| 
      
        |  |  | 
 |  
        | REVISTA TRIPLOVde Artes, Religiões e Ciências
nova série | número 52 | 
		junho-julho | 2015    |  
        |  | 
			
				|  |  
				| 
          
            | 
				JOSÉ PINTO CASQUILHO
 
			Análise 
			crítica do Colóquio Quadragésimo Nonode Garcia de Orta intitulado
 "De tres maneiras de sandalo" 
			
			(1)
   |  
            | 
				José Pinto Casquilho – Programa de 
				Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade Nacional Timor Lorosa’e 
				(josecasquilho@gmail.com) |  |  
				| 
				Resumo 
				Neste 
				trabalho citam-se excertos do Colóquio nº 49 do livro “Colóquios 
				dos Simples e Drogas da Índia” de Garcia de Orta, médico judeu 
				sefardita português que viveu no século XVI e exerceu a 
				profissão durante mais de trinta anos em Goa, considerado 
				pioneiro da medicina tropical. Procura-se relacionar com outros 
				escritos da época e também com literatura científica 
				contemporânea a propósito da área de ocorrência da espécie
				Santalum album L. e 
				das suas propriedades terapêuticas e medicinais, bem como dos 
				usos tradicionais. A edição original da obra foi publicada em 
				Goa em 1563, com o título “Coloquios 
				dos simples e drogas he cousas medicinais da India e 
				assi dalgũas frutas achadas nella onde se tratam algũas cousas 
				tocantes a medicina, pratica, e outras cousas boas pera saber”, 
				mas a que servirá de suporte a esta análise é a edição publicada 
				pela Academia Real das Ciências de Lisboa em 1895, dirigida e 
				anotada pelo Conde de Ficalho. Como teremos ocasião de ver, o 
				sândalo branco e amarelo são a mesma espécie, mas já o designado 
				sândalo vermelho antes é uma leguminosa. Finaliza-se este 
				escrito afrontando um mistério, de que decorre um tópico de 
				pesquisa.  |  
				|  |  
				| 
				
				Palavras-chave:
				Santalum album L.; 
				História; Biogeografia; Usos tradicionais e medicinais; Pesquisa |  
				|  |  
				| 
				Dizem os malaios mercadores que Deus 
				criou Timor de sândalos, Banda de maças e as de Maluco de cravo
 e que no mundo não é sabido outra parte em que
 estas mercadorias hajam, somente nestas.
 
					Tomé Pires, Suma Oriental, Tomo II 1512-1515  |  
				|  |  
				| 
				Introdução Garcia de Orta, médico português, judeu 
				sefardita, natural de Castelo de Vide no Alentejo, nasceu no 
				início do século XVI (1501 ou 1502), estudou medicina nas 
				universidades de Salamanca e Alcalá de Henares e em 1526 já 
				exercia medicina em Lisboa, tendo sido professor na universidade 
				lecionando Filosofia Natural e Moral. Rumou à Índia portuguesa 
				em 1534 como médico-chefe integrado na frota de Martim Afonso de 
				Sousa - que se notabilizou conquistando Diu em 1535 sendo depois 
				alçado a Governador (1542-1545). Garcia de Orta estabeleceu-se 
				em Goa em 1538, onde adquiriu notoriedade, tornando-se médico 
				dos Vice-reis e Governadores portugueses tendo inclusivamente 
				assistido Burhan Nizam Shah I de Ahmednagar, um dos sultanatos 
				do Deccan. Ainda foi detentor do foro da cidade de Bombaim 
				(Mumbai) entre 1554 e 1570 (2) e a sua casa localizava-se junto 
				do castelo. Hoje é considerado um dos pioneiros da medicina 
				tropical. |  
				|  |  
				|  |  
				| Fig. 1- Garcia de Orta |  
				| 
				Escreveu 
				um tratado conhecido abreviadamente como “Colóquios dos Simples 
				e Drogas da Índia” cuja edição original foi publicada em Goa em 
				1563, com o título “Coloquios 
				dos simples e drogas he cousas medicinais da India e 
				assi dalgũas frutas achadas nella onde se tratam algũas cousas 
				tocantes a medicina, pratica, e outras cousas boas pera saber” 
				que dedicou a Martim Afonso de Sousa. A importância deste 
				trabalho foi imediatamente reconhecida pelo naturalista flamengo 
				Carolus Clusius após ter deparado com uma cópia dos Colóquios em 
				janeiro de 1564, que resumiu para latim, ilustrando e fazendo-a 
				publicar em Antuérpia em 1567 (3) (Fontes da Costa & 
				Nobre-Carvalho, 2013). Nesta obra, escrita sob a forma de 
				diálogos hipotéticos com Ruano (que também teria estudado em 
				Alcalá e Salamanca), o colóquio Quadragésimo Nono é dedicado ao 
				sândalo. Vamos utilizar excertos da edição publicada pela Real 
				Academia das Ciências de Lisboa em 1895, comentada pelo Conde de 
				Ficalho, para confrontar com outros escritos - uns da época, 
				outros mais recentes ou contemporâneos -, a propósito da área de 
				origem da espécie e dos usos tradicionais, medicinais e rituais 
				do sândalo, comummente designado de “branco” ou “amarelo”(Santalum 
				album L.). |  
				|  |  
				|  |  
				| 
				
