Os homens
vivem assombrosamente no interior da morte
Os homens vivem
assombrosamente no interior da morte,
a cada dia morrem de
orfandade na voragem do tempo:
morrem nas distâncias,
idades contadas ao vento,
nas dores surdas do
corpo do coração assolado,
nas vozes mudas, nas
pedras de medo e solidão;
morrem nos instantes
onde sepultam os nomes
os lugares, as palavras
ditas e não-ditas,
muros altos que não
conseguem habitar;
morrem nas máscaras nas
mãos fechadas,
nas fugas nos rituais
nas metamorfoses,
nas horas inflexíveis
dos estendais da vida;
morrem na insanidade,
nas sombras de exílio,
nas ventosas obscuras do
aniquilamento,
no sangue devastado por
dentro;
morrem na aridez das
terras incultas,
na sede do calor
incendiário do deserto
nos destroços dos dias
de rastilho aceso;
morrem nas margens da
unidade cósmica
em fragmentos,
estilhaços de andaimes e cimento
em arquitectura de fim
dos antigos caminhos;
morrem a soldo por mesas
requentadas e
hipóteses de pão, em
meio das brumas
que escondem vampiros e
ultimatos de sangue:
os homens morrem
assombrosamente em vida,
como folhas d’outono que
rasam o chão, sem retorno.
|