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Natural de Fortaleza, o embaixador Dário cumpriu duas
brilhantes trajetórias: na diplomacia e na literatura. Em 1984, publicou
Era Lisboa e Chovia (Rio de Janeiro, Nórdica) sucedido por Era Tormes e
Amanhecia (Rio de Janeiro, Nórdica, 1992) e Era Porto e Entardecia (Rio
de Janeiro, Nórdica, 1995), trilogia que constitui um mergulho profundo
no universo de Eça de Queiroz (1845-1900). É também autor de Dinah,
Caríssima Dinah (São Paulo, Horizonte Editora, 1989), livro em que
homenageou a esposa, Dinah da Silveira de Queiroz (1911-1982),
romancista, cronista e contista que integrou a Academia Brasileira de
Letras, com quem foi casado de 1962 a 1982. Seu último livro foi
Luso-Brasilidades nos 500 Anos (Universidade Federal do Ceará, 1999),
que reuniu artigos e palestras.
II
Filho de uma família de grandes comerciantes e
industriais, ele preferiu seguir sua vocação e continuar os estudos no
Rio de Janeiro, onde se formou em Direito, pela Pontifícia Universidade
Católica (PUC). Seguiu, então, para o Instituto Rio Branco,
preparando-se para a carreira diplomática. Tornou-se poliglota. Aos 22
anos, após um estágio na Organização das Nações Unidas (ONU), foi
nomeado terceiro-secretário. Em 1954, passou a cônsul de segunda classe,
trabalhando em Buenos Aires até 1958. Em Nova York, foi segundo
secretário da ONU, entre 1958 e 1960.
De 1962 a 1964 foi primeiro-secretário na Embaixada
do Brasil em Moscou, onde teve despertada a sua paixão pela literatura
russa, e de 1965 a 1967, cônsul em Roma e, em 1971, primeiro secretário.
Após 27 anos de trabalho, chegou, em 1979, ao cargo de embaixador,
representando o Brasil em Lisboa até 1983. Já havia sido chefe de
gabinete do ministro das Relações Exteriores e secretário-geral e
ministro-interino das Relações Exteriores. De 1983 a 1989, foi
embaixador na Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington.
Foi ainda cônsul-geral do Brasil no Porto até 1990, quando se aposentou
com categoria de embaixador.
Em vez de retornar ao Brasil, preferiu fixar
residência em Lisboa, num apartamento no Campo Grande, a 100 metros da
Biblioteca Nacional, até onde se deslocava quando necessitava apurar
alguma informação. Por isso, sempre foi tratado por todos os diplomatas
que o sucederam no cargo em Lisboa como uma espécie de
embaixador-honorário do Brasil. Era freqüentemente convidado a dar
palestras em instituições portuguesas, como a Academia das Ciências de
Lisboa. Foi eleito membro da Academia Portuguesa da História. E era
presidente do Conselho de Curadores da Fundação Luso-Brasileira.
III
Aos pesquisadores e estudantes brasileiros em
Portugal sempre foi um porto seguro, ajudando-os com indicações e
informações preciosas. Em 1998, o ex-embaixador do Brasil em Portugal,
José Aparecido de Oliveira (1929-2007), por moto próprio, ofereceu-lhe o
livro Fernando Pessoa: a Voz de Deus (Santos, Universidade Santa
Cecília, 1997), deste articulista. Como à época escrevia o prefácio para
o livro Fernando Pessoa: o Antidemocrata Pagão, de Ruy Miguel (Lisboa,
Nova Arrancada, 1999), Dário citou Fernando Pessoa: a Voz de Deus para
lembrar que o poeta não havia sido fascista, mas defensor de uma
monarquia ideal baseada na opinião pública.
Foi o que bastou para interessar a editora portuguesa
por algum trabalho deste articulista. Assim, em 1999, saía pela Nova
Arrancada, de Lisboa, o romance Barcelona Brasileira, com prefácio de
Dário Moreira de Castro Alves. Escrito em 1983, o livro, que trata da
agitação anarquista no Porto de Santos entre 1917 e 1922, só sairia no
Brasil em 2002 pela Publisher Brasil, de São Paulo, com a apresentação
de Dário Moreira de Castro Alves e prefácio do professor Massaud Moisés,
da Universidade de São Paulo.
Por indicação ainda do embaixador Dário Moreira de
Castro Alves, este articulista escreveu prefácios para dois livros de
contos de Machado de Assis organizados pelo professor Vadim Kopyl e
publicados, em 2006 e 2007, pelo Centro Lusófono Camões da Universidade
Estatal Pedagógica Hertzen, de São Petersburgo, Rússia, em edição
bilíngüe russo-portuguesa, com o apoio do Ministério das Relações
Exteriores do Brasil.
IV
Embora extremamente afável, Dário Moreira de Castro,
à primeira vista, parecia bastante formal – pedia a quem o visitasse em
sua residência que assinasse o “livro de honra” e às mulheres sempre
fazia um salamaleque em que apenas fingia que beijava a mão da dama –,
mas, depois de alguns minutos de conversa, deixava de lado as exigências
diplomáticas para uma conversa bastante descontraída em que gostava de
lembrar seus primeiros tempos de Fortaleza. Mas o que o fazia falar por
horas com mansuetude na voz era mesmo a Lisboa de Eça de Queiroz.
