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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
Nova Série | 2011 | Número 21
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ANA LUÍSA JANEIRA
Entre a Austrália e Timor |
Foto: José M. Rodrigues |
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EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Contacto: revista@triplov.com |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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Página Principal |
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Índice de Autores |
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O Contrário do Tempo |
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SIM, a Austrália e um pais muito especial, digo isto
depois de 1 semana em Melbourne + 3000 km na costa oeste e 3 dias em
Adelaide. Esta cidade, em particular, e um prazer para se estar com
calma e saborear como agora faço, já sozinha porque a Alexandra + Luis
estão de regresso.
O começo foi um tanto difícil: a TAP saiu atrasada, so por milagre não
perdemos a saída para Shanghai em Frankfurt e as nossas malas chegaram
ao destino já estávamos aqui há mais de 48 horas.... felizmente o seguro
cobrira despesas.
A viagem de carro mostrou-nos um pais com paisagem variada e muitos
momentos = Alentejo sem sobreiros e com eucaliptos, ou o Québec.
As pessoas são super simpáticas e tudo esta super explicado.
Amanha vou visitar com a Carol, amiga da minha irmã Belita, calculem -
uma imensa propriedade vinícola criada por jesuítas no século XIX - os
jesuítas perseguem-me ou eu persigo-os???? dá para dizer!!!!!
NOTA - como tudo, internet muito cara, mas casas de banho publicas
limpíssimas e sempre gratuitas e um autocarro com um percurso no centro
da cidade, também gratuito.
Ainda não reservei o bilhete para Dili, mas sábado ou segunda feira irei
tratar do caso - espero que Timor também saiba muito bem!!!!
Para a semana inicio minha aventura de comboio no deserto - todos dizem
ser único!
Depois de 1500 Km de comboio, umas 30 hs. no celebrado GHAN, 40 e tal
carruagens e cheio, com pessoal vestido à colonizador e que reproduz bem
o que foi o primitivo transporte actualizado mas sem mariquices, cheguei
a Alice Springs. Depois de um deserto entre o ocre e o vermelho,
extremamente marcado pela planura com bastante queimadas, foi bom ver
caras e casas, porque, calculem, durante mais de 10 horas = um continuo
deserto sem nenhum edifício, gente ou posto eléctrico. Nunca vivera
sensação igual e agora tudo parece far west: traçado da cidade, tipo de
pessoas, e uma concentração de aborígenes, bem negros, feições quadradas
e com traços muito marcados. Dão a impressão, na maioria, de
desintegrados... apesar das tentativas (as melhores? duvido) de que isso
seja ultrapassado.
Aqui como em Adelaide, dou por bem o tempo que investi na escolha dos
hotéis. De novo, muito bem localizado, à maneira inglesa com uma
cafeteira eléctrica onde preparo saborosos chás. Gastronomia australiana
parece não haver, mas o que se pode comer de outras cozinhas é bom +
caro.... O tempo varia entre 0 de noite e 20 de dia, com uma aragem
sempre fria.
Na segunda continuo até Darwin (+ uns 1500 km de comboio) com direito a
passar o Trópico de Capricónio.
Deste lugar sinalizado como a 17.500 Km de Londres, até agora, nenhum
português à vista, NS de Fátima muito venerada na Catedral de Adelaide,
enquanto C. Ronaldo continua a ser o português conhecido por aqui...
Pois na verdade os 5.000 km pelas austrálias corresponderam a espaços e
tempos muito bem vividos. Por vários momentos, me dei comigo a pensar:
"como estou tão ambientada e tão longe das minhas raízes"!!!!
Darwin tem uns 30 graus muito suportáveis dada uma constante brisa. A
cidade reconstruída por 2 vezes (ataque dos japoneses+tremor de terra) é
muito bem planeada, e como sempre tem acontecido mais uma vez o hotel
está belamente bem situado: acordo pelas 7, saio pelas 9.30, regresso
para fazer a sesta e volto a sair, todo o comércio fechas às 17, mas a
vida em bares e esplanadas é intensíssima! Tenho experimentado
gastronomias variadas, mas só faço uma refeição por dia num restaurante
= 10 euros, de resto já tenho uma lista de uns tantos produtos que
compro no supermercado... o que me permite recordar sabores ingleses e
canadianos.
