Memoria africana
Memoria de los fuertes brazos de mi nana
corriendo en el aeropuerto de los
afectos.
Dónde estás, Maimuna? Te veo todavía
inundando mis juegos con la pureza del
agua
Agua que limpiaba
agua que se llevaba la tristeza de mis
ojos
y nosotras dos, el tiempo por completo
ahí
chapoteando
Fue tiempo de gerundios. lento y tierno.
sin las prisas actuales
Cantábamos fuera de la casa como hijas
de un ritmo vibrante de tambores
Todavía los oigo. la piel se eriza –
fría, tu ausencia
Maimuna, vivirás para siempre mientras
la música nos lleve
por sanzalas, con los pies descalzos –
me subes a tu regazo
El sol es tu sonrisa, la luz.
Como diosa de senos plenos
amamantas mi sed de claridad
Temo no encontrarte nunca más
¿Reconocerías a la persona que hoy hay
en mí?
¿Mirarías dentro de mis cielos y verías
el brillo de tu presencia en la nostalgia
[plúmbea que dejaste?
Maimuna, estos días de peregrinar la vida nos vuelve breves
Y la poesia vagabundos
Eres mi memoria más lejana, memoria africana
reflejada por completo en el mar.
Versão em espanhol de Manuel Calleja.
In Antologia de poesia hipano-marroquina
Sem
garantia
Sem
garantia está qualquer amor
Não se
consertam músculos cardíacos nem objectos interiores danificados
A força
de muito padecer por causa de melancolia, ansiedade, tristeza
não
valida qualquer garantia. que se desenganem
os
códigos de barras em piercing nos seios ou nos bíceps
Que se
desenganem as plumas dos pavões e as cores exuberantes dos machos na sua
corte às fêmeas.
Aviso:
não há garantia!
Fora de
prazo fica quando
a
ardência deixa de expandir a loucura que não há, aparentemente,
em
nenhum olhar
Fora de
prazo fica quando
há
cansaço acre em vez de doçura
imundos
desejos, em vez de sede
Sem
garantia está o amor que fica
sentado
num banco de jardim
num
aeroporto, ou numa estação de comboios
a ver os
que se vão
Às vezes
é tudo uma questão de dizer adeus ou saudade
e pensar
que há outras palavras que também
não nos
dão, de qualquer forma, nenhum certificado
Hoje, o
aviso na porta. será melhor irmos com Régio.
(inédito, 2013)
Fumo
Esquece-te de mim
amor que
eu quero
só na
neblina
só no
desfeito
silêncio
da sílaba
Esquece-te de mim
perde de
vista
o meu
fantasma
na
estação Desejo
Esquece-te das mãos, dos gestos
do rosto
que nos beijos
te levou
sem nada
Esquece-te do nome, da figura
Esquece-te de quem fui
não
sendo em ti
mais do
que pó
Assim,
na carruagem, a combustão
golpeará
o fim do trajecto
e no céu
o fumo
intenso.
(inédito, 2013)
Vai,
rapaz!
(ao meu
filho João André)
Uma
escada
à altura
do teu tamanho
para
alcançares a falésia
Desapareceram fumo e abelhas do teu medo. tens uma baía no rosto
Vai,
rapaz, saúda a corda
Pé ante
pé, descalço
sob a
ameaça das pedras
Os dedos
cortados, os erros naturais. talvez queiras conhecer
cada
degrau com carapaça de escaravelho
No fim o
suco da subida
adoça o
som agreste da cascata
Aproxime-se o fogo. Fumiguem-se insectos. a água cai na tua cabeça
livre
de incêndios
Vai,
rapaz!
Recolhe-se o mel
com
muitas picadas.
(inédito,
2013)
Espera
A espera é um estado
messiânico. não espero
encobertos sem volta
já que os teus olhos
não se esgotam nas estações
nem os meus ficam para sempre fechados
a receber luz. já não me importa
o silêncio ou o ruído
Quero ficar entre as asas
daquele pássaro que me conhece do quintal
Ele é a música que raramente escutamos
quando nos apercebemos do diamante que é o dia vulgar
sem grandes acontecimentos, sem grandes inquietações
Quando chove, abrigo-me nos seus olhos sobreviventes
e escrevo.
(inédito, 2013)
Dia da
Poesia
À primeira hora já muitos séculos passaram
e tu continuas a curva, até onde
desconheço:
cavalo em fogo, ave sangrando, na terra,
no espaço
entre os dedos, entre as esferas, entre
as margens
que nunca habito por inteiro
Vou contigo num errar contínuo.
principio da raiz
Revolvem, sem sentido, os versos
que não dizem
Depois a aurora esclarece:
o acontecimento
sem palavras, nem
diseurs
Inaugura-se o dia como se houvesse um
fenómeno
a romper mesmo
sem cordas vocais.
(inédito, 2013)
Válvula
Era como
se tivesse mergulhado
numa
calda indolor:
A terra
sumia-se na lonjura. os átomos, em reunião
cancelavam as vozes e toda a magnitude explodia
O grito
aéreo ecoava na tontura sem aflição:
- Já não
tenho oxigénio
Como
havia de accionar a válvula
libertária?
Ainda
não seria a minha Hora. teria de voltar a estremecer com ruídos
Maldita
ensurdecedora campainha que só eu não ouvia. entretanto, o sangue
fora
estancado.
As
mulheres em volta, parturientes, cobriam-me de beijos.
(inédito, 2013)
Ponto de
fuga
Às vezes
perdes-te de mim
evitas o
que transborda. invades-me
com
jardins que respirámos. afagas-me o sorriso, ó ternura
que me
queres a mais ausente
Uma
tentativa: deixar a razão
O meu
rosto - vive-lo na tua gota de gelo:
Nervuras
visitações na estação brilhante
Rasga
tudo. mente. desenterra a ferida soterrada no chão
de onde
me rompe a fragilidade
que
também espera
Dormem
as raízes. viajo
à
velocidade do amor
Na
carruagem, a melodia de um lugar vazio: a tua mão
na
minha.
(inédito, 2013)
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