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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
nova série | número 39 | junho-julho | 2013
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BRUNO PRADO LOPES
Travessia
(Inédito) |
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Bruno
Prado Lopes (Brasil,
1981).
Autor do livro de poesia Fraturas (Selo Orpheu – Ed. Multifoco -
2010), com participação em antologias, como: Poesia Sempre
(Biblioteca Nacional – 2010), O Conto Brasileiro Hoje (RG Editores –
2005). Participou, como poeta convidado, da exposição “Mesmo nos
momentos mais silenciosos” do Fotógrafo Gabriel Felsberg (São Paulo,
MuBE, 2012), também publicou em periódicos e revistas eletrônicas,
no Brasil e em Portugal.
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EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Contacto: revista@triplov.com |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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Teu silêncio pungente
a desenraizar à superfície alba —
um movimento inverso
contra o emaranhado de nós
a contratura do tempo
frente ao longínquo;
o velame de tua voz
ardil, doce; diminuta —
“nossa hibridez arbórea”
os escassilhos de ti
a recobrir-me a relva da face;
o cruzamento lírico na linguagem —
teu cerne
embrutecido,
a morfologia-fêmea
em sua brutal intensidade —
um intento irremediável
a desflorar a derme:
uma senda
farta em aniquilações
*
Entre o transpassar da vida
e o vareio da viagem
há de pressentir algum rumor
na infusão da luz à superfície vaga —
há de seguir a trilha alva,
e furtar nomes às horas
e nomear aos dias —
atravessar a senda incerta
sendo breve, brusca
ou retilínea
a sina como pronúncia fugidia:
uma parolagem estranha;
desconhecida —
que seja longínquo o caminho
em seu decurso;
do toque leve dos dedos
ao alheamento da visão,
pois há de surgir diverso
à passagem da travessia:
um lugar-nenhum no ocaso
onde se deita um coração
*
Dobrar a noite limítrofe
na constelação sestra da mão —
deixe calar a fala:
«non ti muovere,
lascia parlare il vento»
o fustigar de um silêncio
lívido; fugidio —
deixe rebentar entre os dedos
a rosa rubra
e escorrer o sumo bruto
pelos sulcos da mão
*
A crença
tece em astúcia um átrio,
abismo entre seus passos —
meio-fio de linhas gris,
a concretude o dito pelo fato:
asfáltico desvio —
a palavra: acredite
ergue nações; em fé e fúria, arranha-céus
mas amiúde esgarça
a graça rara da fala —
abstrai: escolha inexiste
não insista,
o feito é inerente
não há arbítrio, só corrente
aja: engaje
a brevidade existe
viver é,
senão viragem
*
A escrita escorre dolorosa —
escoa dentre a derme
e adensa, e pulsa, e fere;
ascende pungente, libidinosa —
um sopro,
a senda sigilosa
a transfiguração da palavra
à clareação de lis no céu;
o poema surde delicado
até seu florescer atingir a fala
e calar-se, em silêncio
como o próprio eu
*
Mansidão,
o silêncio alvo a desmembrar
a cruz dos descaminhos —
vis vidrilhos
ao preluzir do sobrecéu
um corte acobreado
no desalinho das nuvens
sob o sol —
arvora assim a vida
em dissonante aviltamento;
a sobrepor o tempo
a lentos passos no degredo —
um dessaber imenso
que calcina cerne adentro
à desmesura própria —
um dissabor etéreo,
súbito; passadiço
a ruir a si e seu inverso:
contra a verde imensidão
*
Em toda travessia
há um momento de fuga — único;
à ponta dos lábios: na linguagem
o trânsito emudecido
a silenciar, em suspiro último
algo próximo
à palavra
adeus
*
A transpor a linha do poema
límpida, blanca; curvilínea
em sua aspereza rude:
sorrateira —
ama-se, assim:
entrelaçando-se às tramas
as ramas da mesma teia —
évoque dans l'esprit:
a macieira em queda no poema,
fruto rubro: absoluta fêmea
na ponta do lápis, o dilema —
vermelho que ruma e cessa
ou verdeja, apenas
no pontiagudo da fala
à ponta do poema
*
Ouvi-la arrebatada —
o sopro clarividente de sua quietude,
um emblema a inspirar a vertigem irrefreável,
o ritmo desencontrado a perturbar a visagem,
a paisagem tresloucada;
assim encontro a cidade,
no seu rigor mais absoluto:
as gotas de oxigênio, a viridência
a penetrar a frieza da face;
a fenda mineral recoberta pelo musgo,
a ruptura do poema fotossensível
a irromper sobre a palavra —
o tempo crispando a tarde;
a fratura mesma desta fala
a fibrilar o céu de gris —
assim trespassa a loucura sob a carne:
furiosa e impiedosamente cheia da beleza
carrega-se assim o minério entre os dentes
defronte um jardim de granito
assombrosamente extasiado |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
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