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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
Nova Série | 2011 | Número 21
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JOSÉ PINTO CASQUILHO
Ecomosaico:
entre paisagem e espaço |
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EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Contacto: revista@triplov.com |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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Resumo |
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Situa-se o conceito de ecomosaico como mediador entre
a extensão perceptiva estruturada numa paisagem e o espaço no sentido
mais geral do termo, seja o espaço geográfico discutido por Milton
Santos como a reunião dos fixos e dos fluxos, ou espaços matemáticos de
representação, acoplados a índices numéricos: objectos semióticos que
enraízam na definição de Peirce, ligados por uma implicação mental ao
objecto que indicam. Esses índices permitem uma incursão pelo tema das
variedades de equilíbrios da paisagem enquanto sistema dinâmico. |
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Abstract |
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In this paper the concept of
ecomosaic is discussed as a mediator between the perceptual frame
structured in a landscape and space referred in a general sense of the
term, could it be the geographic area discussed by Milton Santos as the
union of fixed and flows, or mathematical spaces of representation,
bound to numerical indices: semiotic resources that are rooted in the
definition of Peirce, connected by a mental implication to the object
they point. These indices allow for the study of the equilibrium
manifolds of the landscape perceived as a dynamic system. |
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Résumé |
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Dans ce travail on place le concept
d'éco-mosäique comme médiateur entre la perception de l'extension
structurée dans un paysage et l'espace dans le sens le plus général du
terme, soit dans l'espace géographique discuté par Milton Santos comme
la réunion des fixes et des flux, ou encore les espaces mathématiques de
représentation, reliés à des indices numériques : des objets sémiotiques
qui enracinent dans la définition de Peirce, liés par une implication
mentale à l'objet qu’ ils visent. Ces indices aident à étudier les
variétés d’ équilibres du paysage tant que système dynamique. |
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(Leonardo da Vinci, esboço da
Toscania, c. 1473) |
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A natureza, sabe-se pelos estudos de
ecologia do animal ou da planta que é “essencialmente variada”. O homem
rompe o equilíbrio que depende dessa variedade quando faz que uma planta
única e no momento valorizada mais que as outras, cresça sobre uma
região inteira. É o drama da monocultura.
Gilberto Freyre [*] |
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Quando compus o termo ecomosaico, algures em meados da década de
noventa, pensava estar a fazer um neologismo original, e não a
introduzir um anglicismo, como depois descobri. O objectivo não era o
neologismo propriamente dito, mas trazer à discussão uma palavra que
fizesse um apelo reforçado à raiz ‘oikos’ - no étimo grego: casa rural
com suas dependências agrícolas – comum às denominações da ecologia e da
economia, assim servindo para balizar essa dupla vertente, seja o
conhecimento (logos) e as regras de condução (nomos), na apreciação da
paisagem e recursos naturais, e seus equilíbrios, nomeadamente de
composição.
Essa proposta sucedia a uma reflexão continuada sobre o problema da
valorização dos recursos florestais, na unidade agregativa que constitui
uma paisagem [v. 1]. O termo e o conceito ficaram expostos na minha tese
de doutoramento [2], mas concluí então que traduzia a palavra anglófona
‘ecomosaic’ antes cunhada por Forman [3], conceito definido pelo autor
como um paradigma da estrutura da paisagem composta por elementos, e
depois caracterizado como sendo intermediário na escala entre a
ecorregião e os ecótopos [4]. O termo ocorre ocasionalmente na língua
portuguesa, similar a mosaico de paisagem, estando referido por exemplo
a propósito da dinâmica e fisiografia de matos de capoeira baixa em
floresta ombrófila [5]. Também ocorre em língua francesa balizando o
nível hierárquico superior que subtende as eco-unidades no âmbito da
análise da arquitectura e da biodiversidade florestais [6].
Mais propriamente interessava-me como se poderia falar de paisagem
equilibrada, através do conceito de mosaico, termo que surgia aplicado
no estudo da paisagem já com longa tradição, a propósito dos arranjos
fitossociológicos no estudo da vegetação na escolas de Zurique e
Montpellier. |
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Milton
Santos, um autor brasileiro já falecido, geógrafo de nomeada,
que só conheci recentemente, situa a oposição entre paisagem e
espaço considerando que aquela é uma expressão sincrónica deste,
definido como reunião dialéctica de fixos e de fluxos: um
conjunto contraditório formado por uma configuração territorial
e por relações de produção, por um sistema de objectos e um
sistema de acções [7]. Ou ainda, de maneira mais incisiva: “eu
vejo o mundo constituído de fixos e de fluxos, por uma paisagem
e relações sociais” (idem, p: 156), e refere que a paisagem é um
palimpsesto [8] - uma imagem possante para situar um mosaico em
mutação. |
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(Milton Santos, prémio Vautrin
Lud 1994) |
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O conceito de ecomosaico que fui trabalhando ao longo do tempo tem um
forte enfoque matemático, baseado na teoria da informação e na teoria
dos sistemas dinâmicos [9], mais tarde prolongado como um
desenvolvimento da teoria dos jogos - mais propriamente no conceito de
índices de utilidade esperada [10, 11]. A meu ver, este tópico permite
uma intermediação entre o quadro perceptivo da paisagem e o âmbito mais
geral do espaço em que se insere, não só geográfico mas equacionável
matematicamente no conceito de espaço euclideano n-dimensional, que pode
ser estendido para espaços normados mais gerais [v. 12].
