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- Pouca vergonha..
- Quê que há, vovó? Nunca viu mulher pelada, não?
- Falta de respeito.
Vera cruza as mãos por baixo
da cabeça, espreguiça-se e ri. D. Berta aponta o corredor.
- Pode entrar alguém.
- Quem que vai entrar aqui com a senhora aí de
sentinela, hem? Só Almeno e, mesmo assim, pedindo licença, licencinha.
D. Berta sai do quarto e fecha a porta. Vera encolhe os
ombros. Ah, foda-se, se nunca mais fodeu o problema não é meu. Fecha as
pernas e olha os pentelhos castanhos, encaracolados, Vera detesta
depilação pubiana. Por quê que Almeno é tão burro, hem? Olha os bicos
duros dos seios e rola na cama. Tou que tou, pegando fogo, puta merda.
Senta-se na cama, pega um livro do chão, Vera gosta de ler policiais, e
deita-se de novo. Lê algumas páginas, fecha o livro e olha o teto do
quarto. Aquela vaca estragou a minha tarde. Sempre estraga, filha da
puta. Joga o livro no chão, levanta-se e entra no quarto do cunhado,
puxa a colcha e arrasta o corpo em cima dos lençóis. Pega o travesseiro
e esfrega-o nas coxas e no sexo. Sorri. Almerindo, tadinho dele, vai
tocar punheta até.
Vera mora na Savassi, rua
Fernandes Tourinho quase esquina com Sergipe há pouco mais de um ano.
Mas odeia. No mesmo edifício mora também o resto da família. Avó, pai,
mãe e dois irmãos, um mais velho, outro mais novo, ambos solteiros.
- Almeno, por quê que você comprou este apartamento?
Não tinha outro lugar, não?
- É um edifício novo, muito bom, e foi o seu presente
de aniversário, meu bem.
- Mas logo aqui, Almeno? Todo mundo do outro lado do
corredor?
- É um ótimo apartamento, meu bem. Quatro quartos, duas
vagas na garagem...
Almeno, Dr. Almeno Junqueira-Lobo, com hífen, é
psiquiatra, um dos consultórios de maior clientela da zona sul de Belo
Horizonte.
- Você não gostou do presente, não, meu bem?
- Não foi você que escolheu?
- Custou duzentos mil dólares, meu bem. Em dólar.
Vera casou vai fazer cinco
anos. No último ano da faculdade. Curso de Letras, habilitação em latim.
- Não precisa se formar, não, meu bem. Eu não quero que
você trabalhe fora.
Foram morar com os pais de Almeno, no Gutierres, ele
também psiquiatra e ela prendas do lar. Pai e filho, mesma profissão,
mesmo senso, mulheres em casa. Vera ainda tentou, mas não agüentou morar
mais de dois anos com os sogros. Almeno, você não acha que morar perto
do consultório seria muito melhor pra você? Hem? Meu bem... Precisa nem
de gastar gasolina, Almeno. Alugaram um apartamento em Lourdes. Um ano
depois, Almeno trouxe o irmão para morar com eles.
- Você não se importa, não é, meu bem?
- Não foi você que trouxe?
- Mas você podia se importar, meu bem.
Almerindo, ex-estudante do Seminário de Mariana,
escriturário do Banco do Brasil, e dois anos mais velho que Almeno, é
solteiro.
- E não se preocupe, meu bem. Almerindo vai ajudar nas
despesas da casa..
- Não tou preocupada.
No quarto ano de casados, no aniversário de Vera,
Almeno comprou aquele apartamento.
- Almeno, eu não quero morar aqui, junto com todo
mundo. Vovó então...
- Você sabe que eu gosto da sua família, meu bem. E
vovó só quer ajudar. Ela mesma já falou.
- E essa extensão do nosso telefone no apartamento da
mamãe?
- Precaução, meu bem. Apenas precaução. Enquanto eu
estou no consultório, se você precisar de alguma coisa...
Preciso, sim, mas é de quem
me foda. E bem. Vera fumou o primeiro baseado por curiosidade. Mexendo
nas gavetas de Almerindo, dentro de um par de meias mal dobrado, Vera
encontrou um pacotinho de maconha e papel de seda já cortado. Enrolou um
cigarro e puxou uma tragada. Horrível. Na segunda a cabeça rodou, Vera
vomitou, passou mal. Mas continuou. Se o bosta pode, por quê que eu não
vou poder? Uma semana depois já viajava, sozinha no quarto, vovó lavando
a louça ou arrumando o apartamento. Almerindo nunca disse nada e Vera
nunca soube se ele dava pela falta. O sangue de Vera lateja, o corpo
começa a ficar leve e começa a flutuar. Um bosta. Um bostão que nem
Almeno. Viado. Puxa mais duas tragadas profundas. Olha só vovó sumindo.
