Tenho dito há
muito, e continuo mantendo a mesma
convicção, que questões envolvendo a
fenomenologia paranormal vêm merecendo uma
nova ponderação.
A
parapsicologia parece ser uma terra de
ninguém. Uma terra sem lei. Mas,
apenas parece.
Todos,
indiscriminadamente, têm suas "teorias"
particulares sobre o tema.
A situação
piora quando parapsicólogos sujeitam-se a
participar de programas de auditório, sob o
rótulo de "debates", em que a parapsicologia
é discutida em meio a uma insana mistura com
religião, crendices, opiniões frágeis -
muitas vezes risíveis - conhecimentos
duvidosos colocados imprudentemente como
verdades universalmente aceitas, além de uma
tendencialidade, por vezes desrespeitosa,
que em nada contribui para o seu já tão
debilitado desenvolvimento. Inclui-se, nesse
palco de histrião, lamentavelmente, a
reprovável utilização da parapsicologia como
instrumento de defesa, ou ataque, desta ou
daquela fé. Sempre ao sabor dos ventos.
Em meio a
tudo, vez ou outra, mesclam-se discussões
sobre a sua cientificidade. Aí vemos um
pouco de tudo. Desde formulações sensatas,
sejam contra ou a favor, até ataques, por
vezes pouco felizes, que apenas denunciam
dotes autorais, sublinhe-se, pouco lúcidos,
para o enfrentamento da questão. Nesses
casos percebe-se claramente, tanto pela
forma, como pelo conteúdo, uma clara e
ingênua defesa de sistemas consagrados,
tidos como definitivos, cuja
impermeabilidade, todavia, mostra-se a cada
dia mais comprometida.[1]
Diante desse
quadro o que esperar?
A
parapsicologia é ridicularizada pelos
"especialistas" pouco familiarizados com o
assunto e que se comprazem em temperar as
discussões com o fel de suas frágeis
certezas. Muitos padecem da "síndrome do
papagaio".
Mas, o maior
problema enfrentado pela parapsicologia, no
meu entendimento, relaciona-se,
contraditoriamente, com a responsável pelo
seu surgimento: a fenomenologia espírita.
Devemos
separar, então, o "joio do trigo",
procurando diferenciar fenômenos de natureza
parapsicológica de fenômenos de natureza
espírita ou mediúnicos.
Fenômenos
parapsicológicos não devem ser confundidos
com fenômenos mediúnicos. Enquanto a
parapsicologia busca causas naturais
para explicar toda a fenomenologia estudada,
os espíritas tem como certo a ação de
personalidades incorpóreas e inteligentes,
ou seja, dos espíritos daqueles que
morreram, secundo o espiritismo,
desencarnaram, embora admitam, apenas em
nome de um discurso politicamente correto,
que muitos dos fenômenos originam-se no
inconsciente humano. Basta recordarmos a
diferenciação feita por Kardec entre
fenômenos anímicos e fenômenos mediúnicos.
Tentemos
elucidar os fatos.
Sob o ponto de
vista da parapsicologia os fenômenos por ela
estudados, há mais de um século, lhe
trouxeram a convicção de que toda a
fenomenologia - fenômenos subjetivos e
fenômenos objetivos - têm, como provável
origem, o psiquismo humano, melhor dizendo,
às forças ainda desconhecidas do psiquismo
humano.
Para o
espiritismo, diferentemente, a origem dos
fenômenos encontra-se na ação dos espíritos
desencarnados. Há, portanto, claramente, um
conflito entre parapsicologia e
espiritismo que não pode ser superado
facilmente.
Façamos um
exercício intelectual para melhor
compreensão.
