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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
Nova Série | Número 27 | Maio | 2012
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LEOPOLDO MARÍA
PANERO
Sete poemas passados para
português por
LUÍS
COSTA |
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Leopoldo María Panero |
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EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Contacto: revista@triplov.com |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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Eu não sou quem sou.
A lua sangra
e amargo o rio da minha vida converte -se
em peixe.
A vida é uma humidade, talvez um peito
para combatê-la com o mérito de um morto,
com o mérito sem sombra do nada.
O vento brilha intensamente e as esquinas
são moedas para incendiar o poema
na lápide sem sombra do nada.
Morro nesta data
e a partir do último contam-se
os meus dias: Scardanelli *
conta às crianças a lenda da sua morte
que assoma, pálida, através da ponta dos meus dedos
violeta, húmidos, quentes.
A luz morreu.
Golfinhos soluçam
entre as pontas dos meus dedos
violáceos, húmidos, quentes
desajeitados
para escrever,
enquanto a lua
se ri eternamente do poema.
* Nome sob o qual Friedrich
Hölderlin escrevia poemas ( na torre de Tubinga ) depois de ter
enlouquecido. |
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Serenidade |
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Para Martin Heidegger
Só há duas coisas : o meu rosto desfigurado
e a dureza da pedra.
A consciência só se acende
quando o ser é contra ela:
e é assim que todo o conhecimento
e a matriz de toda a figura
é uma ferida,
e só quem chora
é imortal.
E a noite, mãe da sabedoria,
tem a forma inacabável do pranto. |
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Inferno e Paraíso |
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"
ali estará também a vendedora de
castanhas
de
oito pares,
e o fumo dos cêntimos e o vapor nos bolsos "
Leopoldo Panero " Escrito a cada instante "
Pai, mas não são só os mendigos que vão para o
paraíso
vão também aqueles que são mais repugnantes
também estes mendigos do ser que arfam
à porta do manicómio
essas caricaturas humanas, tal como esta
que Alice se imagina no
jardim não
humano das flores
e que queria destruir o universo
porque se há algum monstro, esse é o monstro da
desgraça
e a única injustiça que existe é a injustiça
evidente
e se há alguma moral, essa é a moral do desastre. |
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A Francisco |
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Suave como o perigo atravessaste um dia
Com a tua mão ímpossível a frágil meia-noite
E a tua mão valia a minha vida, e muitas vidas
E os teu lábios quase mudos diziam o que era o
pensamento.
Passei uma noite agarrado a ti como a uma árvore da
vida
Porque eras suave como o perigo,
Como o perigo de viver novamente. |
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A chegada do impostor que fingia ser Leopoldo María Panero |
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Ao amanhecer, quando as mulheres comiam morangos
crus,
alguém bateu à minha porta, dizendo ser e chamar-se
Leopoldo
María Panero. No entanto, a sua falta de
integridade no desempenho
do papel, os seus muitos silêncios, os seus enganos
ao recordar
frases célebres, o ar grave quando o forcei a
recitar Pound,
e finalmente o ar pouco gracioso do seu encanto,
convenceram-me
que se tratava de um impostor. Imediatamente,
mandei vir os soldados:
na madrugada do dia seguinte, quando os homens
comiam peixe
congelado e na presença de todo o regimento,
foram-lhe arrancados
os galões, o fecho-éclair e jogaram fora o seu
batom, para que fosse
fuzilado pouco depois. Assim acabou o homem que
fingia ser
Leopoldo María Panero |
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O homem que matou Leopoldo María Panero
(The man who shot Leopoldo María Panero) |
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O meu querido amigo Javier Barquín sempre acreditou
que
que foi ele quem matou Leopoldo María Panero. Mas
isso não é verdade. Na altura ninguém tinha coragem
para fazê-lo.
O sujeito tinha apavorado toda a cidade. Havia
raptado várias
mulheres e ameaçava torturá-las. Então, naquela
tarde,
decidi-me: fui ao arsenal do Jim e comprei um
revólver
calibre 45. No momento em que Leopoldo María Panero
tentava roubar, uma vez mais, Javier Barquín, eu
disparei
de longe. Como Javier também tinha sacado de uma
arma
de pequeno porte, supôs ter sido ele quem fizera
justiça. Toda
vida acreditou que foi ele quem matou Leopoldo
María
Panero. Mas não foi assim. Eu sou o homem que matou
Leopoldo María Panero. |
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O homem que acreditava ser Leopoldo María Panero |
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Chovia e chovia sobre a casa de De Kooning, famoso
pelos
seus fantasmas. Então, o filho menor de De Kooning
levantou-se, nervoso, da cama. Vestiu um roupão e
foi
até ao quarto de seu pai para lhe dizer que era
Leopoldo María
Panero. Enquanto se demorava a acentuar o desgosto
que
sentia pelo filme de Chavárri " El desencanto ",
não
houve outro remédio a não ser chamarem um
psiquiatra.
Já no manicómio persistia no seu delírio, imaginava
cenas
da infância, ruas de Astorga, badaladas, cacetadas
de meu pai.
Depois de um rápido electrochoque, passou a
acreditar que
era Eduardo Haro, uma ligeira variante da primeira
figura.
A seguir, pôs - se a mancar e a tossir e alegava
ser Vicente
Aleixandre. Entretanto, na casa de De Kooning,
entre o ruído
de correntes, os fantasmas continuam a
multiplicar-se.
Do livro: Leopoldo María Panero
POESIA COMPLETA
( 1970 – 2000 )
Edic. De Túa Blesa |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
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