				Figura 2 – Capas da edição original dos Colóquios dos Simples e 
				Drogas da Índia de Garcia de Orta (Goa, 10 de Abril de 1563) e 
				da edição da Academia Real das Ciências de Lisboa de 1895 |  
				| 
				
				Biogeografia do sândalo 
				Diz-nos 
				Garcia de Orta (p. 281) (4) 
				: 
				“O 
				sandalo nasce acerqua de Timor, onde ha a maior quantidade; e he 
				chamado chandam: com este nome se chama por todas as terras 
				visinhas a Malaqua; e os Arabios, como pessoas que cheiravam o 
				comercio destas terras, corrompendo o vocabulo, lhe chamaram 
				sandal. Todo o Mouro de qualquer naçam que seja o chama asi; e 
				os Canarins e Decanins e Guzarates o chamam cercandá. Nacem e 
				crecem os arvores do sandalo em Timor, donde he a maior 
				cantidade; e sam matas que não se acabam de gastar, asi de huma 
				banda da ilha como da outra.”
				
				
				 Como se vê, Garcia de Orta coloca a 
				origem do sândalo na ilha de Timor, o que está de acordo com a 
				citação anterior de Tomé Pires em epígrafe e ainda com outros 
				escritos quinhentistas - por exemplo, entre outros, Duarte 
				Barbosa (c. 1516) também falava do
				sândalo branco e cor 
				de limão, que nasce em uma ilha chamada Timor; ou ainda Camões 
				no Canto X de Os Lusíadas (1572: 183) na única referência à 
				ilha: Ali também Timor, que o lenho manda, sândalo salutífero 
				e cheiroso. O género
				Santalum compreende 
				um número de espécies que é referenciado correntemente de forma 
				variável, como sendo de 18 (Subasinghe, 2013) mas também de 29 
				(Applegate & McKinnel, 1993), estendendo-se da Índia e da 
				Indonésia até às ilhas Juan Fernandez perto da América do Sul. É 
				possível que esta diferença substancial se reporte a distinções 
				taxonómicas que, nalguns casos, uns autores associem a espécies 
				diferentes enquanto outros antes as considerem variedades: 
				Brennan e Merlin (1993) referem que uma revisão aprofundada da 
				literatura estabelece 16 espécies de sândalo (uma das quais 
				extinta) e 17 variedades. Em qualquer caso, de entre o conjunto, 
				vamos apenas incidir sobre a mais conhecida: o sândalo branco (Santalum 
				album L.). 
				