Modernamente,
sob a justificativa de uniformização dos
termos utilizados na área, os fenômenos
parapsicológicos são denominados de
fenômenos Psi, termo geral proposto
pelo austríaco Berthold Paul Wiesner e
apoiado pelo britânico Robert Henry
Thouless, e estão subdivididos em dois
grupos ou categorias Psi (Ψ):
1. Psi-gamma -
fenômenos subjetivos, de conhecimento;
2. Psi-kappa -
fenômenos objetivos, de ação direta da mente
sobre a matéria.
Nesses dois
grupos, de natureza puramente didática,
estariam concentrados todos os fenômenos
estudados pela parapsicologia.
Contudo, os
espíritas incluíram, de forma muito
criativa, um novo grupo: Psi-Theta -
fenômenos que presumivelmente estariam sob o
domínio dos seres desencarnados, ou oriundos
das mentes de seres incorpóreos.[2]
Mas, este novo grupo não deixa claro em que
momento podemos, com segurança, estabelecer
a diferença entre um fenômeno Psi-gamma, de
conhecimento, ou Psi-kappa, de ação direta
sobre a matéria, de um fenômeno Psi-theta,
uma vez que ambos, Psi-gamma e Psi-kappa
poderiam ser atribuídos indiscriminadamente
à ação dos espíritos desencarnados. Em
poucas palavras, no princípio, meio e fim,
todos os fenômenos, de qualquer natureza,
sejam de conhecimento ou de ação direta
sobre a matéria, podem ser atribuídos à
função Psi-theta.
Contudo, ou
admitimos que os fenômenos nada têm a ver
com os espíritos dos desencarnados,
portanto, parapsicológicos, Psi-gamma ou
Psi-kappa - e já há evidências contundentes
sobre isso - ou admitimos que são
originários da ação de seres incorpóreos;
fenômenos mediúnicos, Psi-theta. Não há como
contemporizar. Nisso está toda a diferença.
E embora os
espíritas afirmem contundentemente aceitar
que muito da fenomenologia resida no
inconsciente dos vivos, como já o dissemos,
na prática, explicam a fenomenologia como
originária de seres incorpóreos, espíritos
desencarnados, portanto, distante das
fronteiras da parapsicologia e dentro das
fronteiras do espiritismo. Não precisamos de
uma mente brilhante para entender isso.
Pensemos,
apenas como um exercício intelectual, nos
termos precognição e premonição.
O primeiro utilizado em parapsicologia
significando um conhecimento antecipado de
um determinado fato, devido exclusivamente a
faculdades ainda desconhecidas dos seres
humanos e, o segundo, premonição, utilizado
pelo espiritismo, significando uma
advertência, um aviso, dado por um ser
incorpóreo e inteligente. Como conciliar
termos com significações tão contrárias para
designar o mesmo fato?
Creio ser
dispensável dizer que nada há aqui que possa
levar a um confronto além das ideias. Mas,
devemos defender que a parapsicologia
observou, comparou, descreveu e submeteu a
testes laboratoriais controlados, tanto os
fenômenos de natureza subjetiva, como os de
natureza objetiva e nunca foi constatada a
participação dos espíritos em tais
experiências. Isso se deve à crença de
correntes espiritualistas que se baseiam na
presunção de certas capacidades que não têm
sido verificadas por método científico em
parapsicologia.[3]
Aqui, fique
claro aos mais sensíveis, que em nenhum
momento a parapsicologia nega a existência
dos espíritos. Tal negação, além de
esdrúxula, seria contrária à própria
ciência.
Também os
estudiosos da parapsicologia não negam, nem
desconhecem, que muitos estudiosos sérios
admitiram a hipótese da sobrevivência. Nem
poderia ser diferente. Inclusive desconheço
qualquer pesquisador sério que não o tenha
feito.
Mas, admitir a
hipótese da sobrevivência não é o
mesmo que aceitar como fato consumado
a sobrevivência.
A aceitação da
sobrevivência enquanto um fato
comprovado e universalmente aceito nada tem
a ver com a ciência. Devemos deixar a
ciência fora disso.
