REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


nova série | número 44 | fevereiro-março | 2014

 
 

PAULO BRITO E ABREU


Padre Alfredo Vieira de Freitas:
a Paz e o Pão do Espírito Santo

 

Paulo Brito e Abreu (Portugal). Poeta, com vários livros publicados. Também pratica um ensaísmo de tendências místicas.

 

EDITOR | TRIPLOV

 
ISSN 2182-147X  
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Dir. Maria Estela Guedes  
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«Digo-vos, pois: Pedi e ser-vos-á dado; procurai e achareis; batei e abrir-se-vos-á; porque todo aquele que pede, recebe; quem procura, encontra,
e ao que bate, abrir-se-lhe-á.»
in «Evangelho Segundo São Lucas»
 
( convoco, para a faina, o Arcano e Arcaico do Sumo Sacerdote )
 
Acurada, depurada seja a nossa colação: no bosquejo e na busca de um lídimo Poeta, encontramo-nos, desta feita, perante um Teólogo. Um homem que assinava como Padre, um vidente visionário da Católica Eclésia. Pensemos, portanto, em pundonor. Ponderemos e pesemos, o mais que nós pudermos, o viático e via da nossa viagem…
E comecemos, então. As palavras indicam que o Padre Alfredo Vieira de Freitas era movido, ou atraído, por ideal universalista e sem partidos… ( 1 ) É que foi, na verdade, uma força fabulosa e simbólica, que o fez, no fastígio, afastar o diabólico. Mas uma pronta filologia, ou amizade dos vocábulos, nos diz ainda mais, e nos fala mais ainda… E o caso é que Santo Isidoro de Sevilha, nas suas «Etimologias», nos informa que «Teólogos» era o signo dos Poetas pagãos, que pugnavam, com primor, pelo panteão do seu povo…
Lauta notícia, portanto: ao consultarmos a História, todos nós nos damos conta de que Poetas como Homero, Hesíodo, e Isaías ou Ezequiel se moviam, comoviam, no estado Teológico. Por termos eternos, que pondere o ledor: o Poeta é profeta e o profeta é Professor. Se o estado teológico é, para Comte, o estádio primitivo, o culto é sempre a primeira manifestação duma cultura, é o processo paidêutico da parábola, da fábula, de uma hominização. A linguagem, dessarte, como o versejar primeiro, e a Musa, nas artes, seguida e concebida qual a música solene e «o Anjo da poesia», ( 2 ) e já estamos a falar de um homem que tinha um violino em seu coração, cordialmente aqui falamos, na pureza e na beleza, do fulgor e do primor do nosso Padre, que era esteta, da flama visionária emitida como seta.
E tudo isto, para quê? E redargue, em crítica, o crisólogo e crisol: de comum com o Cristão, tem o Poeta o carácter, ou característica, de ser, acima de tudo, sinal de Luz e liberdade, no meio das trevas facciosas. Ele deve portar e transportar o Sol para o nosso Inverno, e o Amor, a filarmónica, a harmonia, para a fereza do inferno. Nos confessa, aliás, o sagrado Sacerdote: peregrino duma perla, e romeiro de Ideal, vai «caminhando para Deus em anseios de Verdade, de Bondade e de Beleza.» Como assertámos, nós outros, em laudas libertas: o culto da Verdade o secundou na Filosofia; o da Beleza, na Poesia; o da Bondade, alfim, numa recta Religião.
E um livro admirável, uma lavra liberal, intitulada «Céu de Estrelas», nos faz, desse modo, avalizar e divisar: na templação da Natura, e no gigântico altar, em tudo o nosso Padre via o espelho e especular do Deus altíssimo, ou, nas palavras do Poeta, «de Deus o nome em tudo estava escrito!» É claro que, numa tal Ontologia, o carácter multímodo e multifário do princípio de individuação, ou seja, em Peripatético, o parcial da matéria, é negado, ultrapassado, abandonado. Em nome de quê?, pergunta o ledor. E retorque o Padre Alfredo: da Mónada que mana da platónica Ideia. Um platonismo, então, temperado e matizado por angélico Marianismo, eis o escopo e a escola do nosso progredir. É que à luz, como vemos, do valor e do primor das bíblicas parábolas, já não há mais divórcio, ou divisão, entre o eu, o tu e o ele; e acima do indivíduo se afirma, na frauta e fraternal, o Cristiano e pois humano humanizar duma pessoa.
Por isso mesmo, concluiremos que ser Padre, ou Psicopompo, é proteger, mais do que tudo e que todos, os cordeiros da Palavra contra os lobos da ignorância. Dessarte, Jâmblico, em «Mistérios do Egipto», nos ensinou, nesta safra, que o génio de Mercúrio é comum, ou comunitário, a todos os Sacerdotes, veramente sábios. Daí nasce, assim o cremos, a comunicação. A autêntica existência seguindo o Heidegger. Segundo Fílon, o Judeu, o Logos é medianeiro, ou mediador, entre Deus e os homens; pela Palavra é dada, pois, ao homem, a possibilidade redentora de cooperar, com Deus, no projecto Criacionista.
Por limitações, na lida, de espaço, terminaremos ora. O livre-pensador, que estas laudas assina, nanja e nunca o teria feito, como o fez, se na Lira deste Poeta não se encontrassem, bem vincadas, duas normas, portanto, emblemáticas e áticas: a aceitação, quer da Liberdade, quer, assim o cremos, do espírito de crítica. O seu diálogo e fecunda convivência com João França, que era acrata e ateu, mas, acima de tudo, com Octávio de Marialva, hermético e oculto à guisa dos Magos, assim o deixam, aos olhos da posteridade, como um almo e um homem que nada odeia, nada persegue, mas tudo nos doa, tudo perdoa, tudo compreende pois entende alfim a Cristo. Por caminhos e por linhas complementares, e subliminares, se cumpriu o Marialva no hermetismo e no segredo, e o nosso Padre Alfredo, na hermenêutica e sagrado; a um coube, enfim, o Ocultismo, o outro missionou, na messe, o Misticismo. Como a tese e a antítese de um sinfónico labor, já deve inferir, o nosso leitor, que aqui se trata, respectivamente, dos lados intelectual e cordial do conhecimento, da via varonil como oposta à Mariana.
Oh abstrusa, densa, inexplicável Metafísica!, redargue o legente. Mas é preciso, pra ser génio, digerir a diegese; o Mago rouba, com uma letra, o que revela com a outra – e o zelar é qual velar, e o revelar, a Verdade, é parente e é presente no desvelamento. Mas ora sus, bonda. Ora de mais dissemos nós, e siderais e liliais, que nós entremos, com Padre Alfredo, no Santo dos Santos (3). No fim da noite, virá o Sol; que Ele ilumine, alfim, o obscuro, a cerração, e que Ele dirima, com pão, esta nossa escuridade. Professemos, no são, por o Paracleto e o dilecto; no coração do arco-íris, aguardemos, na frol, pela maia-madrugada. Que raramente, numa vela, se escrevem cousas boas. «Mas ainda mais raramente», diria João Belo, «se escrevem coisas novas.»
 
