A Sociedade atual vai desenvolvendo micro utopias nos espaços
vazios deixados pelas verdadeiras Utopias.
Essas micro utopias são dadas às pessoas como a fonte da
autorrealização, como algo que devem buscar para se sentirem
individualmente realizadas
(um corpo esbelto, por exemplo, a juventude eterna, um bom
emprego, fazendo-as crer que são assim reconhecidas na Sociedade e
felizes para sempre.)
Mas esse é o não - lugar, pois traduz-se na raiz do que as faz
sofrer.
Podemos considerá-las micro tiranias, tiranias que pulverizam
os seres humanos como indivíduos pertencentes a uma determinada
Sociedade.
O conceito de Utopia (u-topos, nenhum lugar, ou o lugar que
não existe, é portanto um mundo idealizado) aparece associado a uma
sociedade ideal.
Esta sociedade é fundada em leis justas e em instituições
comprometidas com o bem-estar da coletividade.
Atualmente assume um sentido comum de projeto irrealizável,
todavia impraticável. Mas … “ Se as coisas são inatingíveis…ora!/ Não é
motivo para não querê-las…/ Que tristes os caminhos, se não fora / A
presença distante das estrelas!” –
Mário Quintana
Para recuperarmos um pouco o seu sentido original recorde-se o
que Louis Claude de Saint–Martin
compôs, o que
acabaria por ser o lema da Revolução Francesa : .
“ A felicidade da
humanidade consiste na união de todos os membros de sua família. Essa
união só se pode dar através da fraternidade, que cria a igualdade pelo
equilíbrio estável dos direitos e dos deveres, assegurando ao mesmo
tempo a liberdade, a segurança e a preservação da coletividade. “
Também Platão, num dos seus discursos, concluía:
“ Quando os governantes abusam do
poder; quando os pais se habituam a deixar os filhos sem disciplina;
quando os mestres tremem diante dos alunos e preferem bajulá-los; quando
os jovens desprezam as leis e a moral porque não reconhecem a autoridade
de nenhuma coisa ou pessoa, então surge em toda a beleza e em toda a
juventude, o nascimento da tirania”.
Tudo para dizer que podemos ir pelo caminho da Utopia ou
escolher o caminho da tirania.
Os Rosacruzes sempre se preocuparam com a evolução da
Humanidade.
Sempre beberam nas grandes Luzes do Conhecimento e da
Sabedoria.
Sempre entenderam que a Imaginação é uma Potência Criadora.
Einstein
dizia que “Não basta ao homem aprender a especializar-se.
Porque assim se tornará numa máquina utilizável e não uma
personalidade.”
Os Rosacruzes entendem que a Imaginação é tão ou mais
importante que o Conhecimento.
É através dela que se desenham as grandes Utopias, como
centrais nucleares para grandes transformações e realizações, através
dos tempos, nas Sociedades.
Vejamos:
Os séculos XVI e XVII caraterizaram-se pelo aparecimento de
grandes utopias, do sonho de grandes Pensadores com o objetivo de
realizar uma reforma da humanidade, tentando realizar na Terra a cidade
ideal. A cidade que os místicos constroem no próprio coração, naquele “
lugar sagrado” onde todas as diferenças podem ser diluídas com o
solvente alquímico universal do amor.
“É no Manifesto Positio
Fraternitatis Rosae Crucis para o terceiro Milénio, que se desenha a
Utopia Rosacruz, ou seja um mundo idealizado a ser cumprido no Futuro,
no sentido Platónico, projetando a escolha da mais bela construção para
a Humanidade.”
Esta obra está na continuidade de Manifestos Rosacruzes publicados no século
XVII em que a Ordem Rosacruz torna pública a sua posição diante do
estado do mundo, e constitui um elo de ligação entre os rosacruzes do
passado, do presente e do futuro.
Em 1623, os Rosacruzes afixavam nos muros de Paris
cartazes, ao mesmo tempo misteriosos e intrigantes.
“Nós, deputados do Colégio
principal da Rosa+Cruz, demoramo-nos visível e invisivelmente nesta
cidade pela graça do Altíssimo, para o Qual se volta o coração dos
Justos. Mostramos e ensinamos a falar sem livros nem sinais, a falar
todas as espécies de línguas dos países em que desejamos estar para
tirar os homens, nossos semelhantes, de erro de morte.”