Morre, sua vaca, xereta, filha da puta. A vaca morre e eu toco gaita no
enterro dela. Ri. A vaca morre e eu toco gaita no enterro dela. Toco
gaita, toco gaita, toco gaita no enterro dela. Ri às gargalhadas. A vaca
morre e eu toco foda, toco gaita, toco vaca, ah, ah, fodeu a vaca, fodeu
a gaita. Puxa a última tragada, joga a guimba no carpete, deita-se de
costas, sobe no teto e tchau, meu bem, apenas precaução, viu?
Vera despe-se no closet. No
banheiro da suite, Almeno escova os dentes e faz um gargarejo
antiséptico. Vera tapa os ouvidos, odeia aqueles gargarejos.
- Mas, meu bem, compreenda, é uma questão de higiene.
No consultório entra todo tipo de paciente e o ar fica todo viciado.
Almeno veste o paletó do pijama e deita-se. Vera
deixa-se cair na cama, nua por cima dos lençóis, apesar do ar
condicionado. Verão ou inverno, ar-condicionado ligado ou desligado,
Vera dorme sempre nua. Almeno aconchega o travesseiro, apaga a luz,
cobre-se com o lençol e pouco depois adormece, ressonando. Vera acende o
seu abajur, pega um livro policial e acende um cigarro. Continental.
Vera gosta de cigarros fortes. No quarto em frente Almerindo apaga a
luz. Vera vê pela bandeira da porta e sorri. Aposto que tá cheirando o
travesseiro. Puxa uma tragada profunda e saboreia o gosto áspero do
fumo. Vai, punheteiro.
Almerindo não consegue dormir. De luz apagada ou acesa,
de olhos abertos ou fechados, o corpo de Vera não sai da frente dele.
Moreno, brilhante, oferecido, escorrendo água por entre os seios e pelas
coxas. Almerindo, a mão já descendo por entre as pernas, recorda a cena
mais uma vez. Onze horas da manhã. D. Berta, como sempre, na cozinha,
preparando o almoço, ele no quarto, Vera tomando banho no banheiro
social. Almerindo passa no corredor e vê a porta aberta. Pára e olha.
Vera, de braços levantados, olha para ele e abre um sorriso, a água
escorrendo pelo corpo.
- Quer entrar, não?
Almerindo quer recuar, fechar a porta. Vera levanta os
seios com as mãos, oferecendo-os.
- Ó, hoje é de graça.
Almerindo bateu a porta com força, fechou-se no quarto,
não almoçou nem foi trabalhar da parte da tarde. E, agora, passados mais
de quinze dias, ainda não consegue dormir. O corpo de Vera continua na
frente dele, moreno, brilhante, oferecido, Vera sorrindo, como se
quisesse que ele entrasse no banheiro e a fodesse, fodesse e fodesse.
Num gesto brusco Almerindo levanta-se e abre a porta do quarto. Vera
escuta os passos no corredor. Aposto que vai pro banheiro. Almerindo
entra no banheiro e tranca a porta. Vera sorri. Vai tocar punheta até.
Olha Almeno ressonando. Burro. Levanta-se. Pára na porta do banheiro e
espreita pela fechadura. Sentado no vaso, olhos vidrados numa foto de
Vera no dia do casamento, Almerindo masturba-se furiosamente.
D. Berta todos os dias vai ao apartamento de Vera. De
manhã faz o café, prepara o almoço ao meio dia e limpa e arruma tudo
durante a tarde. Vera levanta-se tarde. Onze horas, meio-dia. Às vezes
até depois do meio-dia. Almeno não almoça em casa. Almerindo nunca sai
sem almoçar. Vera sempre senta na mesa de baby-doll. D. Berta reclama.
- Vera, isso não são modos de sentar à mesa do almoço.
- Ora, vovó, Almerindo não se importa. Importa,
Almerindo?
Almerindo não responde. Mas à noite não vem jantar,
esperando que Nelly, lá no puteiro da rua Paquequer, atenda o último
freguês e ele possa trancar-se com ela no banheiro. Nelly tomando banho
e Almerindo olhando, pensando em Vera e masturbando-se.
Vera levanta-se da cama de
Almerindo e entra no banheiro da suite. Deixa os lençóis amarrotados e o
travesseiro caído no chão. Assim ele bem que vai saber que tive aqui.
Abre o chuveiro e fica imóvel, a água escorrendo pelo corpo, a mão
direita entre as coxas, o tesão vindo, começando, tomando conta. Está no
meio do orgasmo, os gritos já rascando na garganta, a vista turva e o
corpo tremendo quando o telefone toca. Vera não escuta. O telefone
insiste. Vera deixa passar a última convulsão, abre os olhos e vai
atender, nua, a água pingando no carpete.
- Alô? Ocá. Tchau.
Vera termina o banho, o corpo
mole, bambo, mas tranqüila, entra no quarto e veste-se. Escuta a chave
de D. Berta na porta de serviço. Vaca, filha da puta. Escutou na merda
da extensão. D. Berta entra no quarto.
- Sua mãe disse pra você esperar por ela.
Vaca. Filha da puta. Mamãe
que é, ó... D Berta olha Vera e sai do quarto. Vagabunda igual à mãe. |