|
Sozinho
no seu poço
o exilado cisma
que só não morre
quem nunca nasceu
só não nasce
quem nunca soube
do poço do perecimento
Sozinho
no seu poço
o deportado cisma
que só não renasce
quem nunca se negou a entregar
à implacável rotina do carniceiro
a carne nua táctil e sua
e ao severo silêncio do confessor
uma nesga da sua alma
- ínfimo conquanto valioso quinhão
na mesura e no peso do remorso
sopesados no tempo e na medida da dignidade
|
|
Sozinho
e emparedado
de um poço
para outro
transita o auto-exilado
e conclui
que iguais e funestas
são as dimensões de um e de outro
quando a solidão somente circundam
e medita
na breve flor
que nos versos chora
e tal o súbito e previsível esplendor
de todos os setembros
tal o ofuscante relampejar
das convulsões há muito aguardadas
se liberta
iluminando
a dor emparedada
desses tempos de pedra
de flagelação da alma
de lenta derruição do corpo .... |
|
JOSÉ LUÍS HOPFFER
C. ALMADA (CABO VERDE).
Jurista, poeta, ensaísta, analista e comentador radiofónico. Nasceu
no sítio de Pombal, Concelho de Santa Catarina, ilha de Santiago, Cabo
Verde (1960). Reside actualmente em Lisboa. Licenciado em Direito pela
Universidade Karl Marx, de Leipzig, e pós-graduado em Ciências Jurídicas
e em Ciências Políticas e Internacionais pela Faculdade de Direito de
Lisboa. Desempenhou as funções de técnico superior em vários
departamentos governamentais e de Director do Gabinete de Assuntos
Jurídicos e Legislação da Secretaria-Geral do Governo. Associado a
diversas iniciativas culturais em Cabo Verde, como o Movimento
Pró-Cultura (1986), o suplemento cultural Voz di Letra do jornal Voz di
Povo (1986-1987) e a revista Pré-Textos; director da revista Fragmentos
(1987-1998); co-fundador da Spleen-Edições (1993) e dirigente da
Associação de Escritores Cabo-Verdianos (1989-1992/1998). Participação
regular em colóquios, em diversos países, como Senegal, Cuba, Bélgica,
Brasil, Angola, Portugal, Holanda, Suíça, Moçambique; colaboração
assídua em jornais e revistas literárias e jurídicas, com destaque para
Fragmentos, Pré-Textos, Direito e Cidadania, Lusografias, A Semana,
Liberal-Caboverde. Representado em diferentes antologias poéticas
estrangeiras. Organizou Mirabilis – de Veias ao Sol (Antologia dos
novíssimos poetas cabo-verdianos (1998) e O Ano Mágico de 2006 – Olhares
Retrospectivos sobre a História e a Cultura Cabo-Verdianas (2008).
Publicou: À Sombra do Sol, I e II, (1990); Assomada Nocturna (1993),
Assomada Nocturna – Poema de NZé di Sant’ y Águ (2005); Orfandade e
Funcionalização Político-Ideológica nos Discursos Identitários
Cabo-Verdianos (2007), e Praianas (Revisitações do Tempo e da Cidade)
(2009). Utiliza os nomes literários Nzé di Santý Águ, Zé di Sant´y Águ,
Alma Dofer Catarino, Erasmo Cabral de Almada (poesia), Tuna Furtado
(artigos e ensaios) e Dionísio de Deus y Fonteana (crónica literária e
prosa de ficção). |