Alguns anos antes, os Rosacruzes já se haviam dado
a conhecer publicando três Manifestos deste então célebres:
Fama Fraternitatis, Confessio
Fraternitatis e O Casamento
Alquímico de Christian Rosenkreutz, que apareceram respectivamente
em 1614, 1615 e 1616.
Fama Fraternitatis é dirigido às autoridades políticas e religiosas,
bem como aos cientistas da época. Ao mesmo tempo em que fazia um balanço
negativo da situação geral na Europa, revelava a existência da Ordem da
Rosa+Cruz através da história alegórica de Christian Rosenkreutz
(1378-1484).
Esse Manifesto já fazia apelo a uma Reforma
Universal.
Confessio Fraternitatis completava o primeiro Manifesto, por um lado
insistindo na necessidade do ser humano e a sociedade de se regenerarem
e, por outro lado, indicando que a Fraternidade dos Rosacruzes possuía
uma ciência filosófica que permitia realizar essa Regeneração.
O Casamento Alquímico de Christian Rosenkreutz,
num estilo bastante diferente dos dois primeiros Manifestos, relata uma
viagem iniciática que representa a busca da Iluminação.
(3)
Essa viagem de sete dias desenrola-se em grande
parte num misterioso castelo onde deviam ser celebradas as bodas de um
rei e de uma rainha.
Em termos simbólicos, o Casamento Alquímico
descreve a jornada espiritual que leva todo Iniciado a realizar a união
entre sua alma (a esposa) e Deus (o esposo).(1)
Como sublinharam alguns historiadores, pensadores e
filósofos contemporâneos, a publicação desses três Manifestos não foi
nem insignificante nem inoportuna.
Ocorreu numa
época em que a Europa atravessava uma crise existencial muito
importante: estava dividida no plano político e dilacerava-se em
conflitos de interesses económicos; as condições de vida eram miseráveis
para a maioria das pessoas; a sociedade da época estava em plena
mutação, mas faltavam-lhe referências para evoluir no sentido do
interesse geral.
Perto de quatro séculos após a publicação dos três primeiros
Manifestos, constatamos que o mundo inteiro, mais estritamente a Europa,
enfrenta uma crise existencial sem precedentes, em todos os campos de
sua atividade: política, económica, científica, tecnológica, religiosa,
moral, artística, etc. Por outro lado, o nosso planeta, isto é, o nosso
campo de vida e evolução, está gravemente ameaçado sob o ponto de vista
ecológico.
Seguramente, a Humanidade atual não está bem.
“Por isso, fiéis à nossa Tradição e ao nosso Ideal, nós,
Rosacruzes dos tempos atuais, julgamos ser útil darmos testemunho disso
através deste Manifesto Positio
Fraternitatis Rosae Crucis.”
Positio Fraternitatis Rosae Crucis não é um ensaio
escatológico. De maneira nenhuma é apocalíptico. O seu objetivo é
transmitir uma posição quanto ao estado do mundo atual e pôr em
evidência o que parece preocupante para o seu futuro.
Se todos os seres humanos se esforçarem em agir em
conformidade com isso, o mundo só poderá ser melhor.
Cremos que o Amor é o valor supremo de toda a Humanidade.
As relações humanas são fundadas no amor, na amizade e
na fraternidade, de modo que o mundo inteiro vive em paz e harmonia.
“ O homem é
o grande alquimista que, inconsciente ou conscientemente,
vai construindo a sua vida no planeta.(1)
Não esqueçamos porém:
A tolerância é
inseparável do amor. Mas a
tolerância não se liga só ao amor. (2)
Ela está dependente da
informação. Só quem se conhece a si mesmo, e tem uma visão moderna da
natureza humana, pode ser tolerante.
Quando não se reconhece a
relatividade das nossas ideias, quando nos julgamos superiores aos
outros, ou com uma superior cultura, ou com um Deus, ou com predicados
superiores, tornamo-nos intolerantes, e a intolerância torna-se causa de
conflitos e guerras.
É o que proclamam
filósofos como Séneca ou Voltaire.
“ A
história mostra bem que não há nada tão perigoso, tão assassino, como as
ideologias, os fanatismos, as certezas de ter razão.
Todos os grandes crimes da história são consequência de algum fanatismo.
Todos os grandes massacres foram perpetrados por virtude, em nome do
nacionalismo legítimo, da religião verdadeira, da ideologia justa.”
F.
Jacob, 1920, biólogo francês, The Statue Within
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