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Francisco Coimbra
(Portugal) .
TERCEIRA PESSOA
(pai, filho e
“espírito santo”)
Professor do grupo 320 (Matemática e Ciências da
Natureza) do ensino preparatório, efetivo nos
Açores desde 1998. Reside em Ponta Delgada,
cidade da ilha de São Miguel, capital económica
dos Açores. Escreve procurando ter uma
escrita
desde os dezoito anos, faz 61 no mês de Junho.
Fez esta breve biografia, na terceira pessoa.
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FRANCISCO
COIMBRA
Dez
a fio
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(1) PIANO
IMAGINÁRIO
Antenor Nascentes (in Tesouro
da Fraseologia Brasileira)
aventa a seguinte explicação:
«”Deixar
correr o marfim”
(aguardar com indiferença os acontecimentos)
parece expressão de jogador de bilhar, ou talvez
de roleta, por causa da bolinha de marfim deste
jogo. Popularizou-se [no Brasil] com a
representação do vaudeville A
Lagartixa,
título com que se traduziu La
Dame de Chez Maxim,
de Feydeau.»
Tinha imaginado
uma explicação, imaginando que correr o marfim
pudesse ter origem literária. Uma frase que
tivesse caído no gosto de uma geração e dela
continuasse o uso, até já não se saber da
origem, como parece ser o caso.
O que imaginei?
Uma jovem, personagem de romance romântico, que
gastava o tempo suspirando à janela, enquanto
passava um pente de marfim nos cabelos. Quem via
dizia “Lá está ela a deixar correr o marfim”, o
que seria explicação bem mais lírica do que
deixar a bola de marfim correr na roleta e
pensar ir a jogo a “deixar correr o marfim”.
Fim, qualquer das
hipóteses tão boa como haver um pianista,
correndo dedos sobre o marfim das teclas num
piano imaginário.
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(1)
INSÓNIA
Nem um rafeiro deambula
perdido na cidade, o canil municipal funciona,
para lá devem ser canalizados todos os cães que
possam ser encontrados à solta. Esta realidade
devia conter estranheza, prisão para bichos e
homens; instituição a funcionar em pleno.
Penso no cachorro que
não encontro passeando por aí à toa, ocupo o seu
lugar, imagino-me em fuga saído de um quintal
imaginário onde me sentia preso.
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(2)
TRAMPA
Trump imagina-se
construtor de muro separando países, o México
interdito aos americanos que não usem os postos
fronteiriços e a América só para imigrantes
legalizados.
Lamento-me, vou deitar a
insónia. O conto acontece sem acontecer,
história saída do nada. Melhor dizendo, uma
histó… isto… para lá fugida, nada dela nado?
Onde o nada tem vida própria, como a insónia.
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(3)
MOMENTO DE INCERTEZA
Vou tentar todos os
dias ter um conto para você, algo simples,
insinuante, incisivo, cortante como os dentes da
frente ferindo as primeiras impressões, sem
pressa. Usando a sua pressão, numa forma de
acentuar a expressão do contacto sobre os
lábios, onde se quer deixar um beijo depois de
criar momento de incerteza.
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(4) ACENDE A
LUZ NO ESCURO
No início da frase
uma ideia baila, é como uma chama acesa, sem se
ver o pavio. Talvez uma fuga de gaz sirva, mesmo
se a explicação for a última coisa que podemos
esperar ver acontecer. Pois, em determinado
momento, a luz termina. Ficam apenas as palavras
mas, o seu som esgota-se e o gosto é o esgoto
para onde foi a luz. O gosto segue o silêncio e
dá-lhe forma, acende a luz no escuro.
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(5) TUDO É
POSSÍVEL
Substitui o plano
por um piano, uma ideia por um objeto. Pega no
objeto como se fosse uma caneta, escreve o que
queiras fazer neste momento. Nesse momento, tudo
é possível.
Agora só falta o
inopinado, súbito e imprevisível. Quando estiver
na fase madura, fruto que substitui a flor, dela
nascendo, faça-se o facto decisivo onde
finalmente tudo é possível.
Uma alcateia
correndo de forma desenfreada, anárquica,
selvagem até se cansar de perseguir o que já não
está à frente, parecendo agora coisa do passado.
Tudo é possível, talvez o objeto, no caso de ser
um piano, bem tocado, dê música.
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(6) SONHO
PERFEITO
A noite findou,
começa o dia, é hora de ir deitar. Já é tarde,
estou cansado e tenho sono. Escrevo, como se
isso, distraindo-me, desse sentido a tentar
retardar esse momento vital de entrar no
desconhecido à procura de um sonho que, a bem
dizer, pode nem acontecer. O sonho perfeito,
apenas um título, melhor dizer nome.
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(7) CAMA
Sonho como se
estivesse acordado, quero tudo o que consigo
fazer a dormir, vou para a cama.
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(8) VÉRTICE DE
VERTIGEM
Não consigo
decidir apagar a luz, vou deixar de ver!
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(9) METONÍMIA
O tempo passa até
ser passado, vem o presente, deste modo se cria
futuro. Faz anos que tivemos contacto, volto a
esse facto com um acto sem Fé? Não, com a fé que
de facto tenho: expectativa! Conto curto,
curtindo a pele no corpo da palavra metonímia.
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(10) PENSAMENTO
Amanhã volto a
tentar voltar, verei se a "expectativa" tem
sucedâneo ou sucessor? Uma coisa, a outra, as
duas? O valor das palavras está no seu
significado, não nos pertence por inteiro.
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