Portanto, de
nada valem argumentos, aparentemente
sólidos, de que muitos pesquisadores da
parapsicologia aceitaram a
sobrevivência, ou como colocamos
anteriormente, a hipótese da
sobrevivência, como uma prova da própria
sobrevivência. Não é assim. Isso é risível e
não ultrapassa o limite das opiniões. A
parapsicologia, até onde tenho conhecimento,
não interfere nas opções ou crenças
pessoais.
Muitos
médicos, físicos, biólogos e também pessoas
que não tiveram a menor oportunidade de
instruírem-se formalmente também aceitam a
sobrevivência da alma após a morte física. O
que isso quer dizer?
Todavia, tais
argumentos, por mais enfáticos e sinceros,
não mudam a realidade. Parapsicologia e
espiritismo continuam em lados diferentes da
fronteira.
Afirmações
repetidas em forma de mantra que a
parapsicologia veio para confirmar os
fenômenos mediúnicos são, no mínimo,
equivocadas e, dependendo do contexto, de
má-fé. Apenas atestam um total
desconhecimento sobre o tema.
Isso, contudo,
não significa dizer que a parapsicologia,
enquanto área de conhecimento, tenha
colocado de lado, negando peremptoriamente a
hipótese da sobrevivência de algo no homem
após a morte. Longe disso. Há muita
desinformação gravitando em torno dessa
questão. Há, inclusive,
deliberadamente ou não, uma mistura de
termos pouco desejável, que transitam por
diversas áreas e acabam mais confundindo que
esclarecendo. Vejamos um caso a título de
exemplo.
O termo
paranormal, utilizado inclusive pelo
espiritismo, tem certa exclusividade nos
estudos parapsicológicos. Mesmo quando
substituído por eufemismos como fenômenos
anômalos, acomodado muito bem no âmbito
da psicologia, e lá é seu lugar, não perdem
por isso sua significação primeira,
utilizada em parapsicologia, referindo-se a
uma vasta fenomenologia incomum,
extraordinária.
À guisa de
esclarecimento, não podemos confundir "alhos
com bugalhos".
Assim, cabe
observar que tecnicamente não existem
pessoas paranormais. Mesmo por que, até
se prove o contrário, as pessoas que
vivenciaram, ou vivenciam fenômenos
paranormais são consideradas pessoas
normais.
Mas, voltando
à questão, considero inadequado o uso do
termo paranormal no âmbito do
espiritismo. A razão, já justificada
anteriormente: fenômenos espíritas ou
mediúnicos nada têm a ver com fenômenos
paranormais. Médiuns não vivenciam
fenômenos paranormais. Vivenciam fenômenos
mediúnicos. As fronteiras são bem
delimitadas.
Assim,
fenômenos Psi-gamma e fenômenos Psi-kappa
são inconfundivelmente de natureza
parapsicológica. Não têm nada, absolutamente
nada, a ver com presumíveis ações de seres
desencarnados. Fenômenos Psi-theta são, da
mesma forma, fenômenos de natureza
mediúnica. Atribuídos à participação de
seres desencarnados. Água e óleo não se
misturam.
Fortalece nossa
convicção, já esboçada anteriormente, o fato
de a parapsicologia ser posterior aos
fenômenos de natureza mediúnica. A
parapsicologia nasceu, ainda sob o rótulo de
pesquisas psíquicas, para investigar
determinadas ocorrências que eram atribuídas
aos espíritos dos mortos e, ao longo de suas
investigações, ofereceu respostas contrárias
às convicções que tomavam conta de parte do
mundo civilizado. Ofereceu explicações de
outra natureza que foram se fortalecendo com
o passar do tempo e continuam, cada vez mais
fortalecidas, devido ao avanço do
conhecimento científico, até os dias atuais.
O "olho do furacão" não estava no além
túmulo. O "olho do furacão" foi encontrado
no próprio homem, vivo e participante, na
sua própria natureza. Nada além.