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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
nova série | número 31 | setembro | 2012
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A.M.GALOPIM DE CARVALHO
Niels Steensen
(1638 - 1696)
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EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Contacto: revista@triplov.com |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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Nicolau Steno, de seu nome latino, anatomista
dinamarquês, graduado pela Universidade de
Copenhaga, é considerado
um pioneiro em vários domínios das ciências da Terra. Viajou pela
Europa; uma actividade
constante ao longo da sua vida, o que lhe permitiu desenvolver esta sua
vocação.
Teve papel importante nas áreas da paleontologia e da estratigrafia, bem
como nas da mineralogia e cristalografia, muito antes destas matérias se
terem afirmado como disciplinas científicas. No seu tempo eram muitos os
que não aceitavam os objectos a que hoje chamamos fósseis
como sendo restos de amimais ou plantas do passado, uma vez que a
maioria não tinha representação em seres do presente.
Plínio, o Velho, e outros
autores antigos, tinham sugerido que os ditos objectos caíam do céu ou
da
Lua. Outros defendiam que
eles cresciam naturalmente nas rochas. Não estando ainda preparados para
aceitar a vida anterior à criação do Homem e a evolução, os naturalistas
do século XVII preferiam encarar estes achados como lapides sui
generis (pedras únicas no seu género), inexplicavelmente geradas no
seio das rochas e nunca restos de animais ou plantas.
Ao contrário desta visão generalizada, que não contradizia os textos
bíblicos, Steno já verificara que certos fósseis (“petrificados”, como
então se dizia) eram semelhantes entre si, quaisquer que fossem as
rochas em que estivessem embutidos, e que, por outro lado, tinham o
mesmo aspecto das partes dos animais a que se assemelhavam. Ao observar
os dentes de um tubarão actual, Steno verificou que estes eram muito
semelhantes a certos objectos encontrados em rochas sedimentares na Ilha
de Malta, então chamados glossopetrae (línguas petrificadas), uma
vez que faziam lembrar línguas de serpente transformadas em pedra. Steno
mostrou que os glossopetrae eram mesmo dentes provenientes das
bocas de antigos seláceos, do mesmo tipo dos que observara caídos no
fundo do mar, aí conservados no seio dos sedimentos e depois trazidos à
superfície incluídos na rocha em que esses sedimentos se haviam
transformado.
Assim, afirmou, sem sombra de dúvida, que “os corpos que se
assemelham a plantas e animais encontrados na terra têm a mesma origem
que as plantas e os animais a que se assemelham”. Esta afirmação,
hoje evidente, representou, para a época, uma inovação e um romper com
as ideias do passado. Trata-se do reconhecimento do conceito
paleontológico de fóssil, no que foi apoiado pelo filósofo alemão
Gottfried von Leibniz (1646-1716) e pelo inglês Robert Hook (1635-1703).
Steno dizia ainda: “as conchas e outros restos de antigos seres
vivos, encontrados nas rochas de uma dada região, são despojos de
animais marinhos” e afirmava que “as camadas que os contêm são
necessariamente marinhas”, concluindo que “o mar ocupara essa
região”. Com estas afirmações, e embora sendo respeitador do tempo
bíblico e dos relatos das Sagradas Escrituras, Steno inovou o conceito
de fácies.
Foi na explicação destes problemas que ele descobriu um dos fundamentos
da paleontologia e da geologia sedimentar, em geral, incluindo a
estratigrafia.
Para muitos dos contemporâneos de Steno, era intrigante o mistério de como um animal petrificado e, portanto, sólido,
poderia estar presente dentro de uma rocha também ela sólida. O trabalho
de Steno sobre os dentes de tubarão levou-o a questionar-se sobre este
problema. Os corpos sólidos encontrados dentro de outros sólidos, que
despertaram o interesse deste estudioso, incluíam não apenas os fósseis
(como hoje os definimos), mas também os
cristais, veios, filões,
camadas e encraves igualmente embutidos no interior das diversas rochas.
