REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


nova série | número 34 | novembro | 2012

 
 

 

 

 




PAULO AZEVEDO CHAVES

Os invasores


 
 

EDITOR | TRIPLOV

 
ISSN 2182-147X  
Contacto: revista@triplov.com  
Dir. Maria Estela Guedes  
Página Principal  
Índice de Autores  
Série Anterior  
SÍTIOS ALIADOS  
TriploII - Blog do TriploV  
Apenas Livros Editora  
O Bule  
Jornal de Poesia  
Domador de Sonhos  
Agulha - Revista de Cultura  
Arte - Livros Editora  

Revista InComunidade (Porto)

 
 
 
   Ao empregado amigo Rodrigo Nascimento
 
Eles chegaram às primeiras horas do dia. Pareciam inocentes auxiliares realizando os serviços domésticos. O telefone estava mudo. A internet não funcionava. As casas vizinhas estavam à venda, desocupadas. Quando os dois saíram para fazer o serviço de jardinagem, fechei rapidamente todas as portas a chave. Mas findas suas tarefas lá fora, ei-los de novo no interior do imóvel. Ambos sérios e mudos,  uma palidez cadavérica nas faces. Um deles, baixinho e com início de calvície, vestia uma camiseta com estampas vermelhas, parecendo sangue. A bermuda, larga e cobrindo os joelhos, tinha idêntico padrão de estamparia. O outro, alto e magro, parecendo um coveiro padrão de cemitério, usava uma camisa branca e suja de terra,  as mangas compridas arregaçadas até os cotovelos. Eles olhavam fixo para mim, sem nenhuma emoção no olhar. Senti um súbito cansaço e fui deitar-me em meu quarto. As cortinas estavam cerradas, mas ainda não escurecera por completo. Deitei-me na cama  e cruzei as mãos sobre o peito. Os invasores estavam ali, um de cada lado do leito bem posto, olhando-me com seus olhares frios, distantes. O baixinho se parecia com meu antigo empregado, executado com seis tiros numa viela suburbana do Recife. “Eu amo você, Rodrigo” -- pensei. Não estava triste, nem alegre, Apenas muito, muito cansado. O sol finalmente se pôs e em meu quarto tudo eram trevas. Mas eu pressinto que os invasores continuam ali, parados, um de cada lado da velha cama antiga de jacarandá . Estou vivo ou estou morto? Moribundo, talvez? Realmente não sei e acho que nunca saberei.


Jaboatão dos Guararapes, 28 de setembro de 2012
 

  PAULO AZEVEDO CHAVES (BRASIL)
Advogado, jornalista e poeta, assinou no Diário de Pernambuco, nos anos 70/80, a coluna cultural Poliedro, e de meados dos anos 80 até 1993, a coluna Artes e Artistas, especializada em artes plásticas. Livros publicados: Versos Escolhidos,Ed. Pirata,1982, traduções);Trinta Poemas e Dez Desenhos de Amor Viril (Pool Editorial Ltda,1984, traduções); Nu Cotidiano (Grupo X,1988, poesias); Os Ritos da  Perversão (Ed. Comunicarte, poesias, 1991); Nus (Ed. Comunicarte, 1991, poesias). Em 2003, participou de uma coletânea de artigos publicados na seção Opinião do Jornal do Commercio, com o título de Escritas Atemporais (Ed. Bagaço). Em 2011, lançou um livro de prosa, poesias e traduções de poemas com o título de Réquiem para Rodrigo N (Ed.do Autor). Poemas Homoeróticos Escolhidos (em parceria com Raimundo de Moraes) e Os Ritos da Perversão e Outros Poemas foram lançados, em 2012, em edição digital, no site ISSUU.Todos os livros de Paulo Azevedo Chaves tiveram seus projetos gráficos assinados pelo designer pernambucano Roberto Portella.
http://issuu.com/paulo_azevedo_chaves/docs/a_sombra_da_casa_azul
 

 

© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
PORTUGAL