Andar ao seu lado num automóvel pelas ruas lisboetas
era redescobrir a urbe queirosiana e resgatar os passos de suas
personagens: “Ali naquele prédio da esquina da Rua Áurea com o Rossio
ficava o consultório de Carlos Eduardo” (personagem de Os Maias),
apontava. Ou: “Esta é a correnteza de casas velhas a que se refere Eça
em O Primo Basílio”, dizia, mostrando o Largo de Santa Bárbara, nos
Arroios.
Às vezes, dizia para seu motorista particular desviar
o caminho só para passar por uma ladeira íngreme de um bairro bem
degradado da velha Lisboa: “Aqui o Xavier foi viver com a espanhola
Carmen, num casebre da Rua da Fé”, dizia, referindo-se a personagens de
A Relíquia. Todos esses logradouros estão retratados em Era Lisboa e
Chovia em fotos de seu amigo A.Campos Matos, arquiteto e notável
queirosiano.
O que o fazia perder um pouco a fleuma
britânico-cearense era a velha discussão sobre a morada de onde Eça de
Queiroz tirara a inspiração para criar O Ramalhete, casa em que a
família Maia (Afonso e o neto Carlos Eduardo) passou a habitar no outono
de 1875. Para o embaixador, Eça teria se inspirado na casa do Conde de
Sabugosa, um dos vencidos da vida, que fica em Santo Amaro, perto da
Junqueira, na Rua Primeiro de Maio, 120-124, a meio caminho entre
Alcântara e Belém, e não no bairro das Janelas Verdes, como muitos
estudiosos diziam. Seguia o que afirma A.Campos Matos em Imagens do
Portugal Queirosiano (Lisboa,1976).
Os passeios sempre terminavam com um almoço ou jantar
num dos restaurantes preferidos de Eça de Queiroz, nas proximidades do
Chiado. O cardápio tinha de acompanhar rigorosamente a gastronomia
queirosiana regada sempre por bons vinhos e outras bebidas, seguindo o
que escrevera em Era Porto e Entardecia, que traz uma lista de todas as
bebidas mencionadas por Eça, do absinto à zurrapa, e em Era Tormes e
Amanhecia, que constitui um completo dicionário gastronômico cultural,
com o nascimento literário de Eça de Queiroz na região do rio Douro. Sem
contar o privilégio de se apreciar a bebida ouvindo a história de sua
origem, pois Dário Moreira de Castro Alves também é autor de O Vinho do
Porto na Obra de Eça de Queiroz (Sintra, Colares Editora, 2001).
V
Em 2003, já vivendo o inverno da vida, viúvo pela
segunda vez, depois da morte de Rina Bonadies de Castro Alves, o
embaixador decidiu voltar para Fortaleza, para um apartamento na Praia
do Meireles, defronte para as águas verdes do Atlântico. De lá, porém,
continuou a sua missão de construir pontes de entendimento entre o
Brasil e o mundo, especialmente com Portugal e a Rússia. Era presença
constante como articulista nas seções culturais dos diários e dos
jornais literários, sempre em defesa da lusofonia, o que o levou a se
colocar em 1993 ao lado do embaixador José Aparecido de Oliveira na luta
pela criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Brasil, Portugal e Rússia talvez não saibam, mas perderam um grande
pontífice. |
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Adelto Gonçalves (Santos, Brasil).
Doutor
em Letras na área de Literatura Portuguesa e mestre
em Língua
Espanhola e Literaturas Espanholas e
Hispanoamericana pela Universidade de São Paulo (USP).
É autor de Bocage: o perfil perdido (Lisboa,
Caminho, 2003), Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio
de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona
Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo,
Publisher Brasil, 2002) e Fernando Pessoa: a voz de
Deus (Santos, Universidade Santa Cecília, 1997), Os
vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, José
Olympio, 1981) e Mariela morta (Ourinhos-SP,
Complemento, 1977). É colaborador da revista
Vértice, de Lisboa, desde 1994. Escreve também no
quinzenário As Artes Entre as Letras, do Porto, e na
Revista Forma Breve, da Universidade de Aveiro, No
Brasil, escreve na Revista Brasileira, da Academia
Brasileira de Letras, no Jornal Opção, de Goîânia, e
na Revista Philologus, do Círculo Fluminense de
Estudos Filológicos e Lingüísticos. É membro da
Academia Brasileira de Filologia (Abrafil). É
professor de Jornalismo na Universidade Santa
Cecília, de Santos, e no curso de Direito da
Universidade Paulista (Unip), campus Rangel, em
Santos. Ganhou os prêmios Assis Chateaubriand, de
1987, e Aníbal Freire, de 1994, da Academia
Brasileira de Letras, e Ivan Lins de Ensaios, de
2000, da Academia Carioca de Letras e União
Brasileira de Escritores, do Rio de Janeiro.Escreveu
prefácios para dois livros de contos de Machado de
Assis publicados em 2006 e 2007 pelo Centro Lusófono
Camões da Universidade Estatal Pedagógica Hertzen,
de São Petersburgo, Rússia, em edição bilíngüe
russo-portuguesa. Jornalista desde 1972, trabalhou
em O Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo, Editora
Abril e A Tribuna, de Santos. Foi correspondente em
Lisboa da revista Época em 1999-2000.
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