Tal interesse levou-o a publicar, em Florença, em 1669, “De solidus
intra solidum naturaliter contento dissertationis prodromus”
(Prodromo de uma dissertação sobre sólido contido no sólido). |
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Depois de observar as montanhas da Itália, Steno afirmou que “as
camadas são formadas paralelamente à horizontal, em obediência à
gravidade terrestre”, introduzindo o que ficou conhecido por
Princípio da Horizontalidade Original, concepção que lhe permitiu
explicar que, “quando estas camadas se encontram inclinadas, tal é
devido a deformação posterior”, o que deixa ver que admitia a
existência de forças susceptíveis de deformar porções da crosta
terrestre. |
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Niels Steensen |
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Uma outra afirmação de sua autoria assenta na sobreposição das camadas
sedimentares. Segundo ele, “qualquer camada é mais moderna do que a
que lhe fica por baixo e mais antiga do que a que lhe está por cima”.
Esta afirmação, demasiado evidente nos dias de hoje, representa um passo
significativo no caminho da estratigrafia. Foi considerada o Princípio
Fundamental da Estratigrafia, pois mostrou que as camadas sedimentares
são cada vez mais modernas à medida que se sobe na série. Uma terceira
afirmação de sua autoria, fala da “continuidade
lateral no seio das camadas de rochas sedimentares”.
Estas afirmações constituem hoje verdades mais do que evidentes, mas
foram, na época, grandes passos em frente. Com este autor, as sucessões
de camadas sedimentares passaram a funcionar como “arquivos da natureza”,
como lhes chamou, mais tarde, o naturalista e geólogo alemão Peter Simon
Pallas (1741-1811), e o geólogo francês Faujas de Saint-Fond
(1741-1819), ou como “anais do mundo físico”, no dizer do padre francês
contemporâneo, Giraud Soulavie (1752-1813), fundador da moderna
estratigrafia paleontológica.
Na área de mineralogia e cristalografia, Steno revelou, em 1669, que
os “ângulos diedros, formados pelas faces homólogas dos cristais de
quartzo, são constantes e independentes da forma e da dimensão das
mesmas”. Esta sua revelação, que ainda tem um âmbito restrito, mas
que alguns referem com Lei de Steno, está na base da conhecida Lei da
Constância dos Ângulos, esta, sim, uma verdadeira lei, formulada um
século mais tarde, pelo francês Romé de l'Isle. |
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- Fóssil
- No sentido mais antigo do termo, fóssil era todo o material
que se desenterrava ou extraía de dentro da terra (do latim
fossile, desenterrado), o que abrangia os minerais, as
rochas e os fósseis (no sentido que hoje lhe damos), os achados
pré-históricos e arqueológicos. As expressões carvão-fóssil,
combustível-fóssil, ainda em uso, são reminiscências deste
conceito. Só no século XVIII o termo passou a ser usado no
sentido que hoje tem em paleontologia.
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Está aqui
contida a ideia vinda de trás e assimilada por Steno de que um
sedimento incoeso se transforma em rocha coesa, processo de
litificação a que o alemão Karl von Gümbel, em 1888, deu o nome
de diagénese. Mais de seiscentos anos antes de se falar em
diagénese, Alberto, o Grande (1206-1280), alquimista francês,
afirmava que “o lodo alagadiço e viscoso, trazido pelas
águas, que cimenta a terra e a transforma em pedra dura...”.
Quando, em finais do século XVIII, o escocês James Hutton,
considerado o pai da geologia moderna, afirmava que “as
camadas sedimentares foram antigos sedimentos que se
transformaram em rocha”, está a repetir uma ideia vinda de
tempos antigos.
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Revista InComunidade (Porto) |
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A. M. Galopim de Carvalho (Portugal)
Doutorado em Geologia e professor catedrático
jubilado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. É autor de
vasta bibliografia científica, de divulgação e de ficção. Foi director
do Museu Nacional de História Natural, a partir do qual continua a
desenvolver acções de divulgação, salvaguarda e valorização do
património geológico nacional.
«sopasdepedra.blogspot.com»
«galopim@sapo.pt» |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
PORTUGAL |
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