				Atualmente, a origem do sândalo branco indexada à ilha de Timor 
				tornou-se ténue na bibliografia de expressão anglófona: a 
				espécie é referenciada mais frequentemente como “sândalo indiano 
				(5)” 
				(e. g. Annapurma et al., 2004; Gamage et al., 2010; Subasinghe 
				et al., 2013) ou ainda “sândalo indiano oriental” (Kumar et al., 
				2012) reportando-se a sua área biogeográfica principal às 
				florestas do Sul da Índia, nomeadamente Karnataka, Tamil Nadu e 
				Kerala; outros autores a dizem nativa também do Sul da Índia mas 
				antes da região de Coorg, Chennai e Mysore (Sindhu et al., 
				2010), eventualmente acrescentando-se ainda o Sri Lanka e o 
				Norte da Austrália. No entanto, alguns reportam a área 
				geográfica de origem da espécie a ilhas da Indonésia, e também 
				regiões da Índia (Brennan & Merlin, 1993), explicitando 
				ocasionalmente a ilha de Timor (e. g. Applegate & McKinnel, 
				1993); Harisetijono e Suriamihardja (1993) referem que o sândalo 
				branco localmente denominado
				cendana, ocorria 
				principalmente nas ilhas de Timor e de Sumba, na parte ocidental 
				das Flores, e ainda nas ilhas de Alor e Roti. De entre as “tres maneiras de sandalo” 
				referidas por Garcia de Orta entende-se no diálogo que se trata 
				de “sandalo vermelho”, “sandalo branquo” e “sandalo amarelo”, 
				dizendo-nos sobre a primeira (pág. 281/282): “[…]
				e porém em Timor não 
				nasce este sandalo vermelho […]. 
				E a feiçam deste arvore de sandalo vermelho, até ao presente, 
				não o pude saber; mas sei ao certo que vem dali todo o sandalo 
				vermelho, o qual se gasta muyto pouquo nesta terra, porque não o 
				gasta a gente mais que pera febres […]. 
				E também se gasta cá o vermelho em pagodes ou ídolos, e amde ser 
				os páos muyto grandes; […]” 
				 Diz-nos o Conde de Ficalho nas anotações 
				finais do colóquio que o “sandalo vermelho” (raktachandana 
				em sânscrito) não é 
				espécie do género 
				Santalum mas antes uma leguminosa, mais propriamente o
				Pterocarpus santalinus 
				L., que existe nas florestas do Sul da Índia, tanto na parte 
				ocidental como nas costas do Coromandel, não sendo fácil 
				perceber porque lhe deram o mesmo nome do género. A madeira é 
				empregada em usos medicinais, como adstringente e tónica, e 
				externamente como refrigerante – portanto com usos semelhantes 
				ao sândalo -, mas ao contrário deste é insípida e inodora. Já sobre a distinção entre “sândalo 
				branco” e “sândalo amarelo”, que são a mesma espécie sendo o tom 
				amarelado imputado a árvores em geral mais velhas que acumularam 
				mais óleo na região do cerne, pode ver-se que essa hipótese não 
				é descartada por Garcia de Orta na resposta à pergunta de Ruano 
				(p. 284): Ha de duas 
				maneiras sandalo em Timor, ou he todo branco? E qual he mais 
				estimado? “[…]
				posto que falando o outro 
				dia com hum mercador, que sabe bem essas terras, me disse, que 
				na parte que he mais descuberta de sol há muyto sandalo amarelo, 
				e mais ambas as maneiras de sandalo tem as arvores semelhantes, 
				que nos nam conhecemos a deferença que ha entre os arvores.[…]” Descrevendo a árvore diz-nos Orta (p. 
				284): 
				