Estando a cidade voltada para o turismo, levado a sério, nem podem
imaginar como o centro de informações funciona a valer e até um canal de
TV temos para nos orientarmos!!!
Depois de um mês por aqui, sinto que vai ser bom ter um período
diferente, estou muito contente porque a partir de segunda-feira,
chegarei a Timor.
Vou encarar os próximos 15 dias como um tempo de voluntariado e, depois
de tantos anos a estudar as missões jesuíticas, acho que vai ser
importante conviver com este tipo de realidade na actualidade, pois o
que não se vive, nunca se conhece bem.
ASSIM estas serão as minhas coordenadas
Comunidade Nª Sra de Aitara
Irs. Concepcionistas ao Serviço dos Pobres
Caixa Postal 205
Tibar - DILI - Timor Leste
Tel: 00670.7337512 |
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Aldeia timorense |
Tibar |
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O ar maravilhado do polícia quando mostrei o passaporte à minha chegada,
comoveu-me.
A seguir, tinha 2 freiras e a Vanda Narciso no Aeroporto, o que me soube
muito bem. Dali seguimos para o Centro dos Jesuítas, porque havia lá uma
conferência. Logo deu para recordar o Padre Fragata e o Irmão
Bernardino, de que há por cá uma memória viva... (nota - o Padre José
Martins manda saudades para o Ir. Bernardino, Manel Alte da Veiga e José
Gama) Gostei muito do posicionamento sócio-político do conferencista,
timorense professor na Gregoriana.
A cidade ainda deu para conhecer pouquíssimo, pois só de manhã aguento o
calor e a poeirada. O convento é a 10 Km, um trânsito infernal para cá,
junto ao mar mas não se o vê daqui. Dou 1 h de aula por dia, a alunas
amorosas - 2 grupos de 8 cada. Falam bastante bem e são muito
empenhadas. Sigo + ou - o ritmo delas, mas só me levanto às 8. Comemos
principalmente o que a terra dá e as jovens, Joaninha e Manuela, que são
as cozinheiras de momento tem uma queda especial para o tempero!!!! A
partir das 18 a brisa torna-se ainda + benfazeja e a noite com a porta
do quarto aberta é um regalo, mesmo - colchão é óptimo e travesseira
adequada. Devo acrescentar que a construção é de muito boa qualidade, o
que torna a casa fresca, e o campo - onde irmãs, as noviças e
postulantes trabalham de manhã e ao fim da tarde - mostra bem o
progresso do seu empenhamento - mandioca, repolho, tomates, bananeiras,
muita papaia, romãs....
Sinto-me à vontade e dá para perceber como este mundo é outro.....
Sinto naturalmente que muito tenho que aprender... de tanta
diferença....
A escrita vai um tanto desordenada, desculpem, mas a cabeça anda
aquecida!
De novo, saudades desta terra entre sândalos e papaias
Amanhã concluo a primeira semana por aqui, tendo sempre privilegiado a
temperatura fresca + o ar calmo que o convento oferece. Tenho ido a Dili
de 2 em 2 dias e da última vez já me senti + ambientada ao reboliço do
trânsito, além disso, já tomei um café (sempre forte, pelo que o prefiro
gelado!) no celebrado Hotel Timor, como fui a uma segunda conferência
nos jesuítas. A mais das aulas, vou lendo bastante e organizando as
muitas fotos.
