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										Rogério Paulo da Silva (1962, Lisboa). 
										Artista visual e designer gráfico, 
										licenciado em Arte Multimédia pela 
										Faculdade de Belas Artes da Universidade 
										de Lisboa. O seu trabalho artístico 
										incide na exploração dos conceitos 
										Memória e Tempo inscritos em diálogos 
										visuais e transversais a vários media: o 
										desenho, vídeo e fotografia. Tem 
										
										realizado e participado em exposições 
										nacionais e internacionais e em 
										congressos e workshops de arte sonora e 
										arte multimédia. Recentemente participou 
										com o projecto de vídeo 
										
										Postais, 
										integrado na exposição 
										A
										Linha
										e
										o
										Espaço 
										no MAEDS, Museu de Arqueologia e 
										Etnografia do Distrito de Setúbal; 
										proferiu 
										
										uma palestra na 
										exposição
										
										
										
										
										Em qualquer tempo a memória 
										na Biblioteca da Escola  Secundária 
										de Silves no âmbito da V Bienal de 
										Poesia de Silves; 
										
										e participou 
										com o vídeo
										
										
										Memento (2015) no 
										
										Congresso da Cidadania, Ruptura e Utopia, 
										Fundação
										
										Calouste
										
										Gulbenkian e na 
										
										
										ProxyACT International Short Film 
										Festival 
										
										em Londres.Site:  
										
										http://www.rogeriosilvastudio.com
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								| ROGÉRIO PAULO DA 
								SILVA 
								ECRÃ  - 
								extensão do corpo e do pensamento |  
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								Introdução 
								  
								Este ensaio permite reflectir acerca das 
								exigências por parte das sociedades, em 
								transformar e reconstruir as massas segundo 
								moldes de envolvimento económico e sob 
								influência do constante desenvolvimento de novas 
								matrizes tecnológicas. Neste contexto 
								convocam-se questões ligadas ao passado 
								histórico e às necessidades abrangentes da 
								criação de dispositivos reprodutores de imagens, 
								com vista a possibilitar formas de comunicar com 
								o olhar e o pensamento colectivo. Nessa 
								perspectiva globalizante, caracterizada pela 
								aproximação da visualidade colectiva ao mundo em 
								tempo real através de dispositivos tecnológicos, 
								abrem-se perspectivas actuais de novas formas de 
								olhar o mundo. Nessa condicionante, os 
								indivíduos têm vindo a apropriar-se cada vez 
								mais da sua própria individualidade, 
								alienando-se exponencialmente da aura natural da 
								sua condição humana e da relação com o mundo à 
								sua volta. Ao olhar para um ecrã, para se ligar 
								visualmente ao mundo, o homem actual acede à 
								possibilidade de partilha da sua própria 
								realidade de forma imediata e efémera. Essa 
								conexão induz à ilusão de que o individuo tem o 
								poder de assumir o controlo do mundo virtual que 
								deseja criar para si. Paradoxalmente, essa 
								ilusão aponta para o facto de experimentar a 
								sensação de se encontrar acompanhado nessas 
								conexões, quando na verdade está isolado do 
								mundo, na sua própria individualidade. |  
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								1. A visualidade colectiva das massas 
								  
								As exigências de transformação e adequação das 
								massas às sociedades, sempre foram exercidas em 
								função de uma reintegração, compreendida ao 
								evoluir da história e a par com o inevitável 
								envolvimento dos dispositivos tecnológicos de 
								comunicação e de informação. De acordo com a 
								necessidade abrangente em se comunicar para 
								grupos distintos de indivíduos surgiu a criação 
								de mecanismos de reprodução de imagens e de 
								matrizes tecnológicas, com vista a possibilitar 
								ao olho humano uma aproximação ao mundo, em 
								tempo real, com todos os seus paradigmas 
								associados a cada época. Desta globalização, 
								claramente inevitável a um pensamento individual 
								e unidireccional das massas como representantes 
								da super-estrutura, derivou uma forma actual de 
								olhar o mundo, distanciando-se da maneira 
								“inocente” como se olhava o passado, cujas 
								possibilidades de representação não estariam 
								suficientemente desenvolvidas na sua 
								reprodutibilidade. 
								
