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Antes
que algum engraçadinho faça piada, vou logo dizendo que não, não me
introduziram coisa alguma no ânus. Isso é mania de proctologista e não
de
extraterrestres curiosos. Sim, eles me levaram na sua nave espacial e eu
vi o
nosso planeta lá de bem longe no espaço sideral. Foi supimpa. Supimpa é
uma
palavra bonitinha que caiu em desuso. Às vezes eu solto uma palavra como
essa
para ver a reação das pessoas. O meu psiquiatra diz que esse
comportamento
prejudica a minha imagem no grupo, ou a imagem que o grupo faz de mim,
ou coisa
parecida, acho que ele fala da sociedade em geral, de todos vocês, deu
para
entender, não? As pessoas acabam me rotulando: “Olha aquele cara, ele é
muito
estranho. É sinistro.” E assim vai... Já me acostumei. Mas não vem ao
caso. Fui
abduzido, vi a Terra lá de longe, fui até Marte e depois Saturno. Em
Marte
conheci os marcianos, eles têm um metro e vinte de altura e são
hermafroditas. |
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Não são verdes, como dizem por aí, mas um laranja caindo para o cinza.
Meio
desbotados, sabe. Os marcianos adultos estão na fase oral. Um terror. É
preciso
tomar cuidado com isso, porque eles têm dentinhos afiados. Quase tive um
acidente. Eles não entendem por que raios nós terráqueos temos tanto
medo
deles. Não vêem a hora de receberem mais visitantes daqui. Eles nos
adoram,
principalmente nós machos, nossa altura e nossas particularidades
anatômicas.
Em Saturno foi diferente, meus amigos exploradores pararam lá apenas
para uma
partida de bocha galáctica. Disseram-me que o circuito dos anéis é o
mais
procurado por essas nossas bandas, vem gente de tudo que é canto da
Nuvem de
Magalhães – da pequena e da grande – e que eles precisavam dessa
folguinha para
se distrair um pouco. Muito trabalho, sabe. Esqueci de dizer, meus
amigos
exploradores são de Andrômeda. Estão fazendo uma espécie de turismo
ecológico “de
negócios” em nossa galáxia, mais ou menos como os gringos fazem lá na
Amazônia,
“catalogando” bichos e pedras. Eles são translúcidos – ou invisíveis,
como
prefere o meu psiquiatra –, todos em Andrômeda são translúcidos, até seu
disco
voador é assim também. Coisa bonita, sabe. Depois do jogo de bocha em
Saturno,
eles me trouxeram de volta, mas antes de partirem para Tau Ceti eles me
pediram
para transmitir uma mensagem à humanidade. Disseram: “Josué, avisa ao
seu povo
na Terra que não adianta fazer nada.” E foram embora, sem explicar que
raios de
mensagem era essa. Claro que eu não entendi, mesmo assim contei para o
meu
psiquiatra. Ele fez cara de cu e nada disse. Tentei os jornais e até um
cara lá
da NASA, mas ninguém me deu ouvidos. Aí ontem o sol piscou três vezes e
três
vezes é o seu tamanho agora em relação ao que era ontem, e está todo
mundo aqui
nesse manicômio desgraçado – o meu psiquiatra diz que é casa de repouso,
ainda
mato esse idiota – todo mundo, cientistas, políticos, esses repórteres
da tevê,
todos vocês aqui na minha frente querendo saber o que aconteceu e o que
está
para acontecer. Ora bolas, eles disseram, não disseram? Eles disseram
com todas
as letras que não adianta fazer nada. Raios, eu bem que queria ter
ficado em
Marte...
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Rodrigo Novaes de
Almeida (Brasil, Rio de Janeiro, RJ-1976).
Escritor e jornalista. Publicou, pela
Multifoco Editora, o livro de contos “Rapsódias – Primeiras Histórias
Breves” (2009), pela Mojo Books, a ficção “A saga de Lucifere”, e
participou das antologias Portal Stalker, Portal Fundação e Portal 2001
(org. Nelson de Oliveira). Colunista do http://o-bule.blogspot.com/
Bloga em http://bit.ly/RnaBlog
Contato:
rnalmeida76@gmail.com |