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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
Nova Série | 2011 | Número 14
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Em memória do Pedro Lima
Os livros vão desaparecer? - pergunta-se. E uns
respondem que sim, e outros, irritados, garantem que não. Porém há
livros e livros, e todos estamos destinados ao desaparecimento.
A propósito de livros, recebi, de Homero Gomes, um
livrinho pequeno em formato e em número de páginas (não numeradas, de
resto), «Solidão de Caronte», que se apresenta como material de
divulgação. Já conhecemos no TriploV a poesia deste jovem brasileiro, e
precisamente de «Solidão de Caronte». Entre a selva do asfalto urbano e
os encantamentos da cultura clássica, os seus versos, sinuosos, fluem
como o Estige, ou outro desses cursos de água simbólica atravessados
pelo barqueiro do Inferno.
Escrevo com lágrimas nos olhos porque morreu de
súbito, ontem, o Pedro, um jovem de rosto de menino, ainda meu parente,
que só por existir, com a sua bondade e beleza, nos encantava. Quem diz
que Deus ama os jovens, e por isso os leva, com estes aneurismas e
outras fatalidades que nem a Deus se perdoam, quem diz isso, di-lo
porquê? Não faz sentido a morte, e estas muito menos. |
EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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MARIA ESTELA GUEDES
Os livros que somos |
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Nós somos livros, todos nós desaparecemos. Quanto ao
objeto de papel, idolatramos o papel? Parece claro que as tecnologias
avançam e com isso surgem novos materiais de suporte para as diferentes artes e modos
de comunicação. Que diferença entre o «Amor de Perdição» em papel ou em e-book? Eu começo a ter dificuldade de ler. Às vezes a minha mãe folheia
uma revista, ela gosta de saber os mexericos dos príncipes e princesas,
peço-lhe: - Leia lá isso em voz alta!... E ela lê, e é tão agradável
entrar dentro de uma narrativa, conduzida só pela oralidade! Nenhum
pedaço de papel consegue competir com o calor da voz materna como
suporte de literatura.
Também recebi, do António Cândido Franco,
especialista em Teixeira de Pascoaes, dois livros dedicados a esse
escritor meu conterrâneo. Se chegar à janela, vejo na distância o perfil
sombrio e azulado da serra que lhe deu o título «Maranus». António
Cândido Franco dedica ao poeta da Serra do Marão uma obra que, além de
interessar a todos, vai despertar ainda mais o interesse dos
surrealistas, «Teixeira de Pascoaes nas palavras do surrealismo em
português». «Pascoaes, Cesariny, Cruzeiro Seixas, os surrealistas do
anti-grupo, o Café Gelo & outros saudosistas ou surrealistas do surreal
(ou) não». Terceiro título deste livro lindíssimo, com imagens, a
primeira a cores, de Délio Vargas, «Subsídio ou pleito rememorativo &
(talvez) historiográfico para uma conclusão geral do poético no século
XX português» (Editora Licorne, 2010).
O Pedro estabeleceu uma relação de amizade com o
TriploV, conhecia o site, ia ver de vez em quando algum assunto sobre
Britiande, e passava-me para papel (o papel, essa matéria sagrada...)
alguns textos que lhe levava na PEN, porque, e esperemos que o papel não
desapareça por completo, eu só consigo corrigir com mais cuidado os
textos em papel. Por isso, os livros ou os artigos de maior
responsabilidade, levava-lhos, ah, sim, porque a porcaria da HP já foi
uma boa marca, em eras transatas, agora, de repente, como em morte
súbita, resolveu encalhar, declarando que não reconhece os tinteiros. Vá
dar uma curva muito grande, afinal ficava mais barato ir ao escritório
onde trabalhava o Pedro e pedir-lhe que mandasse imprimir o conteúdo da
PEN.
«Teixeira de Pascoaes, Pensamentos e Máximas», eis
outra obra com seleção e apresentação de António Cândido Franco (Maia,
Cosmorama Edições, 2010). Vale a pena tentar reconstituir o pensamento
de um homem através dos pedaços de escrita em que se reparte. Por
exemplo, que mundo existe atrás da cortina de uma máxima como esta? -
"Deus é Homem com H infinito, o homem é Deus, sem h,
um ventre apoiado em duas pernas de ave depenada».
E para o fim guardei um autor tão livro como a
monumental obra que deu recentemente a lume, «Cristianismo Iniciático -
O que nunca leu sobre o Cristianismo», de António de Macedo (Lisboa,
Ésquilo Edições, 2011), na coleção Pensar Convida, tutelada pela
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. São 670
páginas fundadas na sua tese de doutoramento, e representam sem dúvida
nenhuma uma fonte de referência obrigatória para trabalhos sobre gnose
em Portugal, por muito que os católicos torçam o nariz. |
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Maria Estela Guedes (1947,
Portugal). Diretora do TriploV
ALGUNS LIVROS. “Herberto Helder, Poeta
Obscuro”, Lisboa, 1979; “Mário de Sá Carneiro”, Lisboa, 1985; “Ernesto
de Sousa – Itinerário dos Itinerários”, Lisboa, 1987; “À Sombra de
Orpheu”, Lisboa, 1990; “Prof. G. F. Sacarrão”, Lisboa, 1993; “Tríptico a
solo”, São Paulo, 2007; “A poesia na Óptica da Óptica”, Lisboa, 2008;
“Chão de papel”, Lisboa. 2009; “Geisers”, Bembibre, 2009; “Quem, às
portas de Tebas? – Três artistas modernos em Portugal”, São Paulo, 2010;
"Tango Sebastião", Lisboa, Apenas Livros Editora, 2010; "A obra ao rubro
de Herberto Helder", São Paulo, Escrituras Editora, 2010.
ALGUNS COLECTIVOS. "Poem'arte - nas margens da poesia". III Bienal de
Poesia de Silves, 2008, Câmara Municipal de Silves. Inclui CDRom
homónimo, com poemas ditos pelos elementos do grupo Experiment'arte. “O
reverso do olhar”, Exposição Internacional de Surrealismo Actual.
Coimbra, 2008; “Os dias do amor - Um poema para cada dia do ano”.
Parede, Ministério dos Livros Editores, 2009. Dicionário Histórico das
Ordens e Instituições Afins (Gradiva, 2010). TEATRO. Multimedia “O
Lagarto do Âmbar, levado à cena em 1987, no ACARTE, com direcção de
Alberto Lopes e interpretação de João Grosso, Ângela Pinto e Maria José
Camecelha, e cenografia de Xana; “A Boba”, levado à cena em 2008 no
Teatro Experimental de Cascais, com encenação de Carlos Avilez,
cenografia de Fernando Alvarez e interpretação de Maria Vieira. |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
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