								
								Em 1895, a primeira 
								exibição do Cinematógrafo dos irmãos 
								
								Lumière 
								(fig.1), foi das primeiras manifestações 
								tecnológicas que democraticamente surgiu para 
								proporcionar a um colectivo de olhares, a 
								representação do mundo em movimento. 
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										Fig. 1 A primeira metragem do 
										Cinematógrafo Lumière, trabalhadores 
										saindo da fábrica Lumière (1895) |  |  |  
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								| Dentro do paradigma da 
								reprodutibilidade da imagem, - incluindo-se os 
								processos de impressão gráfica e também a 
								fotografia - “o seu agente mais poderoso é o 
								filme. O seu significado social também é 
								inimaginável” (Benjamin, 1992, p. 79) tanto como 
								gerador de informação comunicacional, como para 
								redimensionar o pensamento das massas. 
								 Os ecrãs, que passaram a 
								educar a visualidade colectiva para uma nova 
								dimensão da representação, accionaram o 
								pensamento humano a pensar-se dentro de uma 
								dimensão exterior ao próprio corpo, alienado da 
								sua condição humana. O olhar do individuo, que 
								no passado era determinado por imagens 
								vivenciadas no dia a dia e por experiências 
								reais, passou a confrontar-se diante de 
								dispositivos tecnológicos que lhe apresentavam 
								imagens semelhantes e análogas à sua vida, 
								passando a questionar-se sobre a forma em que 
								poderia co-habitar com a cópia instantânea da 
								realidade; e de que maneira ele poderia dialogar 
								com a velocidade e o tempo da informação 
								recebida no ecrã de um pequeno dispositivo, com 
								a gestualidade do seu corpo. |  
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								2. Aproximar o ecrã e afastar a aura do mundo 
								
								
								  
								Olhar para um ecrã, algo é permitido ao homem 
								actual. Ele entra na intimidade do mundo sem ser 
								visto. Isolado na sua individualidade, tem na 
								sua mão um dispositivo que lhe dá acesso rápido 
								à informação, à representação da vida e também à 
								partilha da sua própria realidade de forma 
								imediata e efémera.  
								A tendência incontornavelmente individualista 
								que as sociedades actuais têm permitido adoptar 
								no que diz respeito a cada cidadão, resume-se à 
								crescente alienação da aura natural e envolvente 
								da realidade exterior e sensitiva que compõe o 
								individuo, o qual se vai entregando em massa ao 
								“brilho” fugaz dos dispositivos tecnológicos, 
								com um menor esforço para consegui-lo. Essa 
								perca de identidade, semelhante à “aura” de que 
								Walter Benjamin se refere ao falar das 
								manifestações sensoriais com a natureza, cujo 
								sentimento se distância cada vez mais do homem 
								por consequência do “condicionalismo social da 
								actual decadência da aura” (Benjamin, 1992, p. 
								81), é agora transversal à actualidade - à forma 
								massificada como as imagens alimentam cada vez 
								mais a nossa visualidade e ao anseio em nos 
								ligarmos e aproximarmos aos acontecimentos do 
								mundo de forma instantânea. 
								“Aproximar as coisas espacial e humanamente é 
								actualmente um desejo das massas tão apaixonado 
								como a sua tendência para a superação do 
								carácter único de qualquer realidade, através do 
								registo da sua reprodução” (Benjamin, 1992, p. 
								81). 
								Actualmente, cada vez que nos ligamos aos nossos 
								pequenos ecrãs - telemóveis ou computadores - 
								para nos “conectarmos” com o mundo, não nos 
								apercebemos que, mesmo sem eles, a realidade do 
								mundo mantém-se ligada ao nosso ser em estado 
								permanente. Ao vivermos em constante dependência 
								com esses pequenos dispositivos, assumimos em 
								massa que ganhámos mais um novo órgão para o 
								nosso corpo e que não conseguimos 
								psicologicamente viver sem ele. Tornou-se uma 
								extensão da nossa existência, da nossa 
								individualidade, do nosso braço (Fig.2). |  
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										Fig. 2. O telemóvel, novo órgão do 
										corpo, extensão do braço. |  |  |  
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								Sherry Turkle, na 
								conferência 
								
