Eu escrevi o teu nome onde não tinhas mais como saber
sua origem.
O dia
enfiado na goela da miragem e eu esquadrinhando as ruas que passavam por
meu sonho.
A
imensa boca aberta precipitada sobre a paisagem recordada no cartão
postal, como se não houvesse mais nada além da perda daquela memória em
nossas vidas.
Teu
corpo rascunhando dez epílogos possíveis para o sol que há muito havia
sido sacrificado.
Somente
um louco refaria nosso mundo.
Com
tantos deuses empilhados à porta de teu ventre não haveria sequer como
enxotar dali seus fantasmas.
Um
saque de cada vez: metas para o novo milênio corrompido.
Os
metais inflamados, as vantagens refeitas, um cofre lacrado com o segredo
das moléculas e das metáforas, pequenas fábulas ardilosas como o santo
sudário, eu ainda me arrisco a desvendar o paradeiro de teus lábios.
O amor
costumava ser a única catástrofe que, uma vez emborcada, podia
converter-se em outra fonte de milagres.
Quando
os milagres perderam cotação no mercado, o amor não soube mais o que
fazer de si.
Desde
então o homem é um acidente boiando entre parábolas.
Escavando bem talvez se recupere o desenlace de algum abismo.
O olho
mágico encontrado em um antiquário como um catálogo de extravios.
Os
disfarces sempre foram a dieta sagrada de todas as bestas.
As
novas formas atribuídas a uma maçante repetição do mecanismo das quedas.
A
monotonia da exasperação pela velocidade, o fastio ante o deslumbre de
um mundo que expande a letra e sintetiza o espírito.
Os teus
versos foram ficando gastos, a luz coberta de ferrugem, como uma língua
putrefata viciada em suas pequenas impossibilidades.
De
todas as formas de vida que necrosam em uma enfermaria fora de alcance
de qualquer radar, nenhuma é mais patética do que a tua.
O
espelho é uma espécie de estropício da alma danada.
Não
sobra nada por onde ele passa.
Foi
impossível localizar Deus para questionar sua responsabilidade sobre as
avarias manuscritas às pressas nas páginas finais dos livros de bordo.
Há
edições romanceadas de todos os prejuízos.
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