				“O 
				arvore do sandalo he tamanho como huma nogueira; e a folha he 
				muyto verde, e he feita como a da aroeira; deita frol azul 
				escura, e dá huma fruta verde do tamanho da cereja, e cae 
				azinha, e he primeiro verde, e depois preta e sem sabor.”  |  
				|  |  
				| 
				Um pouco 
				de História Não há dúvidas sobre a importância 
				estratégica de Malaca no comércio asiático e não só, 
				estendendo-se a Meca e ao Mediterrâneo. Albuquerque não hesita 
				em considerar Goa e Malaca “as maiores duas coisas da Índia” em 
				carta de 30 de Outubro de 1512 enviada ao rei Manuel I de 
				Portugal (Bulhão Pato, 1884: 97). Tomé Pires, em
				Suma Oriental, 
				escrita entre 1512 e 1515, refere Malaca como não havendo igual, 
				e que lá se processava o comércio de toda a espécie e de todas 
				as partes do mundo (2005: 285), a que não era alheio o facto de 
				a região se situar no fim das monções. Ainda o mesmo autor 
				descreve, em relação ao sândalo, que os Malabares, vindos das 
				regiões de Coromandel e Pulicat na Índia, trazendo meia dúzia de 
				navios em cada ano, com trinta espécies de ricos tecidos, 
				levavam de volta principalmente sândalo branco (p: 272), porque 
				o sândalo vermelho crescia nas suas terras; também de Cambaia 
				vinha um navio cada ano e levava de volta especiarias e sândalo 
				(p: 270); ainda acrescenta que de Java vinham mercadores na 
				demanda de cravinho, maças, noz moscada e sândalo (p: 241). 
				Falando dos empreendimentos portugueses no tempo, após a tomada 
				de Malaca em 1511, afirma que os barcos vão a Timor na demanda 
				do sândalo (p: 283). Com efeito é sabido que Afonso de 
				Albuquerque mandou sair em Novembro de 1511 uma armada de três 
				navios, comandada por António de Abreu, para descobrir as ilhas 
				das especiarias, onde constava uma caravela que transportava o 
				piloto-cartógrafo Francisco Rodrigues. Nesta viagem, navegaram 
				por Norte da corda de ilhas entre Java, Solor e Wetar e foram 
				até Damboino (Ambom) e às ilhas Banda, onde carregaram cravo, 
				noz e maça.  A nau Santa Catarina, pilotada por 
				Francisco Rodrigues, regressou a Malaca pela mesma rota, em 
				Dezembro de 1512, não tendo sequer sido avistada a ilha de Timor 
				ao que consta, mas terá sido recolhida informação a propósito, 
				pois que da série de 68 cartas panorâmicos desenhadas por 
				Francisco Rodrigues, numa delas (fol. 37) encontra-se a 
				inscrição “A Jlha de 
				timor homde naçe o ssambollo“ que constitui a primeira 
				aparição da ilha de Timor na cartografia europeia, portanto 
				associada à existência do sândalo. |  
				|  |  
				|  |  
				| Figura 3 – “A Jlha de 
				timor homde naçe o ssambollo“ é uma frase que se encontra 
				inscrita no esboço de Francisco Rodrigues (1512) – aqui 
				representada no topo superior da figura. Portvgaliae 
				Monvmenta Cartographica. 1960. Vol. I: 78-84. Pl. 34-36 (6) |  
				|  |  
				| 
				Rui de 
				Brito Patalim, capitão de Malaca, em duas cartas enviadas em 
				Janeiro de 1514, diz que Timor “he hua ylha alem de Java, tem 
				muytos sandallos, muyto mel, muyta cera ... nom tem juncos pera 
				navegar“ razão porque ainda lá se não tinha ido mas, mostrando a 
				intenção em que está em fazer dela terra portuguesa “...quero 
				agora mandar la huma dalle e huma caravela, por ver e apalpar se 
				posso tomar a posse dela ... “. Na segunda, para o Vice-Rei da 
				Índia, justifica que “... a Timor quisera mandar ... “ e que não 
				pudera naquela monção, por falta de juncos, mas que “... laa 
				pera o ano prazendo o noso senhor yram la pera trazerem o 
				sandalo ... he muito boa navegaçam“(7). 
				Ao que parece a primeira expedição ocorreu a bordo de um navio 
				ou junco chamado Luso-Malay 
				(Paulino, 2012). A chegada dos 
				portugueses a Timor, embora exploratória, poderá ter-se dado em 
				1514 (Thomaz, 1998: 594). Em Lifau, no enclave de Oecussi, 
				encontra-se um padrão com a seguinte inscrição: “Aqui 
				desembarcaram portugueses em XVIII-VIII-MDXV“. 
				 Duarte Barbosa (1516, 1966: 203), 
				diz-nos: assim navegam desta cidade de Malaca para todas as 
				ilhas que estão por todo esse mar, e para Timor, donde trazem 
				todo o sândalo branco, que entre os mouros é mui estimado e vale 
				muito. Ou ainda (Barbosa, 1516, 1966: 211): nesta ilha há muitos 
				sândalos brancos, que os mouros muito estimam na Índia e na 
				Pérsia, onde se gasta muita soma deles, e têm grande valia no 
				Malabar, Narsinga e Cambaia.Antes dos portugueses existem várias referências de manuscritos 
				chineses à ilha de Timor (8), correspondente ao topónimo
				Ti-wu (com variantes
				Ti-mat,
				Ti-mön, ou
				Ti-men) e se num primeiro, datado de c. 1250, se referem várias 
				ilhas e regiões a propósito das especiarias incluindo o sândalo, 
				no 
				 Tao-I-Chih-Luëh
				