NOTAS
(1) Se a Festa do Pentecostes, ou Festa das Semanas, é celebrada 50 dias depois da Páscoa, ou dos Ázimos a Festa, assim comemora, a Igreja Católica, a ceifa do trigo e a Aliança do Sinai entre Deus e o Seu povo. Dessarte e adrede, o carácter universalista da Religião cristã é figurado, nos «Actos dos Apóstolos», por a glossolalia ou espiritualismo da cerimónia pentecostal: é que ligam, as línguas de Fogo, o parcial ao ecuménico, indepedentemente das normas, usuais, do nosso conhecer, como sejam o espaço, o tempo e o princípio, curial, da causalidade. Mas que fique, aqui, inscrito e descrito: as Igrejas Protestantes, a partir de Lutero, se explanam e explicam por diferentes traduções da Bíblia Sagrada, ou como quem aduz, deveras e na verve: pra cultos diferentes, diferentes culturas – mas o Cristo é unidade e universalidade. E é preciso o afirmar, e o firmar outrossim: na descida do Espírito Santo sobre os Discípulos, o Domingo de Pentecostes, nos «Actos dos Apóstolos», marca o início, ou indício, da Igreja Católica. E crucial e Cristiana, e Apostólica e Romana. 
 
(2) E pensava num Arquétipo, e pensava num protótipo, o nosso Padre-Mestre: se a Literatura, em sua forma primitiva, é expressão da bacanal, em sua forma alteada, ou sublimada, que é a de Avicena, Claudel, e Pascal ou Plotino, é uma expressão, ao invés, do sagrado e do segredo, ou melhor, do sobrenatural. Quer num caso, quer no outro, e alargando, lautamente, as portas da percepção, se inspira, o rapsodo, em tópicos e tropos do seu inconsciente: e tal Obra é o sonho, é o «rêve éveillé», será, de acordo com Pessoa, a voz da nossa terra ansiando pelo mar. Mas, como quer que seja, o sonho é, deveras, o discurso do Outro, e se alimenta, na «alêtheia», ou no letreiro, da alegria fantástica das alegorias.  
 
(3) Referimo-nos, Templário, referimo-nos à festa, referimo-nos, aqui, ao Santuário de Fátima, bem perto o centenário das Aparições. Cantemos, rezemos, louvemos, com Maria, o Verbo Encarnado. Numa caminha de palhas, ou melhor, no caminho, e altar, da universalidade.
 
Armação de Pêra, Algarve, 14/ 05/ 2013
MISERANDO ATQUE ELIGENDO
 
PAULO JORGE BRITO E ABREU
 

 

© Maria Estela Guedes
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