Revista TriploV de Artes, Letras & Ciências . ns
NS . nº 53 . agosto-setembro 2015 . Índice

ANA PINTO

Pinturas-poema
 

Ana Pinto . Poeta e artista plástica portuguesa, natural de Setúbal. Estuda conservação e restauro de pintura de cavalete e, posteriormente forma-se em cerâmica criativa, que desenvolve a par com a pintura. Contacta com o restauro de arqueologia e explora as temáticas clássicas na poesia. Tem traduzido poetas como Gérard de Nerval e Charles Baudelaire. Dos vários títulos de poesia publicados surgem também dois álbuns de pinturas-poemas, abordando literatura e artes plásticas, trabalhando os dois contextos.

 
 

Gaia 

Eu sou a filha das brisas, das folhas orvalhadas,
Das verdes manhãs da inocência, do rubor do Outono.
Estou presente nos primeiros silêncios da Primavera 
E na seiva do fruto e no perfume da terra molhada sou eu.

Cresço no olhar da criança que espelha as estrelas 
E nos braços da mulher sou uma oferenda de asas.
Solto os cabelos na terra para o vento abotoar no meu peito
Todos os caules solares da esplêndida virgindade da cor

 
 

Endymion 

Endymion que na encosta nua
Imóvel, alheio, inconsciente
Vive a vida da morte aparente
Da vida que é sono e foi a sua

Cego, seu rosto grave na folhagem
Do sono sem sonhos sua beleza uniu
À clareira de Latmos. Foi a prata que o cingiu
E brilha no perfeito círculo da miragem

Seu corpo sempre jovem e eterno
Não se sacia com a água das nascentes
Nem espera a fresca aurora ou os poentes

É dos montes seu ser e sua imagem
Una e imortal. Ali no silêncio que ficou
Só sente a sombra de Seléne que o amou.
 

 

Ana Pinto, Endymion e Seléne, acrílico s/tela

 
 

Leda e o Cisne


Como te encontrar sem dor sem repouso
Macerada erva sombra salvia de terno seio?
Defeso fruto, antes tomado - proibido o veio.
Podadas asas serei assim - num só sopro 
em teu corpo em carnação me tornarei.  

Unguento o poro, enlevo o rasgo,
a madre, a pele. Súbito lance, ferindo o bico
e tomarei. Espelho de água, impura
luz não me revela.  
E tu, dormente, e tu absorta, ao sol te entregas
fluindo a sede da minha seda – 
Penas verás e elevarei.
Morro no ventre, na morte amada
rasgando lagos.
Dual gestante, pira carregada
do meu incêndio.  
 

 
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Maria Estela Guedes
 
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