REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


nova série | número 40 | agosto-setembro | 2013

 
 

 

 

 

 

 

 

 

NUNO REBOCHO 

Os meus "encontros" com Amílcar Cabral

 

 

Nuno Rebocho (1945, Portugal). Escritor e jornalista.     

 

EDITOR | TRIPLOV

 
ISSN 2182-147X  
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Dir. Maria Estela Guedes  
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Quando, em 1962, chegado a Portugal, pela primeira vez entrei na Casa dos Estudantes do Império, Amilcar era memória dos jovens estudantes que, vindos de África, sonhavam liberdades e independências. Já então a luta lavrava nas colónias portuguesas. Aluno de Cansado Gonçalves, em Lourenço Marques, eu fora preparado para em Lisboa (onde vinha prosseguir estudos) encontrar o lugar próprio, a CEI, onde viver o profundo anseio por um Mundo Diferente. E foi Alexandre Alhinho de Oliveira, meu colega do liceu em Moçambique e então amigo-quase irmão, quem subscreveu o meu ingresso naquela Casa ao qual o nome de Amílcar Cabral estava estreitamente ligado. Na Casa dos Estudantes do Império tive o meu “batismo de fogo” – o Baile dos Centuriões. Eu estava no grupo que, naquela noite de 63, a defendeu da tentativa de assalto por um bando da Legião. Nessa noite, “encontrei-me” com Cabral, com a sua mensagem: lutar, lutar, lutar pela liberdade dos africanos.

Foi seis anos mais tarde que, na Cadeia do Forte de Peniche, com Alexandre Alhinho, ouvi da boca de Francisco Martins Rodrigues outras memórias – ele fora camarada de militâncias, no MUD, de um poeta-combatente guineense e seu companheiro nas masmorras do Aljube, Vasco Cabral. E, por via do poeta, de novo Amílcar entrava no meu imaginário. Era a Guiné, era Cabo Verde, a luta de libertação que se travava em África que mereciam a nossa solidariedade indefetível e Amílcar Cabral estava nos nossos corações.

Em Janeiro de 1973, eu estava em liberdade vigiada em Lisboa. Saíra de Peniche há dois meses e era-me interdito ausentar desta capital. No entanto, persistia ativo na propaganda contra a guerra colonial e no combate ao regime de Salazar-Caetano. A notícia do assassinato de Amílcar foi um choque. Reforçou a minha revolta e a vontade de não cruzar os braços em defesa da causa dos meus irmãos africanos, que era, ao fim e ao cabo, a mesma causa dos portugueses que ambicionavam liberdade. Assim me “reencontrei” com Cabral.

Há sete anos, inaugurando uma relação estreita com Cabo Verde, descobri em Assomada o busto de Amílcar. E na cidade da Praia, na livraria da Casa da Cultura, achei exemplares de uma revista, “Raízes”, com poemas de Cabral. Revistas que trouxe para Lisboa, onde aos microfones da RDP os li. Depois do combatente e do homem de pensamento, cuja obra conhecia das edições Maspero, era o poeta que agora também me acompanhava e me alimentava a paixão, tardia embora, mas assumida, por duas palavras: Cabo Verde - dez ilhas, um povo, uma Dignidade. Uma História. E uma Cultura.

Nuno Rebocho 

   
 
 

© Maria Estela Guedes
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