As jovens alunas mostram-se atentas + interessadas e como são bastante
vivas, as aulas acabam por ser divertidas. Primeiro, falaram-me das
aldeias, muitas são da montanha, seus usos e costumes, e desde ontem
começamos a explorar vários conceitos: global-local, tradição-inovação,
se conseguir ainda tentarei: saber-poder, etc. Precisam de ser puxadas e
vejo até que o querem, por isso, com cuidado, lá vou eu....Como a
orientação geral que é dada pela superiora, a Irmã Dores me parece
adequada, estou certa que elas estarão a aproveitar os pingos de outros
mundos para onde as quero motivar.
A Anna Haddad perguntou-me sobre literatura - RUY CINATTI - é ainda o
grande, mas irei tentar saber mais. Entretanto leio Alberto Osório de
Castro, curiosamente bisavô da Catarina que me levou+Estela aos 60 anos
da Alexandra Escudeiro, no Baleal.
Mas, + curioso ainda é lembrar que o meu primeiro trabalho publicado,
isto é com letra de forma, saiu na revista SEARA, aqui de DILI, EM
AGOSTO DE 1970!!!!! De facto, a minha ligação aqui vem de longe.....
Como vão sendo horas de almoçar fico por aqui.....
Ontem passei a manhã na capital, fui à Universidade, comprei um pano
típico, comi peixe e ... regressei esfalfada, mas gostei de conhecer a
marginal, com pormenores bonitos mas um tanto degradados. Lá estive com
a Vanda e também com a Dália, ambas de Évora, que virão no sábado curtir
o fim de semana aqui. E saborear os petiscos das jovens, devo
acrescentar que fazem um pão caseiro com pevides e tudo, maravilhoso! Os
produtos da terra sabem a valer, AGRICULTURA BIOLÓGICA - nota - ontem
enquanto estava a almoçar o Alfredo Cunhal apareceu na TV, foi mesmo
giro vê-lo e tão inesperado - parabéns para ele pela mensagem global....
Enquanto escrevo ouço ecos da lição de música - são dotadíssimas, cantam
mesmo bem. Costumo adormecer e acordar embalada.... A presença deste
tipo de ensino parece-me uma ideia excelente e verifico que elas também
apreciam. Hoje vou ficar por casa e por isso até estou mais folgada para
escrever, só darei a primeira aula pelas 11.
Não sei se desta experiência resultará qualquer texto, mas ficará
seguramente uma marca especial dentro de mim, como um pre-sentir do
esforço requerido no encontro de culturas diferentes. Uma das duas irmãs
portuguesas (só 3 nesta casa) fala tetum o que ajuda muito na cidade -
aliás como sempre pensei esse é o veículo básico e verifico que nem
sempre se pensa assim.
Fico-me por aqui... porque este problema do ensino do português, onde
continua a necessitar-se de UM METODO ADEQUADO, sempre me indispõe - 40
anos depois de ter sido leitora, e nada de jeito!!!!
Agradecendo
o bom acolhimento permanente
das Irmãs do Convento de Nossa Senhora de Aitara
e da Vanda e Dália
bem como
a companhia de Alberto Osório de Castro
Ruy Cinatti, Luís Filipe Thomaz
e Padres Felgueiras e José Silva Martins
que pelos seus escritos
me propiciaram grelhas de leitura
para estas realidades
aqui vai à guisa de relatório de trabalho |
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Convento de
Nossa Senhora de Antaira |
Timorenses |
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Darwin |
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Adelaide |
Melbourne |
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Sidney |
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The Ghan |
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Congregação das Concepcionistas ao Serviço dos
Pobres
AULAS DE PORTUGUÊS MINISTRADAS A NOVIÇAS E
POSTULANTES
Tíbar, Timor Leste, Setembro de 2011
Ana Luísa Janeira |
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O ensino da língua, como oralidade e escrita,
desenvolveu-se ao longo de duas semanas, sempre associado à preocupação
de o manter integrado em perspectivas culturais.
Assim, na primeira semana, as alunas foram motivadas
a identificar traços da sua identidade comunitária e social (montanha,
vales e cidades): quotidiano nas aldeias, usos e costumes das famílias,
produção e produtos agrícolas, tipos de casa e festas.