				
				(9), datado de c. 1350, existe uma descrição detalhada da ilha 
				de Timor (Ti-men) 
				afirmando-se que nas montanhas não crescem outras árvores senão 
				sândalo, que é muito abundante (Durand, 2006: 35). |  
				|  |  
				|  |  
				| Usos tradicionais 
				do sândalo Sobre os usos do sândalo, medicinais e 
				higiénicos, diz-nos Garcia de Orta (p. 282): 
				
				“E 
				quanto he ao sandalo branquo e amarelo, muyto grande cantidade 
				se guasta em toda a India; porque toda a mais gente, ora sejam 
				Mouros ora Gentios, se untam com sandalo desfeito em aguoa, e 
				pisado em pedras, que pera esse mister tem feitas; e asi untam 
				todo o corpo até que se seca pera estarem frios, e cheirarem 
				bem; porque esta terra he muito quente, e a gente della muyto 
				amigua de cheiros.” Os usos medicinais e terapêuticos do 
				óleo e do pó de sândalo estão referenciados em bibliografia 
				recente de que se salientam: efeito refrescante e sedativo, 
				tónico cardíaco, digestivo, anti-oxidante, anti-pirético, 
				antídoto de venenos, purificador do sangue, anti-cancerígeno em 
				especial relativo à epiderme (e. g. Sindhu et al., 2010; 
				Mukherjee, 2013), sendo os constituintes principais um álcool 
				sesquiterpénico designado santalol com dois isómeros (α-santalol 
				e β-santalol).
 Um outro uso referido para o sândalo é a 
				sua utilização nas piras funerárias dos notáveis e ricos, na 
				Índia mas também noutras regiões da Ásia - na Peregrinação, 
				Fernão Mendes Pinto refere vários exemplos (e. g. Pinto, 1996 
				(1614): 616, 727). |  
				|  |  
				| Sobre a área de 
				origem do sândalo  
				Às tantas 
				Ruano afirma (p. 285): “Antonio 
				Musa diz que o sandalo aos Portuguezes o devemos; que o trazem 
				do campo de Calecut, onde se colhe, e que Calecut he a principal 
				feira que ha na India; e vós dizeis que o ha em Timor, e o 
				vermelho em Tanasarim, terras confins de Malaca.” Ao que Orta responde: 
				“[…] 
				em Calecut não ha campo, senam serras e palmares ao longo da 
				praia; e o [sândalo] que vem, os Portuguezes o trazem nas suas náos de Malaqua em muita 
				cantidade, donde vem ter a Cochim e a Goa; e destes portos se 
				reparte para o Malavar e o Canara, e Benguala, e pera o Decam, e 
				pera o Guzarate: e a mais pequena parte vai pera Ormuz, e pera 
				Arabia, e pera Portugal, como vos já dixe.” Ainda 
				afirma Orta (p. 283) 
				
