Outra versão
As nossas árvores são faias, mas
as pessoas
confundem-na com bétulas;
pensam em nós como personagens
de um romance Russo, Kitty e
Levin
a viverem satisfeitos no campo.
Os nossos amigos da cidade
observam os pássaros
e os coelhos a alimentarem-se
no topo da neve branca e alta.
(Temos invernos Russos em
Illinois,
mas guizos não, gambás em vez de
lobos,
criados de confiança que façam o
nosso trabalho também não.)
Como numa peça Russa, um velho
vive connosco, é o meu pai;
ele deixa a vida escapar tão
lentamente,
ano após ano, que a dor
está cravada dentro de mim, maçã
envenenada
que não sobe nem desce.
Mas como as três irmãs,
raramente
falamos
do que nos mantém acordados à noite;
como elas, queixamo-nos
de coisas
que não valem nada e falamos
do que nos dá prazer e do
futuro:
dizemos
que os salgueiros
despertaram cedo este ano, um
verde enevoado.
*
Canção nocturna
Entre rochas, sou a que está
solta,
entre setas, sou o coração,
entre filhas, sou a solitária,
entre filhos, aquele que morre
jovem.
*
Entre respostas, sou a pergunta,
entre amantes, sou a espada,
entre cicatrizes,
sou a ferida recente,
entre confetes, a bandeira
negra.
*
Entre sapatos, sou o que tem a
pedra,
entre dias, aquele que nunca
vem,
entre os ossos encontrados na
praia
o que canta era meu.
*
O concerto
À memória de Dimitri
Mitropoulos
O harpista acredita que há
música
nas espinhas de peixe
*
O tocador de trompa acredita
em caracóis de ouro enormes
*
O piano não acredita em nada
e ri-se de orelha a orelha
*
As cordas coçam as barrigas
abertamente, com prazer
*
Flautas e oboés queixam-se
em dialectos da mesma língua
*
Baquetas acordam
uma pele
do sono de outra vida
*
porque o corvo sobrenatural
bate as asas no pódio
*
e a morte não é desculpa
*
Pequeno poema sobre
cães de caça e lebres
Depois da matança, temos o
banquete.
E perto do fim, quando a dança
abranda
e os novos se esgueiraram para
algures,
os cães de caça, bêbados com o
sangue das lebres,
começam a falar sobre como os
seus pêlos
eram macios, que graciosos os
seus saltos,
que encantadores os olhos
assustados e dóceis.
*
Laranjas de sangue
Em 1936, uma criança
na Alemanha de Hitler,
que sabia eu sobre a Guerra em
Espanha?
A Andaluzia era um tango
num gramofone mecânico,
Franco uma face de herói no
jornal.
Ninguém me falou num poeta
que poderia ter-me levado a aprender espanhol
esvaindo-se em sangue numa árida
colina.
Tudo o que conhecia de Espanha
eram aquelas gulodices
importadas
em que esbanjávamos dinheiro no
Natal.
Lembro-me de separar os gomos,
de os alinhar, chupando cada um
lentamente, de forma a que a
doçura vermelha
durasse o mais possível –
enquanto lia um poema
de um poeta Alemão morto
há muito
no qual
os bosques estavam em segurança
sob o olhar branco da lua.
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