Índices numéricos são antes do mais índices no sentido geral do termo,
uma das três categorias de signos que Peirce especificou e elaborou
sucessivamente na tríade formada por {ícone, índice, símbolo}, afirmando
sobre os índices que representam seus objetos independentemente de
qualquer semelhança com eles, apenas por força do conexões reais com
eles [13]. Basicamente um índice indica, através de uma implicação, um
dedo apontado, esta pode ser material como a pegada de um animal no
solo, uma marca ou sinal, ou a parte de algo: uma folha de planta; ou
ainda mental: uma palavra, uma proposição, uma fórmula matemática. Pode
portanto um índice ser composto por símbolos, estes com significado
convencionado numa comunidade interpretante, uma cultura. O´Halloran
recorda a propósito do discurso matemático que os valores de contexto
ligados a diferentes escolhas ou combinações de escolhas de recursos
semióticos são social e culturalmente determinados [v. 14].
Essa representação matemática comporta inevitavelmente uma redução do
objecto perceptivo, e no caso enquadra-se no tema que Giles Deleuze
enunciou como sucede [15, p: 107]: a superfície é o lugar do sentido, os
signos permanecem desprovidos de sentido enquanto não entram na
organização de superfície que assegura a ressonância de duas séries.
Que séries são essas? No caso,
utilizo valores reais, escalares, de duas naturezas distintas: valores
intensivos, característicos, ecológicos e/ou económicos, reportados por
unidade de área dos diferentes habitats, e por outro a valores que
remetem à extensão, seja extensão relativa: proporções, frequências ou
probabilidades de ocorrência no mosaico, estas definidas como medidas de
verosimilhança de acontecimentos que se arrumam num espaço de medida [v.
16].
Recorda-se que o valor no sentido
semiótico é o valor como diferença que organiza cognitivamente o mundo
focalizado [17] e que o sentido é, em primeiro lugar, uma direcção, pois
dizer que um objecto ou uma situação tem um sentido é dizer que tende a
algo [18].
Falamos pois de valores, no caso
representados por números reais positivos, de acordo com a tradição
herdada dos clássicos, onde o valor ou número real positivo corresponde
ao comprimento ou magnitude de um vector, e este resvala
etimologicamente para o termo latino ‘vehere’ ligado a mensageiro [19].
Finaliza-se recordando a distinção introduzida por Agostinho entre signo
e coisa: as coisas são conhecidas por meio de signos, podendo assim
concluir-se que o signo é, antes do mais, um operador de representação
[20]. |
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Dedico à memória do amigo José Augusto
Mourão, com quem tive tantas conversas sobre este tema, e que
sempre me provocou para desenvolvê-lo. Este texto foi baseado
numa lição proferida em 17 de outubro de 2011 na UNILAB –
Universidade de Integração Internacional da Lusofonia
Afro-Brasileira. |
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Referências |
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Ciência, Tecnologia e Sociedade 21: 15-22.
[2] CASQUILHO, J.A.P.,
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[3]
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regions. Cambridge: Cambridge University Press.
[4]
NAGENDRA, H., GADGIL, M., 1999.
Biodiversity assessment at multiple scales: linking remotely sensed data
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Proc. Natl. Acad. Sci. USA
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[5] AMADOR, D. B., VIANA, V. M., 2000. Dinâmica de capoeiras baixas na
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[6] SCHNITZLER, A., 2001. L’intérêt du modèle architectural dans
l’analyse de la biodiversité forestière. Application à la gestion des
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[7] SANTOS, M.,
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[8] SANTOS, M., 2002.
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natureza do espaço:
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São Paulo: EDUSP.
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[10] CASQUILHO, J. P, 2010. Landscape mosaic composition and mean
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[11] CASQUILHO, J.P, 2011. Ecomosaic composition and expected utility
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[14] PEIRCE, C.S., 1909. A Sketch of Logical Critics.
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[16] CASTRO, A. A., 2004. Curso de Teoria da Medida. Rio de
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[17] FONTANILLE, J;
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[18] FONTANILLE, J.,
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[19] CASQUILHO, J.,
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http://www.arte-coa.pt/index.php?Language=pt&Page=Saberes&SubPage=ComunicacaoELinguagemLinguagem&Menu2=
Autores&Slide=90
[20]
MOURÃO, J. A.; BABO, M. A., 2007. Semiótica: Genealogias e
Cartografias, Coimbra: MinervaCoimbra.
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José Pinto
Casquilho.
Centro de Ecologia Aplicada Baeta Neves (CEABN/UTL),
Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens
(CECL/UNL).
josecasquilho@gmail.com
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
PORTUGAL |
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