				“E 
				tornando a dizer donde nasce o sandalo branco e amarelo, diguo 
				que em Timor (a qual ilha tem muytos portos de huma banda e de 
				outra); e diguo que o de Mena, que he hum porto, he o milhor de 
				todos, e tem menos páo que os outros: e Matomea, que he outro 
				porto, tem um sandalo amarelo, mas tem muyto páo.[…]
				E também há sandalo em 
				Verbali (que he um porto de Jaoa 
				(10) 
				e há nelle sandalo amarelo 
				e branco, e tem muyto forte cheiro, mas dura este sândalo 
				pouquo;” Diz-nos ainda Garcia de Orta (p. 287) 
				“[…]porque 
				o branquo he mais chegado a natureza do citrino; pois ambos se 
				acham em huma mesma terra e o vermelho he muyto longe donde 
				nasce o branco. E tambem quero que saibaes que este arvore do 
				sandalo se dá em outras partes, se o prantam, e eu o vi em 
				Amdanager, onde foi trazido para se semear: e he este Amdanager 
				huma cidade do Decam, onde reside o Nizamoxa 
				(11), 
				cuja he, muytas vezes.” 
				
				Podemos dizer que fica a pairar um mistério. Não havendo dúvida 
				de que a ilha de Timor era a principal fonte do comércio de 
				sândalo (12), 
				não se percebe bem por que as matas da Índia não seriam 
				mencionadas e/ou exploradas com um estatuto relevante. É verdade 
				que Orta também afirma, aliás encerrando o colóquio (p. 288): “E 
				também dizem as Malavares que há na sua terra hum páo cheiroso 
				que parece ser sandalo branquo; e untamse com ele pera as 
				febres, e chamamlhe os Malavares sambarane.”
 O 
				Conde de Ficalho debruça-se sobre este tópico e avança a 
				interpretação de que não se teria feito a identificação entre as 
				árvores da Índia e as das regiões mais afastadas, onde se inclui 
				Timor, acrescentando ainda que Orta fala de uma madeira das 
				proximidades do cabo Camorim que designa como
				aguila brava – que 
				também é referida como utilizada nas piras funerárias – que, na 
				sua opinião, não será mais do que o sândalo. Tendo 
				em vista uma pesquisa futura mais aturada deixam-se escritas 
				hipóteses alternativas que ajudem a sistematizá-la. 
				 |  
				|  |  
				| Tópico de pesquisa 
				
				A questão que se coloca então, é: se a existência do sândalo (Santalum 
				album L.) era tão exuberante no Sul da Índia, o que terá 
				levado os portugueses e outros à sua demanda longínqua em Timor? Só parecem existir três hipóteses para 
				responder a esta dúvida: 
				
				-         
				
				As 
				florestas de sândalo no Sul da Índia existiam mas não eram 
				mencionadas como relevantes, por alguma razão insólita – seja, 
				por exemplo, a de não se fazer a identificação com a árvore de 
				sândalo, como ficou dito acima; 
				
				-         
				
				As 
				florestas de sândalo na Índia eram conhecidas mas 
				consideravam-se inacessíveis por algum fator, de ordem política, 
				religiosa, logística, ou outra; 
				