								Connected, but alone? 
								afirma, referindo-se aos telemóveis, que esses 
								pequenos aparelhos que estão tão próximos de 
								nós, no nosso bolso, são tão psicologicamente 
								potentes, que não só alteram o que fazemos como 
								também alteram quem nós somos (1). Estarmos 
								conectados na 
								
								net 
								faz-nos parecer ilusoriamente que assumimos o 
								controlo das nossas vidas e que temos o 
								conhecimento de tudo o que se passa no mundo. 
								Este processo, na verdade, é um paradoxo como 
								indica o título da conferência de Turkle. 
								Poderemos de facto ter essa sensação ilusória de 
								estarmos acompanhados e ligados à infinita rede 
								de informação mas, na realidade, encontramo-nos 
								num processo hipnótico de isolamento (Fig.3). 
								Tentamos quebrar a solidão ligando-nos ao mundo 
								através do ecrã de um dispositivo. Ao mesmo 
								tempo, receando o isolamento, perdemos toda a 
								noção do tempo real da nossa vida, ficando por 
								fim ligados a essa solidão. 
								
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										Fig. 3 Texting together. Alone together? 
										Credits Sherryl Turkle |  |  |  
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								As imposições sociais 
								da actualidade e a democratização da imagem 
								mostradas através dos media tendem a provocar, 
								cada vez mais, sensações de insegurança do 
								próprio eu. O sentimento de decepção muitas 
								vezes experienciado pelo individuo, relativo à 
								sua imagem perante a sociedade, faz com que haja 
								um desejo inconsciente de assumir uma nova 
								individualidade. Nos nossos dias essa forma de 
								metamorfose virtual tornou-se espontaneamente 
								inteligível porque “a vida no ecrã faz com que 
								mais facilmente um individuo se apresente como 
								outra pessoa do que na vida real” (Turkle, 1995, 
								p.371). 
								 
								
								Estamos agarrados ao 
								nosso novo “órgão/tecnológico”, com a 
								dependência psicológica que isso significa, como 
								um tipo de escravatura que “opera por detrás de 
								uma certa invisibilidade” (Mirzoeff, 2009, p. 
								68) e, neste sentido, todo o individuo funciona 
								como uma peça fundamental, alienada de si, 
								
								para que o sistema 
								económico das sociedades gire como um circulo 
								que não tem principio nem fim – “a sensação de 
								que a escravidão acabou ou se deve esquecer, 
								deixa de fora a ideia do seu papel formativo na 
								formação da modernidade” (Ibidem,
								p.68). |  
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								Referências 
								
								Benjamin, Walter (1992) Sobre Arte, Técnica, 
								Linguagem e Política. Lisboa: 
								
								Relógio D’Água. 
								Mirzoeff, Nicholas (1999).
								An 
								Introduction to Visual Culture. Londres e 
								Nova York: Routledge. 
								
								Turkle, Sherry (1995)
								Life on 
								the Screen, Identity in the Age of the Internet. 
								New York: Simon & Schuster Paperbacks. 
								
								[Consult. 2015-05-19] Disponível em <URL: http://www.theparisreview.org/blog/2014/03/19/the-first-footage-from-the-cinematograph/> 
								
								[Consult. 2015-05-19] Disponível em <URL: http://pplware.sapo.pt/informacao/10-coisas-estupidas-que-fazemos-com-smartphones/> 
								
								[Consult. 2015-05-19] Disponível em <URL: http://cooperatie-wow.nl/2013/09/16/the-innovation-of-lonelyness/#!prettyPhoto> |  
								|  |  
								| (1)
								
								
								(Cf. em: 
								http://www.ted.com/talks/sherry_turkle_alone_together/transcript?language=en) |  
								|  |  |  |