-o sem avareza, incomparavelmente[47]”, Assim se contrapõe ao lado físico, que jamais é separado deste: “ O meu Narciso, fi-lo à minha maneira./ Mas há muito que este diário me irrita.[48]

Este ensaio tentou assim relacionar a poesia e a prosa encontradas em Equador de Michaux, através da fala do “eu” e das dicotomias deste “diário de viagens”. Não se depara com a monotonia, porque o autor nos incute toda a fluidez que a narrativa do livro apresenta. Onde está o fim em Equador? Não se sabe, a alternância entre o cá e o lá revela uma oscilação do sujeito, entre um comprazimento e uma insatisfação, num processo sinuosamente exposto ao parecer que o narrador dá e estabelece.

Longe de exultações, as emoções acompanham todavia um estado por vezes quase de embriaguez, perante o universo estranho que Michaux encara. O exotismo, como foi referido, implica sem dúvida a passagem para o outro lado – deserto de sensações, que porém não penetram o “eu” a fundo, ocorrendo uma separação entre o espiritual e o físico e corpóreo.

O discurso da escrita de Michaux torna-se uma importante soma de todos os factos concebidos acerca do Equador, para uma imagem conceitualmente feita relativa a essa ideia de Equador. O lado pictórico deixa presente a sua marca por vezes indiferenciada, mas quase sempre profunda, do narrador, no seu contacto com o Equador. Há um lado poético que eleva o drama existencial a uma luta infindável de desafios próprios de um combate de outros poetas contemporâneos.

Equador reflete indubitavelmente a modernidade. Michaux é moderno e está impregnado pela modernidade ao longo da sua narrativa alternante cíclica e de um quotidiano rotineiro, deixando ver a contiguidade e os tempos misturados entre si. Que diremos desta viagem? Terá gostado Michaux, de facto, do Equador? Ao que parece, o autor não exprime senão o desejo de viver todo o agora, mas de forma alternativa, sem querer negar o forte efeito provocado pela viagem e pelo mundo que percorre, mas que no fundo não alcança. Por isso, tal como citei no inicio deste ensaio, no comentário de Michaux: “Les poètes voyagent, mais l’aventure du voyage ne les possède pas”. No fundo,  Michaux prevê a multiculturalidade futura: “Não sou grande profeta se disser que dentro de pouco tempo a raça branca adoptará a tatuagem[49].” É também através desse aspeto de “consciência antropológica” que a leitura deste estranho diário de viagem nos marca de um modo pungente.       

Bibliografia  

Bertelé, René, Henri Michaux par René Bertelé poètes d’aujourd’hui ed. Seghers, Paris, 1969.

Ceia, Carlos, s.v. "Epopeia", E-Dicionário de Termos Literários, coord. de Carlos Ceia,
ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.edtl.com.pt>, consultado em Dezembro de 2010.

Durrell, Lawrence, Henri Michaux, ed. Fata Morgana, 1990 (sem local de edição).

Goyer, Nicolas, Essai: Petits Soudures, Paris, 2005.  

Michaux, Henri, Equador, ed. Fenda Edições Lda. e edições Gallimard, 1998, Direitos reservados
(sem local de edição).

Vale de Gato, Margarida, Antologia Henri Michaux, ed. Relógio d’Água Editores,
Santa Maria da Feira, 1999.

[1] H. Michaux, Equador p. 13

[2] Ibidem, p. 15

[3] Ibidem, p. 17-21

[4]Ibidem, p.21

[5]Ibidem, p.21

[6] Margarida Vale de Gato, prefácio à Antologia Henri Michaux, (Nota de Tradução) p. 7

[7] HM, Equador, p. 21

[8] Ibidem, p. 19

[9] Ibidem, p. 25

[10]Ibidem, p. 26-27

[11] Ibidem, p. 26

[12] Ibidem, p. 21

[13] Citação de Michaux em « D’autres voyages ou sa vérité dans une tapisser » René Bertelé : Henri Michaux Poètes d’aujourd’hui  p. 42

[14] Ibidem, p. 32

[15] Ibidem, p. 33

[16] Ibidem, p. 36

[17] René Bertelé, Henri Michaux par René Bertelé, op cit p. 39

[18] Nicolas Goyer, essai petits soudures, Henri Michaux, Œuvres complètes, op. cit., p. 9.

[19] Lawrence Durrell, Henri Michaux, ed Fata Morgana p. 13

[20] M. Bakhtin,  A problemática da poética de Dostoiévski “A verdade sobre o mundo, segundo Dostoiévski é inseparável da verdade do indivíduo”

[21] HM, Equador, p. 53

[22] Henri Michaux, Equador p. 108-113

[23] Ibdem p. 98

[24] Ibid. p. 69

[25] Ibid. p. 145

[26] Polifonia conceito de Dostoivéski que Bakhtin elogia em A problemática a poética de Dostoivéski por ter inaugurado um novo género literário, repleto de vozes.  

[27] Henri Michaux, Equador, ed. Fenda Luminosa p. 71

[28] Ibid. pp. 107

[29] Ibidem, p. 133

[30] Mikhail Bakhtin, A problemática poética de Dostoiésvki,  p. 77

[31] Ibidem, p. 143

[32] Ibidem, p. 31

[33] Ibidem, p. 38

[34] Ibidem, p. 79

[35] Ibid., p. 141, 80-81

[36] Ibid. p. 81

[37] Essai de Nicolas Goyer, Avant-Propos Les “Petites Soudures” p.130

[38] Ver Hélio Alves s.v “Epopeia” E-Dicionário de Termos Literários, coord. de Carlos Ceia, ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.edtl.com.pt> Designação de origem grega para o género literário também chamado poesia épica, ou poesia heróica, ou ainda simplesmente épica (como substantivo), que denota um texto poético, predominantemente narrativo, dedicado a fenómenos históricos, lendários ou míticos considerados representativos duma cultura. (…) Exemplo Os Lusíadas de Camões. Epopeia e romance (Lukács; Bakhtin) - O universo épico pertence ao passado absoluto, é, por natureza, inacessível à experiência pessoal e não admite pontos de vista». Bakhtin contrasta deste modo a epopeia com o dialogismo ou polifonia do romance. (…) os estudos mais recentes sobre a poesia épica da Antiguidade levam à conclusão de que «a opinião de Bakhtin sobre a natureza não polifónica da epopeia é simplesmente falsa» (Boyle). O cómico, o fantástico, o plural, o íntimo, o subversivo, podem ser qualidades atinentes também à épica.

[39] Henri Michaux, Equador. p. 35

[40] Dicionário de Língua Portuguesa Porto Editora, 5 ed “Exotismo”: s.m. qualidade de exótico; coisa exótica; estrangeirismo. p. 617

[41] Henri Michaux, Equador, “A Crise da Dimensão” p. 35  

[42] Ibid. [La Corillera de los Andes], p. 34

[43] Ibidem, p. 37

[44] Ibidem, p. 73-74

[45] Ibidem, p. 83

[46] Ibidem, p. 61

[47] Ibidem, p. 75

[48] Ibidem, p. 153

[49] Ibidem, [Equador] p. 159

HOMENAGEM DO TRIPLOV A ERNESTO DE SOUSA
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