				-         
				
				As 
				florestas de sândalo no Sul da Índia não existiam no início do 
				século XVI e terão sido plantadas depois, talvez com propágulos 
				de sândalo provenientes de Timor. Em qualquer caso, parece que importará 
				fazer um resgate da importância comprovada de Timor na origem e 
				rotas do sândalo - ora algo obliterada na bibliografia 
				contemporânea -, hoje um recurso bastante exaurido em 
				Timor-Leste que deveria suscitar uma estratégia de regeneração 
				(e.g. McWilliam, 2001). |  
				|  |  
				|  |  |  
        | EDITOR | 
		TRIPLOV |  |  
        | ISSN 2182-147X |  |  
        | Contacto: revista@triplov.com |  |  
        | Dir. Maria Estela Guedes |  |  
        | Página Principal |  |  
        | Índice de Autores |  |  
        | Série Anterior |  |  
        | SÍTIOS ALIADOS |  |  
        | Apenas Livros 
		Editora |  |  
        | 
		Arte - Livros Editora |  |  
        | Domador de Sonhos |  |  
        | Agulha - Revista 
		de Cultura |  |  
        | Revista 
		InComunidade |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  |  
        |  |  
        |  |  |  
        |  | (1) Texto de suporte a uma comunicação com o 
		mesmo título apresentada na Conferência Internacional “A Produção do 
		Conhecimento Científico em Timor-Leste”, 13-15 de agosto de 2014, 
		Universidade Nacional Timor Lorosa’e, Díli. 
 (2)  Esta data, posterior à sua morte ocorrida em 1568, reflete que 
		o foro permaneceu até então na família próxima.
 
 (3) Intitulada: Aromatum et 
		simplicium aliquot 
		medicamentorum apud indos nascentium historia.
 
 
			(4) Nos excertos do Colóquio que 
			apresentamos mantemos a grafia da edição de 1895. (6) Veja-se Jaime Sales Luís,
		op. cit. (p: 6).
 
 
			(7) Cf.
			Bulhão Pato (1903)
			in Jaime Sales Luís
			op. cit. 
			 
			(8) Cf. Frédéric 
			Durand op. cit. pag. 32 e 
			seguintes. 
			 
			(9) Traduzido por Durand como “testemunho 
			resumido das nações insulares”.   
				(10) Grafia usada no tempo para designar 
				a ilha de Java. 
				(11) Maneira 
				como Orta se refere no texto ao atrás mencionado Nizam Shah I de 
				Ahmednagar. 
				 
				(12) Não 
				esquecendo a ilha de Sumba, ao Sul da de Flores, que o Conde de 
				Ficalho refere que foi chamada ilha Chandana, ou seja, ilha do 
				sândalo. |  
        |  |  |  
        |  | Referências 
		bibliográficas Annapurma, D.; Rathore, T. S.; Joshi, G. 2004. 
		Effect of container type and size on the growth and quality of seedlings 
		of Indian sandalwood (Santalum 
		album L.). Australian Forestry, 
		vol. 67, n. 2, pp. 82-87. Applegate, G. B.; McKinnel, F. H. 1993. The 
		management and conservation status of
		Santalum species occuring in 
		Australia. In McKinnel, F. H. (Ed.)
		Sandalwood in the Pacific region. 
		Proceedings of a symposium held on 2 June 1991 at the XVII Pacific 
		Sciences Congress, Honolulu, ACIAR Proceedings, n. 49, pp. 5-12. Barbosa, Duarte. (1516) 1966.
		Livro – em que dá relação do que 
		viu e ouviu no Oriente (introdução e notas de Augusto Reis Machado). 
		Lisboa: Agência Geral das Colónias. Brennan, P.; Merlin, M. 1993. Biogeography and 
		traditional use of Santalum in 
		the Pacific region. In McKinnel, F. H. (Ed.)
		Sandalwood in the Pacific region. Proceedings of a symposium held on 
		2 June 1991 at the XVII Pacific Sciences Congress, Honolulu, ACIAR 
		Proceedings, n. 49, pp. 30-38. Bulhão Pato, R. A. 1884.
		Cartas de Afonso de Albuquerque, 
		Tomo I. Lisboa: Academia Real das Ciências de Lisboa. Camões, Luís de. 1572.
		Os Lusíadas. Lisboa: Antonio 
		Gõçalvez Impressor. Durand, Frédéric. 2006.
		Timor: 1250-2005. 750 ans de 
		cartographie et de voyages. Toulouse - Bangkok: Editions Arkuiris- 
		IRASEC. 
		Fontes da Costa, 
		P.; Nobre-Carvalho, T. 2013. Between East and West: Garcia de Orta’s
		Colloquies and the circulation 
		of medical knowledge in the sixteenth century.
		Asclepio v. 65, n. 1, p:0008.
		