Na segunda semana, procurou-se despertá-las para os seguintes temas:
- local e global
- tradição e inovação
- agricultura e cultura
- comunidade e sociedade
- desenvolvimento e gestão de meios
- informação e televisão
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Carta para Xanana Gusmão |
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Digníssimo Senhor
Xanana Gusmão
Primeiro-Ministro da República Democrática de Timor Lorosae
Professora reformada da Universidade de Lisboa, acabo de passar duas
semanas em Tibar. Isto aconteceu porque foi minha intenção integrar,
logo no meu primeiro ano com uma vida mais livre, um trabalho voluntário
em Timor.
Devido às necessidades
do Convento das Irmãs Concepcionistas ao Serviço dos Pobres e sob
orientação da Superiora, Irmã Dores Teixeira, durante estes quinze dias
dei aulas de português às suas noviças e postulantes, como procurei nos
meus contactos, não só contribuir para um melhor conhecimento da língua,
como também uma abertura cultural junto das jovens.
O motivo desta carta
prende-se com uma realidade que precisa de ser alterada pelos prejuízos
materiais e sociais que acarreta: todos os dias falta a luz, não se
sabendo quando e por quanto tempo. Posso admitir que haja necessidade
deste procedimento, mas considero inadmissível que não se possa tender
para um intervalo fixo, sendo a população devida e previamente
informada. De facto, sem saber quando vai acontecer como pode o
trabalhador organizar o serviço, a dona de casa prever a ordem das
tarefas, o jovem e a criança os momentos de estudo… (sem falar do
prejuízo para aparelhos e máquinas desligadas repentinamente). Isto
tanto mais que, pelo que pude vivenciar, embora o intervalo ocorra mais
frequentemente ao fim da tarde (geralmente depois do cair da noite,
prolongando-se por umas 4 hs) também acontece em horas laborais.
Senhor
Primeiro-Ministro, como sabe, mas permito-me insistir, porque dada a
minha formação em Filosofia e o meu andar pelo mundo, nomeadamente na
América Latina, sei do que falo: as sociedades modernas não se
compadecem e trituram os povos que não são orientados para ritmos
produtivos, e a produtividade requer um controlo disciplinado do tempo,
que se adquire de pequeno e tem de ser exercitado ao longo da vida,
tendo o poder que criar condições para este saber.
Assim sendo, permito-me
pedir que providencie os mecanismos administrativos para melhorar a
situação que acabo de descrever, no sentido das comunidades verem o seu
quotidiano beneficiado.
Antes de concluir quero
ainda manifestar-lhe quanto apreciei esta minha experiência, esperando
ter semeado ao vento mais uma aproximação Portugal – Timor Leste.
Acrescentarei ainda, num tom de franqueza, ter esperança de encontrar o
país integrado num plano de estradas condignas (sem elas como poderá ter
a dignidade e operatividade que merece!!!) e a cidade de Díli menos
degradada, da próxima vez que cá vier.
Desejando a melhor
atenção para esta carta, de que segue cópia também para o Director dos
respectivos serviços, envio-lhe, Senhor Primeiro-Ministro, os meus
melhores cumprimentos
Lisboa, 19.09.2011
Ana Luísa Janeira
Professora da Universidade de Lisboa
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ANA LUÍSA JANEIRA (PORTUGAL)
Professora Associada com Agregação em
Filosofia das Ciências, aposentada
Secção Autónoma de História e Filosofia das Ciências
Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa
Rua Ernesto de Vasconcelos
1749-016 Lisboa
Co-fundadora, primeira coordenadora e actualmente investigadora do
Centro Interdisciplinar de Ciência, Tecnologia e Sociedade da
Universidade de Lisboa (CICTSUL)
Instituto de Investigação Científica Bento da Rocha Cabral
Calçada Bento da Rocha Cabral, 14
1250-047 Lisboa
janeira@fc.ul.pt
aljaneira@sapo.pt |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
PORTUGAL |
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