C. RONALD
Retrato de família
Pais e filhos agrupam-se para a pose. Tamanho
é o sentido da permanência que o que vem de trás
perde-se na rapidez do flash. Ali, o sorriso
não faz barulho nos olhos, o detalhe suficiente
do que vivemos dá nome igual ao perdido.
Nenhum destino aparece inteiro. O mundo força
a estátua sobre aquilo que perece. Flores e regatos
são anos de alegria própria e a história da casa aberta
fixa o termo do reconhecimento por tudo que já
passou. Eis a foto. A soma dos anónimos
para alguém distante. Um cachorro sem consciência
aos pés dessa criança é a pura imagem da afeição.
Ela houve. Continua ainda e pode ser mais que o homem.
*
Morrer imitando o teu jeito de morrer
é possível se no meu corpo trago o teu encanto
Horas oblíquas do fim que surge da sombra
familiar abaixo do anjo prematuro e veemente
Tudo pode voltar e dar nome ao que senti sempre
A solidão virá modificada e a ausência não será
a mesma nem as coisas dadas por engano
Morrer no teu silêncio amando essa conjunção
que não havia ainda dentro ou fora do tempo
A terra tornou-se outra vez o sentido diferente
do teu corpo submisso ao meu tormento
Que coragem para resistir e emboscar a existência
Afortunada representação do lado novo e antigo
dos sentidos com a inocência feita por si mesma
Mas haja memória na galeria humana dos descrentes
que tudo oferece de mal ou bem no pior silêncio.
C. Ronald,
in “Ocasional Glup”
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