Remissão
(poema inspirado num
diálogo que ouvi, num café, entre dois
seminaristas, sobre a incompatibilidade entre o
bem e o barulho)
O bem nunca faz barulho.
Discreto, determinado,
É como onda sem marulho
Que alastra por todo o
lado.
Surge puro, sem motivo,
Do mais profundo da
alma,
Com força de imperativo
Que só, ao cumprir-se,
acalma.
É convicto e está
seguro,
Na sua recta intenção,
De servir como senhor
De sentimento e razão.
Faz do outro, outro de
si,
Dá-lhe a sua própria
vida,
Numa cadência imparável
Rumo à Terra Prometida.
Espontâneo, firme e
humilde,
Barulho não lhe faz bem,
Não o estraguem a
maldade
E a inveja que o mundo
tem.
Mas depois, feitas as
obras,
Sabe bem um barulhinho.
Já podes gemer mais alto
Sem acordares o vizinho. |
Menos olhos que
barriga
Cai a alça. Pisca um
olho,
que ficou meio aturdido,
mas que levanta o
sobrolho
p’ra se fingir
divertido.
Sobe a saia. A confusão
invade agora o segundo.
Mesmo assim, ganha a
razão,
depois de um suspiro
fundo.
Sê discreto, tu vê lá!
Não me faças má figura,
- diz um para o outro –
que eu cá
nunca perco a
compostura.
E assim vai esta guerra
por dentro de cada
homem…
A fome que come a Terra,
só porque os olhos não
comem!
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