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É uma sensação
curiosamente estranha. O finito ficar ainda mais finito. Quando perdemos
um Tom Jobim, quando se despede de nós um Carlos Drummond de Andrade, a
gente fica com a sensação de precariedade ainda mais à flor da pele. O
existir torna-se um sopro que... de um instante para o outro pode não
mais acontecer. O existir torna-se precário em toda a sua totalidade.
Olhamos ao redor e percebemos o precário da própria vida. E agora fico
sabendo de José Saramago. Deixou de existir. Tornou-se radicalmente
precário.
Pouco me importa se ele
tinha 87 anos. Pouco me importa o estilo ser assim ou assado. Saramago
é singular. Tem coisa de homem raro nele. Tenho certeza que Saramago é
daqueles escritores que leva junto com ele o homem José Saramago. E isso
torna a perda ainda mais perda. Fica-se sem porquê. É uma despedida sem
aviso, afinal tudo existe, julgamos nós tolamente, para sempre existir.
É que a força de uma vida não pode ser medida. Logo, ilusoriamente ( ou
seria necessariamente?) infinita. E uma despedida toda especial.
Despedida (quem sabe?) de valores e ideais realmente importantes . A
vida se empobrece e a gente olha em volta e não sabe nem com quem
comentar a morte. Afinal, estamos em Copa do mundo 2010 e os olhos, numa
espécie de cegueira pós-saramagueana, estão voltados à pequena esfera
que passeia pela grama e que se reproduz em todos os lares deste
planeta um dia já infinito... |
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Qual é a perda, então?
Parece que José Saramago era uma resistência a essa grande corrente que
só diz sim : sim à violência planetária, sim à destruição das culturas,
sim ao enxugamento visível do espaço afetivo dentro das relações humanas
e também do espaço afetivo com a gente mesmo. Sim à mercantilização de
tudo e de todos, sim ao Deus dinheiro, à Deusa do Poder. Sim a tudo que
seja fácil, tranqüilo, descartável e, de preferência, indolor. O prazer
mais fútil e veloz no lugar de qualquer coisa ( ainda que minimamente
pensada...). Alguma coisa estava fora do lugar (e continuará.. sempre?)
e Saramago nos dizia isso através de seus livros... O não tem suas
máscaras...
Enfim... O finito mais
finito ainda. É como se o universo encurtasse-se um pouco mais e a gente
não soubesse o que fazer do instante seguinte. É como se toda a labuta
diária perdesse o sentido. Corre-se tanto, não é? A morte de Saramago é
aquela paradinha, em um dia de 24 horas de fúria metropolitana , nos
dizendo que as coisas não são bem assim. Talvez, pense algum possível
leitor, que eu esteja exagerando. Mas, complementando também, só posso
falar a partir de mim. Este mim que ficou hoje, aos 18 de junho de 2010,
bem mais finito do que gostaria. É assim mesmo. O gosto de finito na
boca e a sensação de precariedade em todos os poros. É assim mesmo.
Será? |