		
		http://dx.doi.org/10.3989/asclepio.2013.08 Gamage, Y. M. M.; Subasinghe, S. M. C. U. P.; 
		Hettiarachchi, D. S. 2010. Change of seed germination rate with storage 
		time of Santalum album L. 
		(Indian sandalwood) seeds. 
		Proceedings of the 15 th International Forestry and Environment 
		Symposium 26-27 November, pp. 279-281. Harisetijono; Suriamihardja, S. 1993. Sandalwood 
		in Nusa Tenggara Timor. In McKinnel, F. H. (Ed.)
		Sandalwood in the Pacific region. 
		Proceedings of a symposium held on 2 June 1991 at the XVII Pacific 
		Sciences Congress, Honolulu, ACIAR Proceedings, n. 49, pp. 39 – 43. Kumar, A. N. A.; Joshi, G.; Ram, H. Y. M. 2012. 
		Sandalwood: history, uses, presente status and the future.
		Current Science, vol. 193, n. 
		12, pp. 1408-1416. McWilliam, A. 2001. Haumeni, not many: renewed 
		plunder and mismanagement in the Timorese sandalwood industry. In: 
		Fisher, K. (Ed.) Resource 
		Management in Asia-Pacific Working Paper n. 29, Canberra. Mukherjee, A. 2013. Bioresource conservation: 
		Traditions in India. The Ecoscan, Special issue, vol. 3, pp: 57-63. Orta, Garcia de. (1536) 1895.
		Colóquios dos Simples e Drogas da 
		Índia (dirigida e anotada pelo Conde de Ficalho), vol. II. Lisboa: 
		Real Academia das Ciências de Lisboa. 
		
		Paulino, Vicente. 2012. Remembering the Portuguese Presence in Timor and 
		its Contribution to the Making of Timor’s National and Cultural 
		Identity, in (Laura Jarnagin, 
		Ed.) Portuguese and Luso-Asian 
		Legacies in Southeast Asia 1511-2011, vol. 2, Singapore: Iseas 
		Publishing, pp: 88-111. 
		
		Pinto, Fernão Mendes. 1998 (1614). 
		Peregrinação (transcrição de Adolfo Casais Monteiro). Lisboa: 
		Imprensa Nacional – Casa da Moeda. Pires, Tomé (1512-1515) 2005.
		Suma Oriental, vol. II (Ed. 
		Armando Cortesão). New Delhi: Asian Educational Services. Sales Luís, Jaime. 2012.
		A Cultura do Sândalo (Santalum 
		album) em Timor-Leste. Vila 
		Real: Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Série 
		Técnico-Científica nº 44.  Sindhu, R. K.; Upma; Kumar, A.; Arora, S. 2010.
		Santalum album Linn: A review 
		on morphology, phytochemistry and pharmacological aspects.
		International Journal of PharmTech 
		Research, vol. 2, n. 1, pp. 914-919. Subasinghe, S. M. C. U. P. 2013. Sandalwood 
		research: A global perspective. Journal of Tropical Forestry and Environment, vol. 3, n. 1, pp. 1-8. Subasinghe, S. M. C. U. P.; Gamage, Y. M. M.; 
		Hettiarachchi, D. S. 2013. Essential oil contente and composition of 
		Indian sandalwood (Santalum album) 
		in Sri Lanka. Journal of Forestry 
		Research, vol. 24, n.1, pp. 127-130. Thomaz, Luís Filipe. 1998.
		De Ceuta a Timor (2ª Ed.), 
		Algés: Difel.  
 NOTA: quem quiser aprofundar o tema da chegada dos portugueses à ilha 
		Timor no século XVI pode consultar o texto "Memórias do sândalo: Malaca, 
		o atrator Timor e o canal de Solor" http://hdl.handle.net/10400.5/8446
 |  
        |  | 
		 |  
        |  | © Maria Estela Guedesestela@triplov.com
 PORTUGAL
 |  
        |  | 
		 |  
        |  |  |  |  |